A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reformou a sentença que havia condenado um homem pelos crimes de corrupção ativa (art. 386, Código Penal) e embriaguez ao volante (art. 306, Código de Trânsito) com o objetivo de absolvê-lo apenas da prática ligada à tentativa de suborno. Isso aconteceu porque o Colegiado considerou que não havia provas suficientes para condená-lo pela corrupção, embora os policiais envolvidos tenham testemunhado contra o réu.
A decisão da 3ª Turma acompanhou, por maioria, o voto do relator, desembargador federal Wilson Alves de Souza, que analisou a questão e constatou que as inconsistências nos depoimentos policiais e a ausência de outras provas nos autos levavam a concluir pela necessidade de reforma da sentença.
O caso teve início na região do Tabocão, em Tocantins: o Ministério Público Federal (MPF) ofereceu denúncia contra o homem que supostamente teria oferecido suborno a dois policiais rodoviários e a um militar com a finalidade de convencê-los a omitir a prisão em flagrante pela prática do crime de direção de veículo automotor sob embriaguez. A suposta tentativa de corrupção teria acontecido justamente depois de o homem ter sido flagrado dirigindo bêbado, e esse fato ter sido confirmado por teste de alcoolemia, indicando percentual de álcool no organismo superior à tolerância do Código de Trânsito Brasileiro (CTB).
Relatos conflitantes – Segundo o magistrado, em relação ao crime de corrupção ativa, o réu, no interrogatório, não confessou ter oferecido dinheiro aos policiais. O acusado teria afirmado ainda não se lembrar de ter praticado esse ato e que, se o fez, teria sido por estar fora de si, sem o controle de suas faculdades em decorrência da ingestão de álcool.
No entanto, o juiz que proferiu a sentença considerou que a materialidade do crime ficou comprovada pelo depoimento dos três policiais ouvidos como testemunhas pela acusação, dois dos quais estiveram diretamente envolvidos na prisão em flagrante do réu, e que teriam indicado a existência da tentativa de suborno.
“A sentença acolheu a tese da acusação com respeito à materialidade do delito fundamentando-se tão somente no depoimento dos policiais envolvidos na operação”, ressaltou o desembargador federal em seu voto. “Conquanto a jurisprudência venha aceitando o depoimento exclusivo dos agentes policiais para comprovação da materialidade de delitos, o grau de exigência do órgão julgador deve ser mais elevado quando o papel de testemunha se confunde com o de vítima, que é a hipótese em que o crime é praticado contra aquele que é testemunha do processo”, pontuou.
De acordo com o relator, havia diversas inconsistências nos depoimentos apresentados pelos policiais, inclusive sobre onde teria se passado o fato e a quem teria sido oferecida a vantagem indevida. “Isso não quer dizer que as testemunhas tenham faltado com a verdade em seus depoimentos, mas tão somente que seu[s] relato[s] apresenta[m] divergências que retiram da prova a robustez necessária para propiciar ao julgador a convicção dos fatos alegados na peça exordial acusatória”, salientou.
Ao concluir, o desembargador federal Wilson Alves de Souza destacou: diante das diversas inconsistências, apenas a palavra dos policiais não era suficiente para autorizar a expedição de decreto condenatório, principalmente diante da ausência de outras provas para condená-lo.
O recurso ficou assim ementado:
PENAL. CORRUPÇÃO ATIVA. OFERECIMENTO DE VANTAGEM INDEVIDA POR RÉU DETIDO POR EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. OITIVA DOS POLICIAIS COMO ÚNICO ELEMENTO DE PROVA. MATERIALIDADE NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Trata-se de apelação interposta pela defesa contra sentença que condenou o Réu pela prática dos crimes de corrupção ativa, descrito no art. 333, caput, do Código Penal, pugnando pela absolvição ou, subsidiariamente, pelo afastamento da pena de suspensão ou proibição de se obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor, sustentando a manifesta ausência de prova da materialidade delitiva e a desproporcionalidade da pena restritiva de direito imposta.
2. Conquanto a jurisprudência venha aceitando o depoimento exclusivo dos agentes policiais para comprovação da materialidade de delitos, o grau de exigência do órgão julgador deve ser mais elevado quando o papel de testemunha se confunde com o de vítima, que é a hipótese em que o crime é praticado contra aquele que é testemunha do processo.
3. Diante de algumas inconsistências no depoimento dos policiais envolvidos na abordagem, apenas sua palavra não é suficiente para autorizar a expedição de decreto condenatório, devendo ser claramente subsidiada por outros elementos de prova presentes nos autos, os quais, no presente caso, não existem.
4. Apelação provida, para absolver o Réu da imputação da prática do crime de corrupção ativa.
Processo 0004862-20.2018.4.01.4300