A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que o terceiro embargante não tem legitimidade para suscitar a incompetência do juízo que decretou a penhora de seu bem, ao argumento de que seria competente o juízo falimentar. Segundo o colegiado, os embargos de terceiro não são a via processual adequada para esse fim.
A turma negou provimento ao recurso especial de um homem que opôs embargos de terceiro contra uma empresa farmacêutica. Ele alegou que, em ação de execução promovida pela farmacêutica contra uma fazenda agropecuária, foi penhorado imóvel cuja área corresponderia à de um sítio do qual ele era possuidor e depositário, em decorrência de hasta pública realizada na Justiça do Trabalho.
Provas documentais não foram suficientes para demonstrar a sobreposição de áreas
O juiz de primeiro grau determinou a realização de perícia para analisar a alegada sobreposição de áreas, mas somente a farmacêutica recolheu os honorários periciais, mantendo-se inerte o embargante. O juízo julgou os embargos improcedentes, com fundamento na falta de realização da prova pericial por desinteresse da parte autora.
Na apelação, o embargante sustentou que as provas documentais produzidas seriam suficientes para demonstrar a sobreposição das áreas dos imóveis. Além disso, foi pedida a declaração de nulidade de todos os atos até ali praticados, uma vez que o juízo da execução seria absolutamente incompetente, pois foi decretada a falência da agropecuária executada. Com isso, os autos deveriam ser remetidos ao juízo falimentar.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afastou a incompetência absoluta e entendeu que as provas documentais produzidas nos autos não foram suficientes para demonstrar a sobreposição.
Caberia à fazenda executada suscitar a incompetência do juízo da execução
O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou que a principal finalidade dos embargos de terceiro é eliminar constrangimentos indevidos de origem processual sobre o patrimônio do embargante, de modo que não se mostra possível que o terceiro embargante suscite questão afeta única e exclusivamente à parte executada.
O magistrado destacou que caberia apenas à fazenda agropecuária, nos autos do pleito executório, suscitar a incompetência do juízo da execução para expropriar seu patrimônio, com a determinação de remessa dos autos ao juízo da falência para decidir sobre a penhora do bem.
“Por conseguinte, não se vislumbra a legitimidade de um terceiro para suscitar, por meio dos referidos embargos, a ocorrência de falência da devedora – que nem sequer integra a relação processual instaurada nos embargos de terceiro – a fim de aduzir a competência absoluta do juízo falimentar para deliberar sobre eventual constrição do bem ocorrida no processo de execução”, declarou Bellizze.
Não há certeza quanto à sobreposição de áreas
O ministro lembrou que, conforme o artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, cabe ao autor utilizar os meios necessários para a obtenção de interesse próprio, de maneira que, se frustrado seu ônus, deverá suportar as consequências prejudiciais aos seus próprios interesses.
O relator apontou que as instâncias ordinárias julgaram improcedentes os embargos de terceiro sob o fundamento de que as provas presentes nos autos não eram capazes de demonstrar que se tratava do mesmo imóvel. Para anular tal conclusão – acrescentou Bellizze –, seria imprescindível o reexame das provas, medida inadmissível no recurso especial, conforme prevê a Súmula 7.
“Não há certeza quanto à sobreposição de áreas, mas apenas uma possibilidade, a qual, portanto, deveria ser constatada mediante a produção da prova pericial, que só não ocorreu em razão da inércia do próprio recorrente, ou seja, o autor dos embargos de terceiro não se desincumbiu do ônus de provar fato constitutivo do seu direito”, concluiu o magistrado ao negar provimento ao recurso.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO FALIMENTAR. ILEGITIMIDADE DO TERCEIRO EMBARGANTE. SOBREPOSIÇÃO DE ÁREAS DE IMÓVEIS CONSTRITOS. AUTOR QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE PROVAR O FATO CONSTITUTIVO DO SEU DIREITO. REVISÃO DAS CONCLUSÕES DO TRIBUNAL ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7⁄STJ. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.1. Verifica-se que o Tribunal de origem analisou todas as questões relevantes para a solução da lide de forma fundamentada, não havendo falar em negativa de prestação jurisdicional.2. Os embargos de terceiro são ação de conhecimento de rito especial, destinada à parte que sofre constrição de um bem do qual tenha posse em decorrência de decisão judicial proferida em uma relação jurídica processual da qual não participou. Assim, a finalidade precípua dos embargos de terceiro é eliminar constrições indevidas de origem processual sobre o patrimônio do embargante, de modo que não se mostra possível que o terceiro embargante suscite questão afeta única e exclusivamente à parte executada, tal como a competência absoluta do Juízo universal em decorrência da decretação de sua falência.3. Nos termos do art. 373, I, do CPC⁄2015, o autor deverá exercer a faculdade de utilizar os meios necessários para a obtenção de um interesse próprio, de maneira que, se frustrado seu ônus, deverá suportar as consequências prejudiciais aos seus próprios interesses.3.1. No caso vertente, as instâncias ordinárias consignaram que as provas carreadas aos autos não são capazes de demonstrar que as referidas fazendas se referem ao mesmo imóvel, sobretudo porque a simples comparação da descrição dos imóveis objetos das matrículas seria insuficiente para evidenciar a sobreposição de imóveis, sendo imprescindível a confrontação das descrições com outros dados técnicos e fáticos a serem produzidos por profissional habilitado, o que só não ocorreu por inércia do autor.3.2. Vê-se, portanto, que as questões foram decididas mediante profunda análise das provas produzidas nos autos. Logo, para infirmar as conclusões do acórdão recorrido, seria imprescindível o reexame de provas, medida inadmissível nesta instância extraordinária, conforme prevê a Súmula 7⁄STJ.4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.
Leia o acórdão no REsp 1.810.442.