Negado recurso em que o Incra pede anulação de acordo de conciliação em ação de desapropriação

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou recurso do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que pediu a anulação de um acordo homologado em audiência para desapropriação de imóvel rural. O Colegiado entendeu que não cabe pedido de anulação, pois atentaria contra os princípios da segurança jurídica e da confiança legítima.

A ação de desapropriação foi ajuizada em 2001, sendo que em 2014 foi realizada a audiência de conciliação na qual foi celebrado o acordo contestado pelo Incra. A autarquia alegou que houve vício de vontade (quando há manifestação da vontade sem corresponder com verdadeiro querer) ao firmar o acordo e pediu a revisão do valor celebrado a fim de evitar prejuízos aos cofres públicos.

Processo de desapropriação – A Lei Complementar 76/1993, que dispõe sobre o processo de desapropriação de imóvel rural por interesse social para fins de reforma agrária, autoriza o Incra, por meio da sua Procuradoria, a firmar acordo com a parte expropriada.

Segundo o relator do caso, desembargador federal Wilson Alves de Souza, a ata da audiência de conciliação atesta que, no momento de celebração do acordo, estavam presentes o procurador da República, os expropriados (assistidos por seu advogado), o Incra (representado pelo chefe da Divisão de Obtenção de Terras, pela procuradora Federal e pelo administrador responsável pelos cálculos), além de dois peritos do Ministério Público Federal.

Nesse contexto, o relator destacou que não ficou comprovado o vício de vontade e que o caso é uma situação de “venire contra factum proprium”, isto é, “vir contra seus próprios atos”, e que atenta “contra os princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, pois a parte contrária confiou e estava segura de que o acordo em juízo, com a presença de tantos agentes e peritos do Incra e do Ministério Público, homologado pelo Juiz, é um ato sério”.

O recurso ficou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA DE SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. INOCORRÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA em face de sentença que julgou improcedente o pleito para anulação acordo homologado em audiência realizada na ação de desapropriação n. 6938-18.2011.4.01.3506. Em suas razões, sustentou haver vício de vontade, diante da ausência da manifestação do seu órgão colegiado em relação ao acordo, conforme exigência prevista no Memorando Circular PFE/INCRA/nº 23/2010, IN 62/2010 e IN 34/200. Aduziu, ademais, que o valor acordado deveria ser revisto, com o objetivo de evitar prejuízos aos cofres públicos. Subsidiariamente, requereu o afastamento da sua condenação em honorários advocatícios ou a redução do montante arbitrado.

2. A análise da adequação do valor da indenização expropriatória e da capacidade orçamentária e financeira do INCRA não podem ser discutidas em sede de ação anulatória, que versa, tão somente, sobre a legalidade, ou não, do ato de autocomposição homologado pelo Juízo (art. 966, §4º, do CPC/2015).

3. No caso dos autos, a ata (id. 185268048 – Pág. 92) atesta que, na audiência de conciliação, encontravam-se presentes o Procurador da República, os Expropriados (assistidos por seu advogado), o INCRA (representado pelo Chefe da Divisão de Obtenção de Terras, pela Procuradora Federal e pelo Administrador responsável pelos cálculos), além de dois peritos do Ministério Público Federal. Nos termos do acordo (item 5), ficou estabelecido o prazo de 150 (cento e cinquenta) dias para a oitiva do Órgão Colegiado do INCRA, a contar da data da audiência, sob pena de homologação tácita. Não tendo o Conselho Diretor se manifestado no prazo fixado, foi considerado o silêncio como concordância.

4. A legislação que se aplica ao caso concreto é a (especial) Lei Complementar nº 76/93, que dispõe sobre o processo de desapropriação de imóvel rural, por interesse social, para fins de reforma agrária. De acordo com os §§ 3º a 7º, do seu art. 6º, verifica-se que o legislador autorizou o INCRA, através da sua Procuradoria, a firmar acordo com a parte expropriada e que, a despeito da avaliação administrativa, seja apresentado um valor superior ao ofertado. O § 6º fala em integralização do valor acordado, o que só tem sentido na hipótese de o acordo envolver montante maior que a oferta, pois é requisito da inicial que já venha acompanhada do comprovante do seu depósito.

5. O Memorando Circular PFE/INCRA/nº 23/2010, a IN 62/2010 e IN 34/2006, que exigem a aprovação, pelo Conselho Diretor do INCRA, do acordo a ser apresentado em ação de desapropriação, consistem em atos administrativos sem vida autônoma, fundamentando-se sempre em lei anterior, sendo-lhes vedado inovar, criar, extinguir ou modificar, por si, qualquer direito estabelecido pela ordem jurídica em vigor. Assim, não podem tais atos normativos se sobrepor aos limites da LC 76/93, que autoriza o Procurador do INCRA a apresentar acordo em Juízo, sem fazer qualquer referência ao Conselho Diretor.

6. A autorização legal para que seja realizado acordo em Juízo é específica para as ações de desapropriação para fins de reforma agrária, na forma da Lei Complementar 76/93, não se submetendo essas demandas expropriatórias à regra geral prevista na Lei 9.469/97, cujo teor, inclusive, já sofreu alterações, para exclusão das autarquias do seu texto, não tem aplicabilidade no caso concreto.

7. Nesse contexto, o caso é de venire contra factum proprium, de modo que, à falta de um fundamento sério para a demanda, atenta-se contra os princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, pois a parte contrária confiou e estava segura de que o acordo em juízo, com a presença de tantos agentes e peritos do INCRA e do Ministério Público, homologado pelo Juiz, é um ato sério.

8. Uma demanda dessa exigiria alegação e demonstração de que teria ocorrido fraude com superfaturamento do valor acordado, necessitando acusar disso os peritos do INCRA e do Ministério Público que indicaram o valor justo acordado. Mas nada disso consta na petição inicial.

9. Onde não há vício de vontade, não há lugar para acolhimento de pedido de anulação de sentença homologatória de acordo.

10. Mantida a condenação em honorários advocatícios em 5% sobre o valor atualizado da causa, eis que dentro dos parâmetros legais estabelecidos pelo artigo 85, §3º, do CPC.

11. Apelação desprovida.

A decisão foi unânime.

 

Processo: 0001788-46.2017.4.01.3506

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar