Um pequeno empresário conseguiu no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) o direito à execução judicial do processo em que pleiteava receber valores referentes a precatório ou requisição de pequeno valor (RPVs).
De acordo com os autos, diante das dificuldades financeiras decorrentes da pandemia da Covid-19, o empresário requereu, em caráter de urgência, o pagamento dos valores. No entanto, foi informado pelo órgão judicial que o processo estava suspenso para migração de sistemas, no caso, para o Processo Judicial Eletrônico (PJe).
Ele, então, procurou a Justiça Federal por meio de mandado de segurança contra a omissão judicial. Argumentou que os motivos apresentados pelo Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal configuram omissão legal e que o ato omissivo afronta a dignidade da pessoa humana, o direito à efetividade processual e à razoável duração do processo e viola o disposto na Resolução 313/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabelece o plantão extraordinário e o atendimento prioritário para pedido de levantamento de valor no período emergencial da pandemia do novo coronavírus. ¿¿
Valor incontroverso – Ao analisar o processo, o relator, desembargador federal Jamil de Jesus Oliveira, verificou que a ilegalidade apontada é a omissão do juízo em apreciar o pedido de levantamento do valor incontroverso e a existência de lesão aos direitos garantidos pela Constituição Federal (CF) e pelo Código de Processo Civil (CPC) de razoável duração do processo e celeridade na tramitação.
“Não se pode desprezar o tempo já suportado pela parte para ver a efetivação de seu direito, assim como as dificuldades econômicas provocadas pela pandemia à população como um todo, tendo sido os pequenos empresários, como a impetrante, diretamente atingidos com as medidas de restrição para contenção da doença”, observou o magistrado.
No caso em análise, prosseguiu o desembargador federal, o impetrado afirmou já haver providenciado o cumprimento da decisão liminar determinando à Caixa a transferência do valor”. Todavia, não há falar em perda do objeto do mandado de segurança, “porque ao tempo da impetração essa se fazia necessária, e a providência a final tomada na origem o foi em razão da liminar”, concluiu o magistrado e votou pela concessão da segurança, sendo acompanhado pela 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA OMISSÃO JUDICIAL. PEDIDO DE LEVANTAMENTO DE VALOR INCONTROVERSO. DIREITO À EFETIVIDADE PROCESSUAL E À RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. LIMINAR CONFIRMADA. SEGURANÇA CONCEDIDA.
1. Trata-se de mandado de segurança impetrado contra omissão do Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal em apreciar pedido de levantamento de valor incontroverso formulado em sede de cumprimento de sentença.
2. O mandado de segurança é remédio constitucional, previsto no art. 5º, inc. LXIX, não podendo ser manejado contra decisão judicial contra a qual caiba recurso (art. 5º, inc. II, da Lei n. 12.016/2009 e Súmula 267 do STF).
3. Muito embora o art. 1.015, parágrafo único, do CPC disponha que qualquer decisão interlocutória proferida na fase de cumprimento de sentença possa ser atacada por agravo de instrumento, o ato impugnado neste writ é omissivo, sendo, portanto, possível a utilização do mandado de segurança.
4. A discussão dos autos circunscreve-se à inércia judicial na apreciação do requerimento da parte e à existência de lesão aos direitos à efetividade processual e à razoável duração do processo, matéria tratada pela Constituição Federal no art. 5º, inc. LXXVIII, e pelo Código de Processo Civil, em seu art. 4º, dispondo esse último que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.
5. Diante do cenário de calamidade pública desencadeada pela pandemia do novo coronavírus e objetivando garantir o acesso à justiça, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n. 313, de 2020, estabelecendo o Plantão Extraordinário no Poder Judiciário, elencando, em seu art. 4º, matérias que terão apreciação garantida nesse período emergencial, entre as quais foi arrolado o pedido de levantamento de valor.
6. Considerando o teor dos dispositivos constitucional, legal e infralegal citados, não se mostra razoável o argumento declinado pelo impetrado, de que não teria apreciado o pedido da autora em razão de que os autos, físicos até então, teriam sido enviados para digitalização e migração para o sistema Pje, estando fora da Secretaria do Juízo.
7. Ademais, não se pode desprezar o tempo suportado pela parte para ver a efetivação de seu direito, assim como as dificuldades econômicas provocadas pela pandemia à população como um todo, tendo sido os pequenos empresários, como a impetrante, diretamente atingidos com as medidas de restrição para contenção da doença.
8. Acertada a decisão proferida pelo então relator deste mandamus que, em sede de liminar (proferida em 20/04/2020), determinou que o juiz impetrado apreciasse o pedido formulado pela autora e proferisse decisão naqueles autos.
9. Liminar confirmada; segurança concedida.
Processo: 100985957.2020.4.01.0000