A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que negou o pedido da viúva de um ex-cabo da Força Aérea Brasileira (FAB) para que que ele fosse definitivamente reconhecido como anistiado político. O pedido de anistia havia sido deferido, e posteriormente foi determinada sua revisão com a edição da Portaria n. 3.076, de 16/12/2019, pela então ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e, diante disso, foi revogada.
Em seu recurso ao Tribunal, a autora sustentou que a sentença do Juízo da 2ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF) contrariaria jurisprudência dos tribunais superiores no sentido de que os cabos incorporados anteriormente à vigência da Portaria n. 1.104/GM3-64, do então Ministério da Aeronáutica, fariam jus à anistia.
Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, destacou que “não há qualquer irregularidade na edição da Portaria n. 3.076/2019, que determinou a revisão das anistias concedidas com fundamento na Portaria n. 1.104/GM-3-1964, por estar em consonância com a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 839 no sentido de ser possível à Administração, no exercício do seu poder de autotutela, rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria n. 1.104/64, caso comprovada a ausência de motivação política”.
Segundo o magistrado, como a apelante não comprovou que seu falecido marido foi vítima de punição, demissão ou afastamento de suas atividades em razão de atos de exceção, não há como reconhecer a condição de anistiado político do ex-cabo da FAB.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ANISTIA POLÍTICA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE MOTIVAÇÃO EXCLUSIVAMENTE POLÍTICA. ART. 8º DA ADCT E ART. 2º DA LEI N. 10.559/2002. MILITAR. AERONÁUTICA. PORTARIA N. 1.104-GM3. REPERCUSSÃO GERAL. RE N. 817.338/DF. TEMA 839. POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO. PODER DE AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO. HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA MANTIDA.
1. Trata-se de apelação interposta pela autora, ex-esposa de ex-militar da Aeronáutica, contra sentença proferida pelo Juízo da 21ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal que, na Ação Ordinária n. 1059762-46.2020.4.01.3400, julgou improcedente o pedido de que seja definitivamente reconhecida a condição de anistiado político do falecido, a qual foi deferida e, posteriormente, teve determinada sua revisão com a edição da Portaria n. 3.076, de 16/12/2019, pela Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
2. Nos termos do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT e do art. 2º da Lei n. 10.559/2002, a anistia deve ser concedida àqueles que foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, praticados durante o regime ditatorial, considerado o “período de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988”.
3. No julgamento do RE n. 817.338/DF, em regime de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal decidiu que poderá a Administração, no exercício do seu poder de autotutela, rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica, com fundamento na Portaria n. 1.104/64, caso comprovada a ausência de motivação política, firmando a seguinte tese (Tema 839): “No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria nº 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas”.
4. O STF decidiu, ainda, no RE n. 817.338/DF, que não estão contemplados pela anistia aqueles militares que não foram vítimas de punição, demissão ou afastamento de suas atividades profissionais por atos de motivação política, “a exemplo dos cabos da Aeronáutica que foram licenciados com fundamento na legislação disciplinar ordinária por alcançarem o tempo legal de serviço militar (Portaria n. 1.104-GM3/64)”.
5. No caso dos autos, o falecido marido da autora foi declarado anistiado político pela Portaria n. 3.720, de 14/12/2004, do Ministro da Justiça, sendo, posteriormente, determinada a instauração de procedimento de revisão das anistias concedidas com fundamento na Portaria n. 1.104/GM-3-1964, através da Portaria n. 3.076, de 16/12/2019, expedida pela Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
6. Não há qualquer irregularidade na edição da Portaria n. 3.076/2019, que determinou a revisão das anistias concedidas com fundamento na Portaria n. 1.104/GM-3-1964, por estar em consonância com a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal, no Tema 839, no sentido de ser possível à Administração, no exercício do seu poder de autotutela, rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica, com fundamento na Portaria n. 1.104/64, caso comprovada a ausência de motivação política.
7. Não tendo a apelante, no caso, comprovado que seu falecido marido foi vítima de punição, demissão ou afastamento de suas atividades em razão de atos de exceção, limitando-se ao argumento de que a Portaria n. 1.104-GM3/64 configuraria ato de motivação política, e que já seria justificação suficiente à concessão da anistia pretendida, não há como reconhecer a condição de anistiado político do falecido.
8. Honorários advocatícios recursais fixados, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
9. Apelação desprovida.
A decisão do Colegiado foi unânime acompanhando o voto do relator.
Processo: 1059762-46.2020.4.01.3400