Verificação de excesso de prazo em prisão preventiva leva em conta a peculiaridade do réu e a complexidade de cada processo

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), confirmando decisão liminar, denegou a ordem de habeas corpus de paciente denunciado por integrar organização criminosa que efetuava roubo a cargas dos Correios, usando arma de fogo, e outros delitos como tráfico de drogas e receptação.

Argumentou o impetrante, advogado do paciente, que antes de ter sua prisão decretada no processo que corre na justiça federal, seu cliente já se encontrava preso por ordem do juízo estadual, e que, tendo obtido a revogação da ordem de prisão no âmbito estadual, somente não fora colocado em liberdade em razão da ordem de prisão emanada pela Justiça Federal do Estado do Pará.

Alegou ainda que, além de ausentes os requisitos que autorizam a decretação/manutenção da prisão, haveria excesso de prazo, posto que está preso há 11 meses e 2 dias, sem que a instrução do processo tenha se encerrado.

Defendendo que seriam suficientes medidas cautelares que não a prisão, formularam o pedido de revogação da prisão preventiva por excesso de prazo.

O relator, juiz federal convocado Erico Rodrigo Freitas Pinheiro, explicou que o acusado foi denunciado por organização criminosa, roubo, porte ilegal de arma de fogo, em crime continuado. Destacou que na denúncia estão presentes a prova de que os delitos ocorreram (materialidade) e indícios de autoria dos crimes pelo denunciado.

Prosseguindo no voto, o magistrado ressaltou também que os tribunais superiores firmaram jurisprudência no sentido de que, para decretar a prisão cautelar, o juiz deve apoiar a decisão nas circunstâncias fáticas do caso concreto, e que, neste caso, a prisão é necessária para garantir a ordem pública e conter a reiteração delitiva do réu.

Concluindo, o relator constatou que, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a verificação de excesso de prazo na prisão provisória “não se realiza de forma puramente matemática. Demanda, ao contrário, um juízo de razoabilidade, no qual devem ser sopesados não só o tempo mas também as peculiaridades da causa, sua complexidade, bem como quaisquer fatores que possam influir na tramitação da ação penal”, e que, dada a complexidade da causa, com quinze réus, não se pode atribuir desídia ou demora processual a ensejar a revogação do decreto de prisão.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES DO ARTIGO 2º, CAPUT, DA LEI 12.850/2013, ARTIGO 157, §2º, II, III E §2º-A, I C/C ARTIGO 71, AMBOS DO CP E ARTIGO 14 DA LEI 10.826/2003. PRISÃO PREVENTIVA. MATERIALIDADE. INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA. INSUFICIÊNCIA DAS MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ARTIGO 319 DO CPP. ORDEM DENEGADA.

1. Busca-se com o presente habeas corpus a revogação da prisão preventiva a que se encontra submetido o paciente.

2.  O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra o paciente e mais dez denunciados, imputando-lhes a prática, em tese, dos seguintes crimes: artigos 2º, “caput”, da Lei 12.850/2013, art. 157, §2º, II, III e §2º-A, I c/c art. 71 ambos do Código Penal; art. 14 da Lei 10.826/2003. Segundo a denúncia, o paciente e os outros denunciados integrariam organização criminosa que atua especialmente nas mediações do Município de Novo Repartimento, no Estado do Pará, onde subtraíram, mediante violência e grave ameaça, usando arma de fogo, diversos objetos postais transportados por caminhões de empresas prestadoras de serviços à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, para posterior venda em regiões próximas à execução do crime, especialmente Marabá/PA.

3. O órgão de acusação assevera que o paciente teria atuado diretamente em roubo ocorrido na data de 15/1/2020 e, tendo empreendido fuga do local, foi preso em flagrante no dia 6/3/2020, no Estado do Tocantins, quando praticava outros delitos (tráfico de drogas, associação para o tráfico e associação para o crime de receptação). Os delitos imputados ao paciente têm pena superior a 04 (quatro) anos, atendendo à exigência do art. 313, I, do CPP. Da mesma forma, há elementos de materialidade e indícios de autoria.

4. A prisão preventiva do paciente foi decretada em 14/5/2020, ainda na fase investigativa, precipuamente, para garantia da ordem pública, tendo a autoridade impetrada indicado risco concreto de reiteração delitiva, destacando que o paciente integraria grupo criminoso voltado à prática de crimes de roubo a cargas dos Correios, sendo que, tendo se evadido do local do crime, dias depois foi preso em flagrante  em outro Estado da Federação por  envolvimento em outros crimes (tráfico de drogas e associação para o tráfico e associação para o crime de receptação). Tais circunstâncias evidenciam a necessidade da segregação cautelar para a garantia da ordem pública, como forma de conter a reiteração delitiva.

5. A necessidade de interrupção do ciclo delitivo de associações e organizações criminosas é fundamento idôneo para justificar a custódia cautelar, com fulcro na garantia da ordem pública. Precedente.

6. Não prospera a alegação de excesso de prazo da custódia cautelar. Não obstante o paciente se encontre preso há mais de ano sem que tenha sido realizada a instrução de julgamento, ao que se pode verificar pelas informações prestadas pela autoridade coatora, trata-se de causa complexa, envolvendo 15 (quinze) réus, estando os autos (na data das informações – 5/5/2021) em fase de apresentação das respostas escrita de todos os denunciados.

7. A verificação do excesso de prazo não se realiza de forma puramente matemática, demandando ao contrário, um juízo de razoabilidade, levando-se em consideração não apenas o tempo de prisão preventiva, mas também eventuais peculiaridades que, inerentes a determinado processo, possam influir na tramitação da ação penal, o que é o caso dos autos. Precedente.

8. Na hipótese dos autos, portanto, restou evidenciada a legalidade e necessidade da prisão preventiva a que está submetido o paciente, pois presentes os requisitos de sua decretação e demonstrada à insuficiência das medidas cautelares previstas no artigo 319 do CPP.

9. Ordem de habeas corpus denegada, confirmando o que decidido em sede liminar.

Por unanimidade, o Colegiado denegou a ordem, nos termos do voto do relator.

Processo 1014090-93.2021.4.01.0000

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