A Caixa Econômica Federal (CEF) deverá pagar multa ao comprador de um apartamento em Maceió (AL), adquirido por meio do Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), que deveria ter sido entregue em 12 de março de 2015. O banco também deverá devolver os valores pagos pelo mutuário, a título de juros de obra, após essa data. Foi o que decidiu, por unanimidade, a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5, confirmando sentença da 3ª Vara da Justiça Federal em Alagoas.
A Caixa recorreu ao TRF5, alegando que não poderia responder pela demora na entrega do apartamento. Entretanto, ao julgar a apelação, a Terceira Turma do Tribunal apontou que o banco, na condição de gestor do Programa MCMV, é corresponsável pela situação – o atraso se deve à construtora, mas também à própria CEF, a quem cabia controlar e fiscalizar as obras e não apenas ofertar financiamento imobiliário aos compradores.
A multa a ser paga pela Caixa foi fixada em 2% do valor atualizado do apartamento em 12 de março de 2015, mais 0,033% sobre o mesmo montante, por dia de atraso (contados desde a data prevista para entrega do imóvel até a sua entrega efetiva ao comprador). Foi aplicada, no caso, a chamada “inversão da cláusula penal”, impondo-se à Caixa as penalidades previstas no contrato de financiamento para a impontualidade do mutuário.
O banco terá, ainda, que devolver ao comprador os valores pagos após essa data, a título de “juros de obra” – encargos mensais pagos pelo comprador de um imóvel adquirido na planta, desde a assinatura do contrato de financiamento até a entrega das chaves. A Turma destacou que a taxa é legítima, mas não pode ser cobrada após o fim do prazo expressamente previsto no contrato para o término da construção.
O recurso ficou assim ementado:
CIVIL. FINANCIAMENTO HABITACIONAL. ATRASO DA OBRA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA CEF E DA CONSTRUTORA. PENALIDADE PELA IMPONTUALIDADE. PREVISÃO CONTRATUAL APENAS PARA O ATRASO DO MUTUÁRIO. INVERSÃO. DIREITO RECONHECIDO. TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA. RESTITUIÇÃO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. APELAÇÃO IMPROVIDA.
- Apelação interposta contra sentença que, na presente ação de reparação de danos decorrentes do atraso da obra de empreendimento imobiliário e consequente entrega de unidade habitacional objeto de contrato de compra e venda e mútuo firmado entre as partes, julgou parcialmente procedentes os pedidos autorais para condenar a Caixa Econômica Federal: a) ao pagamento, em favor do autor, de multa de 2% (dois por cento) e juros de 0,033% (trinta e três milésimos por cento) por dia de atraso, ambos incidentes sobre o valor atualizado do imóvel na data de início da mora – 12 de março de 2015 – e nos termos do contrato de mútuo habitacional celebrado entre as partes, a ser apurado em liquidação de sentença e devido até a efetiva entrega do imóvel; b) ao ressarcimento dos valores efetivamente pagos pelo autor a título de taxa de obra após a data em que a obra deveria ter sido entregue – 12 de março de 2015 – devendo o pagamento indevido realizado pelo demandante ser demonstrado em sede de liquidação de sentença.
- Acertada a sentença quanto ao reconhecimento da legitimidade passiva e da responsabilidade solidária da CEF por prejuízos eventualmente decorrentes do atraso na conclusão do empreendimento imobiliário. “A própria CEF, nos autos da ação de imissão na posse do canteiro de obras nº 0807912-65.2018.4.05.8000, proposta contra a Construtora ré, alega que é credora fiduciária dos contratos particulares de compra e venda de terreno e mútuo para a construção de unidade habitacional, com recursos provenientes do Programa Nacional de Habitação Urbana – PNHU, imóvel na Planta Associativo, Minha Casa Minha Vida – MCMV, cuja característica fundamental consiste na arregimentação de proponentes pessoas físicas, enquadrados nas normas do programa, para aquisição da fração ideal de terreno e construção da unidade habitacional, vinculada ao empreendimento imobiliário em questão: “Condomínio Residencial Riviera da Lagoa.”(PROCESSO: 08036509520164058500, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA DAMASCENO, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 29/07/2021). Tendo em vista a qualidade de gestora do Programa “Minha Casa Minha Vida”, a CEF não está na posição de mero agente financeiro, motivo pelo qual resta configurada sua legitimidade passiva e sua responsabilização solidária pelo atraso da entrega do imóvel objeto dos autos. O inadimplemento decorreu de culpa da Construtora e da fiscalização deficitária por parte da CEF, todas responsáveis pelo fiel cumprimento do contrato em apreço, não se vislumbrando a ocorrência de força maior ou caso fortuito que justificasse o atraso na entrega da obra (PROCESSO: 08036509520164058500, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA DAMASCENO, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 29/07/2021).
- Afastada a pretensão de reforma da sentença no ponto em que inverteu a cláusula penal. À teor do entendimento firmado por esta Terceira Turma acerca da matéria, uma vez comprovada a impontualidade no cumprimento da entrega do imóvel e tendo em vista os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual, impõe-se a condenação da CEF nas penalidades previstas no contrato de financiamento tão somente para a impontualidade do mutuário (PROCESSO: 08036457920204058000, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO DE MENESES FIALHO MOREIRA, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 22/10/2020; PROCESSO: 08024038820164058400, DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 21/11/2019).
- Quanto à cobrança da taxa de evolução da obra, em que pese legítima durante a fase de construção do imóvel, sua exigibilidade somente se configura durante o referido período, de modo que, uma vez expirado, ainda que se encontre inacabada a obra, inicia-se a fase de amortização, quando não mais é devido o reportado encargo. Sendo assim, mostra-se devido o reconhecimento do direito da parte autora à restituição dos valores efetivamente pagos a título dos chamados “juros de construção” após o término do prazo expressamente previsto no contrato para a conclusão da construção do imóvel.
- Apelação improvida. Majorados os honorários de sucumbência imputados à CEF/apelante em um ponto percentual (art. 85, §11, do CPC).
Processo nº 0810929-41.2020.4.05.8000