Revisão criminal não deve ser utilizada como segundo recurso de apelação para readequar de pena

Sob a relatoria do desembargador federal Néviton Guedes, a 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) julgou improcedente a revisão criminal em que o requerente, condenado em ação penal pelo delito do art. 312, combinado com o art. 71, ambos do Código Penal (CP), de subtração de valores do Conselho Regional de Medicina do Estado do Maranhão (CRM/MA), valendo-se da qualidade de contador prestador de serviços da autarquia, pretendia a reanálise da pena-base imposta pelo juízo de primeiro grau e confirmada pelo TRF1 no julgamento da apelação.

Sustentou o requerente “a violação ao art. 59 do CP na fixação da pena-base, a qual entende deve ser fixada no mínimo legal, afastando-se as valorações negativas da culpabilidade do agente e das circunstâncias e consequências do crime. Alternativamente, requer o redimensionamento da pena-base’”.

Na análise do processo, o relator explicou que, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ), a revisão criminal para dosimetria (cálculo) da pena só tem cabimento quando novas provas evidenciam equívoco ou ilegalidade, sendo inviável a utilização para alterar a pena fixada, sendo verdadeira garantia individual contra eventuais erros do judiciário.

Verificou o relator que não se observa erro flagrante na análise do cálculo da pena, e que a presente dosimetria foi bem fundamentada, não se prestando a revisão criminal à reavaliação dos critérios utilizados pelo magistrado sentenciante e confirmados pelo acórdão na apelação, sob pena de converter esse instrumento processual em inaceitável segunda apelação.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA.  CRIME PREVISTO NO ART. 312, § 1º, C/C ART. 71, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. REVISÃO DA DOSIMETRIA. FUNDAMENTOS IDÔNEOS. IMPROCEDÊNCIA.

1. Revisão criminal ajuizada visando desconstituir o acórdão da Terceira Turma deste Tribunal que, nos autos da apelação 2006.37.00.001499-1/MA, manteve a sentença proferida pelo Juízo Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Maranhão/MA, que julgou procedente a pretensão punitiva estatal e condenou o requerente pela prática do crime previsto no art. 312, §1º, c/c art. 71, ambos do Código Penal, às penas de 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 105 (cento e cinco) dias-multa.

2. Consta nos autos que o requerente, valendo-se de sua função pública de contador prestador de serviços do Conselho Regional de Medicina do Estado do Maranhão – CRM/MA, subtraiu para si valores desta autarquia, entre janeiro de 1996 e agosto de 2001, praticando repetidos desfalques nos cofres da instituição mediante a adulteração dos valores dos cheques que lhes eram dados em pagamento pelos seus serviços. Constatou-se que o requerente lesionou os cofres da autarquia, causando um prejuízo de R$550.000,00 (quinhentos e cinquenta mil reais).

3. Pretende o requerente, com fundamento no art. 621, I, do Código de Processo Penal, a reanálise da pena-base imposta pelo juízo de primeiro grau e confirmada por esse Tribunal Regional Federal da 1ª Região no julgamento da apelação interposta.

4. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em relação à dosimetria da pena, a revisão criminal tem cabimento restrito, apenas admitida quando, após a sentença, forem descobertas novas provas que demonstrem eventual equívoco do juízo sentenciante, ou na ocorrência de flagrante ilegalidade. Destarte, a revisão não pode ser utilizada como se apelação (ou recurso especial) fosse, para rediscutir, minuciosamente e à luz dos mesmos elementos probatórios, as circunstâncias que já foram valoradas no processo originário (AgRg no REsp 1805996/SP, rel. min. Ribeiro Dantas, DJe de 29/3/2021).

5. Igualmente na linha da jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça, é inviável a utilização da revisão criminal para alterar a pena fixada, uma vez que a dosimetria obedece a certa discricionariedade, tendo em vista que o art. 59 do Código Penal não traz regramento objetivo para fixação da reprimenda (RvCr 5526/TO, rel. min. Rogerio Schietti Cruz, DJe de 9/3/2021).

6. No caso, o delito previsto no art. 312 do Código Penal é apenado com reclusão, de dois a doze anos, e multa. O magistrado de primeira instância deixou de aplicar a pena-base no mínimo legal, por considerar desfavoráveis a culpabilidade, as circunstâncias do crime e as consequências do delito. Diante disso, fixou a pena-base em 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 78 (setenta e oito) dias-multa.

7. Ante a confissão parcial do sentenciado, a pena foi reduzida em 01 (um) ano e em 15 (quinze) dias-multa, passando as reprimendas para 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e de 63 (sessenta e três) dias-multa. Presente a continuidade delitiva o juízo fez incidir em seu patamar máximo (dois terços), em decorrência dos mais de setenta delitos parcelares praticados pelo réu, ficando, assim, as penas definitivas ficaram em 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão e em 105 (cento e cinco) dias-multa.

8. Em conformidade com a jurisprudência de nossa Sessão, salvo situações aquelas em que a dosimetria aplicada concretize indisfarçável teratologia, não se pode alterar os critérios adotados pelo magistrado em sede de revisão, sob pena de converter esse instrumento processual em inaceitável segunda apelação. No caso concreto, ainda que, considerada a jurisprudência do tribunal, se possa  considerar a dosimetria aplicada severa não se vislumbra erro flagrante que autorizasse a sua reformulação por meio de revisão.

9. No caso, pretende o requerente revaloração do conjunto probatório já exaustivamente examinado em sentença e em sede de apelação, oportunidades em que restou suficientemente demonstrada e bem fundamentada a existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis aptas a majorar a pena-base do delito imputado ao requerente, bem como restou confirmada, pelo tribunal, a proporcionalidade e a razoabilidade da pena imposta pelo juízo monocrático.

10. A revisão não se presta a reavaliar o quantum de pena considerado exacerbado, segundo entendimento subjetivo, não amparado na presença de ilegalidades. A presente dosimetria foi fundamentada e a revisão não se presta à reavaliação dos critérios utilizados pelo magistrado na análise e sopesamento das circunstâncias previstas no art. 59 do CP.

11. Revisão criminal julgada improcedente.

A decisão do colegiado acompanhou o voto do relator por unanimidade.

Processo 1013536-95.2020.4.01.0000

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