Viola os princípios da impessoalidade e da isonomia a atribuição de pontuação maior a alunos de universidade pública em detrimento dos alunos de universidade particular em edital de seleção para pós-graduação

A Universidade Federal de Uberlândia (UFU) apelou da sentença em ação civil pública que julgou parcialmente procedentes os pedidos da inicial, determinando que a instituição “retifique o Edital PPGEC 001/2014 para que seja excluído o fator f1, e não mais adote referido fator ou qualquer critério de avaliação de candidatos que façam distinção entre alunos provenientes de instituições públicas e privadas”.

A apelante sustentou que o “fator f1, previsto no edital, busca igualar os candidatos oriundos de universidades públicas e privadas no mesmo patamar”. Afirmou ainda que a pretensão autoral se configura em controle judicial de atos administrativos, o que afronta a separação dos Poderes e a autonomia universitária, constitucionalmente prevista.

A relatora, desembargadora federal Daniele Maranhão, ressaltou que o critério estabelecido pela UFU “parece partir da falsa premissa de que não haveria alunos carentes estudando nas instituições de ensino privadas, em nítida confusão entre critério com base no percurso acadêmico e a adoção de política afirmativa com o objetivo de efetivamente beneficiar alunos carentes”.

A magistrada asseverou que a aplicação da regra prevista no edital afronta os princípios da igualdade, razoabilidade e impessoalidade, facilitando, sem justificativa válida, o acesso aos alunos oriundos de universidades públicas, a justificar a intervenção do Poder Judiciário, uma vez que, embora reconhecida a autonomia didático-cientifica conferida às universidades, na forma do art. 207, da Constituição de 1988, tais regras não são absolutas.

Com essas considerações a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1), nos termos do voto da relatora, confirmou a sentença recorrida e negou provimento à apelação da UFU.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL  E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ENSINO SUPERIOR. CONCURSO. SELEÇÃO PARA CURSO DE PÓS-GRADUÇÃO.  RELEVÂNCIA SOCIAL. LEGITIMIDADE ATIVA E INTERESSE PROCESSUAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. CONTROLE JUDICIAL DOS ATOS ADMINISTRATIVOS. VIOLAÇÃO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA. INOCORRÊNCIA. EDITAL. CRITÉRIO DISCRIMINATÓRIO. AUSÊNCIA DE MOTIVO PLAUSÍVEL. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. SENTENÇA CONFIRMADA.

1. “Tanto esta Corte quanto o e. STJ vem reconhecendo a legitimidade ativa do Ministério Público Federal para atuar nas causas relativas a concursos públicos, quando presentes direitos individuais homogêneos, ainda que disponíveis e divisíveis, desde que na presença de relevância social objetiva do bem jurídico tutelado ou diante da massificação do conflito” (AC 0002448-91.2009.4.01.4000, Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, TRF1 – Sexta Turma, e-DJF1 12/02/2016 p. 1558).

2. “Não viola o princípio da separação dos poderes o controle de legalidade exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos administrativos” (AI 766094 AgR, Relator: Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 17/12/2013, Processo Eletrônico DJe-033 Divulg 17-02-2014  Public 18-02-2014).

3. “Não obstante se reconheça, em homenagem à autonomia didático- científica conferida constitucionalmente às universidades, na forma do art. 207, da CF/88, a legitimidade das Instituições de Ensino para estabelecerem as normas referentes às suas atividades acadêmicas e administrativas, tais regras não são absolutas, devendo ser observados os princípios constitucionais e legais que norteiam os atos administrativos em geral, dentre os quais, o da razoabilidade” (AMS 1004700-43.2019.4.01.3307, Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 13/12/2020).

4. Hipótese em que a Universidade Federal de Uberlândia lançou nos editais de seleção de alunos para o curso de pós-graduação em Engenharia Civil, na fase de análise do histórico escolar, quanto à origem, fator que atribuiu pontuação distinta aos alunos egressos de universidades públicas e privadas, sob a justificativa de que tal medida teria como objetivo valorizar os egressos do ensino público por contemplar alunos carentes.

5. Segundo o Fator f1 (quanto à origem) previsto nos editais, os candidatos egressos de universidades públicas, obteriam pontuação “1”, enquanto que aos egressos de universidades particulares seria atribuída a pontuação “0,6”.

6. Carece de razoabilidade e, a toda evidência, viola os princípios da impessoalidade e da isonomia, previsão lançada em edital de seleção para curso de pós-graduação que, na fase do certame relativa à avaliação do histórico escolar, atribui pontuação maior aos alunos egressos de universidades públicas, em detrimento dos alunos que estudaram em universidades particulares, sem que tenha havido nenhum motivo plausível que amparasse a discriminação, em especial por ter deixando a Administração de tomar em consideração o fato de que nas instituições privadas de ensino superior também estudam alunos carentes.

7.  Apelação a que se nega provimento.

8. Proferida a sentença na vigência do CPC revogado (22/01/2015), inaplicável o disposto no parágrafo 11 do artigo 85 do CPC.

Processo 0031860-03.2014.4.01.3803

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