Um policial civil do Distrito Federal que teve reconhecida a sua condição de anistiado político e foi reintegrado ao serviço público em 1998 apelou da sentença do Juízo da 9ª Vara Federal do Distrito Federal ao fundamento de que o autor deveria receber proventos do cargo de delegado de polícia ou, pelo menos, com base no cargo para o qual foi reintegrado (agente de polícia), e não de escrivão, conforme determinou o Juízo de primeira instância. A sentença também foi objeto de remessa necessária porque foi concedida a reparação econômica e continuada da Lei 10.559/2002 ao anistiado, ou seja, a decisão foi contrária à União.
Ao analisar o processo, o relator, desembargador federal Souza Prudente, reconheceu o direito do policial à reparação econômica de forma retroativa, a contar da data em que ele foi reintegrado ao serviço público, com proventos do cargo para o qual foi reintegrado, de agente de polícia, e não de escrivão. Para que alcançasse o cargo de delegado de polícia civil teria ele de ser aprovado em concurso público, destacou Prudente.
O relator verificou que embora a reparação econômica retroativa seja devida pelos prejuízos patrimoniais advindos da perseguição política, a violação cessou no momento da reintegração e, portanto, não há fundamento para a concessão da reparação continuada e permanente.
“Nos termos da Súmula nº 624 do STJ, é possível cumular a indenização do dano moral com a reparação econômica da Lei n. 10.559/2002, haja vista a distinção dos fundamentos que amparam cada uma das prestações. No entanto, em se tratando de anistiado político que foi reintegrado ao antigo emprego não há que se falar na concessão de reparação econômica permanente e continuada, pois essa tem como objetivo a recomposição dos prejuízos materiais, cuja violação cessou no momento da reintegração”, concluiu o magistrado em seu voto.
A decisão do Colegiado foi unânime no sentido de dar parcial provimento tanto à apelação do autor para que os proventos sejam equivalentes ao cargo de agente de polícia quanto ao recurso da União para excluir a reparação econômica permanente e continuada.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. ANISTIA POLÍTICA. REINTEGRAÇÃO AO SERVIÇO PÚBLICO. CUMULAÇÃO COM REPARAÇÃO ECONÔMICA DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. IMPOSSIBILIDADE. LEI 10.559/02. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
I – À luz do princípio da inafastabilidade da jurisdição, é desnecessário o esgotamento das vias administrativas para que o anistiado político pleiteie em juízo os valores que entende devidos, de modo que, esgotadas tais vias, por ainda mais fortes razões, o interessado pode se valer do Poder Judiciário para contestar as conclusões da Comissão de Anistia, não havendo que se falar em competência exclusiva do Ministério da Justiça. Preliminar rejeitada.
II – A orientação jurisprudencial já sedimentada no âmbito de nossos tribunais é no sentido de que a superveniência da Lei 10.559/2002, que regulamentou o disposto no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), constitui renúncia tácita à prescrição, porquanto passou a reconhecer, por meio de regime próprio, direito à indenização aos anistiados políticos.
III – Na hipótese dos autos, em se tratando de anistiado político que foi reintegrado ao cargo que ocupava no serviço público, não há que se falar na concessão de reparação econômica permanente e continuada, de que trata a Lei nº 10.559/2002, pois essa tem como objetivo a recomposição dos prejuízos materiais suportados pelo anistiado, cuja violação cessou no momento da reintegração. Precedentes.
IV – A todo modo, considerando que o autor foi reintegrado ao serviço público apenas em 23/12/1998, é devida a reparação econômica retroativa pelos prejuízos patrimoniais decorrentes da perseguição política, relativamente ao período em que manteve-se afastado de suas atividades funcionais por motivo de perseguição política, observada a remuneração do cargo no qual foi readmitido (Agente de Polícia, Classe Especial, Padrão III).
V – Apelação do autor parcialmente provida. Remessa necessária e Apelação da União Federal parcialmente providas. Sentença reformada, em parte, para reconhecer, tão somente o direito à reparação econômica de forma retroativa, a contar da data em que o autor foi reintegrado ao serviço público (23/12/1998) – relativamente ao período de afastamento de suas funções institucionais, observada a remuneração do cargo no qual foi readmitido (Agente de Polícia, Classe Especial, Padrão III), acrescidos de juros de mora e correção monetária, segundo os índices seguintes: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E.
VI – Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, os honorários advocatícios devem ser compensados, conforme o art. 21 do CPC/1973, vigente à época.
Processo: 0015230-29.2005.4.01.3400