Habeas corpus relacionado à ação que versa sobre propriedade que ainda integra o patrimônio da União deve ser julgado pela Justiça Federal

O julgamento do habeas corpus (HC) impetrado em favor de quatro réus que alegaram estar sofrendo constrangimento ilegal pelo Juízo Federal da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Araguaína/TO e do Ministério Público Federal (MPF) acusados do crime de invasão de terras da União é de competência da Justiça Federal. A conduta dos acusados foi investigada no âmbito da “Operação Terra Arrasada”, na apuração de conflitos fundiários que resultaram em invasão de terras da União e crimes de falsidade ideológica, homicídio, sequestro, incêndio e dano, e de organização criminosa.

A defesa pretende o reconhecimento de que a conduta não seja criminosa porque os direitos sobre a terra em litígio foram repassados para a família dos réus e argumenta que a posse foi ratificada pela justiça estadual do Tocantins. Com isso, sustenta que os acusados são legítimos possuidores da propriedade, não tendo invadido as terras da União, e o constrangimento pelo MPF e pelo juízo federal seriam ilegais.

Na relatoria do processo, o juiz federal convocado Pablo Zuniga Dourado primeiramente analisou que a atuação regular do MPF, prevista no art. 129 da Constituição Federal, na investigação e denúncia ao judiciário, não configura ato de coação e, portanto, não é constrangimento ilegal para impetração do HC.

Ao examinar os demais documentos, o magistrado constatou que o atual HC apenas repete as alegações trazidas em diversas ações de HC perante o TRF1, relativas aos demais crimes denunciados pela “Operação Terra Arrasada”. O relator verificou ainda a existência de acórdão em um desses HC, julgado no TRF1, vinculado à mesma operação, que deixou claro que “inexiste nos autos documentos que comprovem decisão judicial meritória com trânsito em julgado conferindo legitimidade da posse do Lote 268 da Gleba Anajá em favor do paciente, ora embargante. A decisão que deferiu, liminarmente, inaudita altera parte o pedido de reintegração de posse e a que deferiu o reforço da tutela, mediante expedição de novo mandado de manutenção de posse, possuem natureza provisória”.

Nessas condições, o art. 228 do Regimento Interno do TRF1, a jurisprudência do Tribunal e a do Superior Tribunal de Justiça (STJ) “consideram incabível a impetração de habeas corpus com objeto idêntico a outro feito anteriormente examinado no âmbito desta Corte”, concluiu o relator.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. “OPERAÇÃO TERRA ARRASADA”. MANIFESTAÇÃO SUPERVENIENTE. INCABÍVEL. INDICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL COMO AUTORIDADE COATORA. AFASTAMENTO. REITERAÇÃO DE PEDIDOS JÁ EXAMINADOS PELO TRIBUNAL. NÃO CONHECIMENTO.

I – A ação mandamental de habeas corpus é remédio constitucional de uso exclusivo da defesa na proteção do direito de liberdade, para a qual se exige provas pré-constituídas das razões de impetração em procedimento no qual não há litígio entre as partes e não se admite o contraditório das informações prestadas pela Autoridade tida Coatora ou do parecer do Ministério Público. Noutras palavras, “o habeas corpus é ação mandamental que tem por objetivo a tutela do direito de locomoção contra ilegalidade ou abuso de poder e, por isso mesmo, possui cognição sumária e rito célere, razão pela qual não se admite incursão aprofundada na seara fático-probatória dos autos, exige-se que todas as provas sejam pré-constituídas, impede a contradita e afasta a possibilidade de cotejo entre provas divergentes.” (STJ: HC 116.148/BA, Rel. Ministro JORGE MUSSI, 5ª Turma, DJe 01/08/2011).

II – A atuação regular do Ministério Público na promoção dos atos de investigação e no oferecimento da denúncia, regularmente recebida pelo Poder Judiciário, não constitui ato coator gerador de constrangimento ilegal, porquanto, trata-se do regular exercício das relevantes funções institucionais conferidas pela Constituição Federal (art. 129, CF). Por essa razão, deve ser afastada a qualidade de Autoridade Coatora do Ministério Público quando a impetração não demonstra a existência de coação ilegal praticada pelo Órgão Ministerial.

III – A denominada “Operação Terra Arrasada” investiga suposta organização criminosa envolvida em conflitos fundiários que teriam resultado na prática de crimes de falsidade ideológica, invasão de terras da União, homicídio tentado e consumado, sequestro, disparo de arma de fogo, incêndio e dano qualificado, que  ensejaram a impetração de diversos habeas corpus perante este Tribunal, entre os quais para tratar da decisão liminar de natureza provisória que deferiu reintegração de posse da área onde ocorreram os conflitos (HC 1032425-63.2021.4.01.0000/TO, ratificado pelo STJ no julgamento do AgRg no HC 721.090/TO), bem como sobre a competência da Justiça Federal (HC 1029570-14.2021.4.01.0000/TO), os pressupostos da denúncia e a higidez da decisão que a recebeu (HC 1043827-44.2021.4.01.0000/TO, HC 1044168-70.2021.4.01.0000/TO e HC 1044822-57.2021.4.01.0000/TO). Nessas condições, “O art. 228 do RITRF da 1ª Região, em sintonia com a jurisprudência deste Tribunal e do Superior Tribunal de Justiça, consideram incabível a impetração de habeas corpus com objeto idêntico a outro feito anteriormente examinado no âmbito desta Corte. (STJ: AgRg no HC 478.216/RJ). No mesmo sentido, TRF 1ª R: HC 1004752-32.2020.4.01.0000, entre outros.” (TRF 1: HC 1028220-88.2021.4.01.0000).

IV – Indicação do Ministério Público Federal como Autoridade Coatora afastada. Habeas corpus não conhecido.

Processo: 1021789-04.2022.4.01.0000

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