A Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reformou a sentença que indeferiu a prorrogação de um contrato do Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior (Fies), firmado por uma estudante de Medicina que precisava fazer estágio supervisionado e não concluiu o curso no prazo previsto.
Na apelação, ela argumentou que apesar de já ter ocorrido uma prorrogação no Fies de dois semestres, não seria possível concluir o curso, porque precisava fazer o estágio supervisionado. Dessa forma, requereu a prorrogação do contrato por mais dois semestres.
O relator do recurso, desembargador federal Joa~o Batista Moreira, observou que a sentença recorrida considerou que, embora o direito à educação esteja constitucionalmente previsto, não existe previsão normativa e contratual para ampliação do prazo.
No entanto, após a celebração do contrato de financiamento, a Lei 13.530/2017 alterou as regras vigentes do Fies e garantiu a prorrogação do prazo de financiamento por até quatro semestres. “Não se vislumbra justificativa para não fazer incidir a regra mais benéfica ao estudante, nos contratos anteriormente celebrados”, ressaltou em o magistrado seu voto.
Para o desembargador federal, o cancelamento do financiamento pode impedir a estudante de concluir o curso e com o abandono, “terá dificuldade de arcar com o pagamento das prestações do financiamento, quando iniciar-se o período de amortização”.
O recurso ficou assim ementado:
ENSINO SUPERIOR. CONTRATO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL (FIES). LEGITIMIDADE DA CEF. DILAÇÃO DO PRAZO PARA A CONCLUSÃO DO CURSO FINANCIADO. APLICAÇÃO DA REGRA MAIS BENÉFICA AO ESTUDANTE.
1. Na sentença, foi indeferida a segurança em processo versando sobre prorrogação do contrato de financiamento estudantil (FIES). Considerou-se: “Embora o direito à educação esteja constitucionalmente previsto, como bem alega a impetrante, não existe previsão normativa e contratual para ampliação do prazo de utilização do FIES nos moldes pretendidos pela requerente”.
2. “A Lei 12.202/2010, ao dar nova redação ao artigo 3° da Lei 10.260/2001, transferiu da CEF para o FNDE a atribuição de agente operador e administrador de ativos e passivos do FIES. A legitimidade do agente financeiro para a ação de cobrança, todavia, foi mantida, de acordo com o artigo 6° da Lei 10.260/2001, não modificado, no ponto, cabendo ao FNDE apenas a sua gestão, nos termos da nova lei. Preliminar de ilegitimidade passiva da CEF rejeitada” (TRF1, AC 0005627-19.2012.4.01.4100/RO, Rel. Juiz Federal Convocado Marcelo Velasco Nascimento Albernaz, 5T, e-DJF1 19/09/2017).
3. Na sentença, a ausência de relevância dos fundamentos da impetração está calcada na inexistência de previsão contratual que permita a prorrogação do financiamento na extensão pretendida pela impetrante. Ocorre que, supervenientemente à celebração do contrato de financiamento, adveio a Lei n. 13.530/2017, que, alterando as regras até então vigentes, garantiu a prorrogação do prazo de financiamento por até quatro semestres. Não se vislumbra justificativa para não fazer incidir a regra mais benéfica ao estudante, nos contratos anteriormente celebrados.
4. Há que se ter em conta, ainda, que o cancelamento do financiamento pode impedir a impetrante de concluir o curso. Com o abandono, terá dificuldade de arcar com o pagamento das prestações do financiamento, quando iniciar-se o período de amortização. Não atende ao interesse público que o regramento do financiamento obste a adimplência do contrato.
5. “Tendo em vista ser o FIES um programa de financiamento governamental destinado ao acesso ao ensino superior para pessoas de parcos recursos econômicos, prestigiado o direito constitucional à educação e às normas que beneficiem os contemplados do programa, há de incidir a retroatividade média. Assim, a norma que prevê prazo de carência de 18 (dezoito) meses, na forma da Lei nº 11.941/2009, há de se aplicar aos contratos vigentes, cujo referido direito ainda não foi realizado, mesmo que assinados no tempo anterior à vigência da Lei. Atenção ao objetivo fundamental da República Federativa do Brasil de erradicar a pobreza e marginalização e redução das desigualdades sociais (art. 3º, III, da CRFB/88). Inteligência do art. 5º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (antiga Lei de Introdução ao Código Civil): na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum” (AC 0036392-74.2014.4.01.3300, Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, 6T, e-DJF1 25/05/2018 PAG.)
6. Provimento à apelação, reformando a sentença para deferir a segurança e, assim, prorrogar o prazo do financiamento estudantil da impetrante por mais 2 períodos (2020.2 e 2021.1).
7. Baixa na distribuição no Pedido de Efeito Suspensivo a Apelação (pedido de antecipação da tutela recursal), processo n. 1024362-83.2020.4.01.0000.
Assim, a Sexta Turma do TRF1, por unanimidade, deu provimento à apelação, nos termos do voto do relator.
Processo 1016993-66.2020.4.01.4000