A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que determinou o pagamento pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de aposentadoria por idade para uma trabalhadora rural, na qualidade de segurada especial.
O INSS interpôs apelação sob alegação de que ela não tem direito ao benefício, porque possui endereço urbano, seu marido trabalhou por alguns anos na administração municipal e possui veículos em seu nome, e não há prova material de exercício da atividade rural.
O relator do caso, desembargador federal Wilson Alves de Souza, explicou que todos os elementos no processo comprovam o direito à aposentadoria por idade, na qualidade de segurada especial. “Consta do processo, ainda, extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) em nome próprio, sem registro de qualquer vínculo. Esse substrato atende ao início razoável de prova material reclamado pelo art.55, §3º, da Lei 8.213/91”, observou.
O magistrado ressaltou que uma das testemunhas afirmou que conhece a trabalhadora há 34 anos, pois moravam um na frente do outro. Ela fazia todo tipo de trabalho de roça e seu marido trabalha até hoje como diarista para ele. Ela e o marido compraram dele um pedaço de terra, onde criam e vendem frango, plantam guariroba, mandioca, e fazem farinha.
“A prova testemunhal se revelou apta à complementação do início de prova material, prestada na forma da lei, e corroborou o início de prova material, atestando que a autora se dedicou à atividade rural pelo período exigido”, considerou.
Para o relator, a mera informação da existência de veículos (moto e carro popular) em nome do marido, não é suficiente para anular “todo um conjunto probatório favorável à qualidade de segurada especial da autora”. Além disso, o fato de possuir atualmente endereço urbano, também não anula a sua qualidade de trabalhadora rural, “pois nada impede que, após o implemento da carência, haja a mudança de domicílio, além do que, mesmo residindo em área urbana, pode haver o deslocamento para a zona rural diariamente”.
O recurso ficou assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA RURAL. SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHA. DIREITO AO BENEFÍCIO. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS contra a sentença que julgou procedente o pedido inicial, assegurando à autora a percepção de aposentadoria por idade, na qualidade de segurada especial
2. Não há falar em prescrição, uma vez que não há parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação.
3. No caso concreto, a Autora completou 55 anos em 2018, exigindo-se, portanto, o período de carência correspondente a 180 meses, a começar de 2003. Foram colacionados aos autos, com o fim de comprovar a qualidade de segurada/carência da Autora, os seguintes documentos: certidão de casamento, emitida em 1983, qualificando seu cônjuge como lavrador; certidões dos filhos em comum, nascidos em 1985 e 1987, qualificando o genitor como lavrador; histórico escolar do ensino fundamental em escola municipal, referente aos anos de 1992 a 1996, constando endereço rural – Fazenda São João. Consta do processo, ainda, extrato do CNIS em nome próprio, sem registro de qualquer vínculo. Esse substrato atende ao início razoável de prova material reclamado pelo art.55, §3º, da Lei 8.213/91.
4. A prova testemunhal se revelou apta à complementação do início de prova material, prestada na forma da lei, corroborou o início de prova material, atestando que a Autora se dedicou à atividade rural pelo período exigido. A primeira testemunha afirmou conhecer a Autora há 34 anos, pois moravam um na frente do outro. Informou que possuía uma fazenda e a Autora mudou p/ um retiro na frente. Asseverou que ela fazia todo tipo de trabalho de roça, e, ainda, que seu cônjuge até hoje trabalha para o depoente, como diarista. Declarou que, juntamente com outras pessoas, comprou um pedaço de terra, loteou e vendeu para pessoas que trabalhavam na roça, inclusive para a Autora, surgindo então um povoado. Acrescentou que ela e o marido criam e vendem frango, plantam gueroba, mandioca, fazem farinha. A segunda, por sua vez, declarou que conhece a Autora há 35 anos, pois eram vizinhos de fazenda. Informou que já utilizou dos serviços dela, como por exemplo, fazer queijo. Disse que ela morava na fazenda do Jazi, onde morou por 30 anos, e depois foi para São João. Declarou que, na fazenda do Jazi, ela e o esposo cuidavam do imóvel, produzindo milho, mandioca, porcos, galinhas, ovos. Confirmou a informação sobre o loteamento referido pela primeira testemunha, e disse que lá a Autora criava porcos, galinhas, produzia itens para fazer farinha.
5. Demonstrado, assim, o efetivo trabalho rural, nos termos do art. 48, §§1º e 2º, da Lei 8.213/91, vale esclarecer que a mera informação da existência de veículos (moto e carro popular) em nome do marido não é bastante para infirmar todo um conjunto probatório favorável à qualidade de segurada especial da Autora. Aliado a isso, o fato de possuir atualmente endereço urbano não infirma a qualidade de trabalhadora rurícola, pois nada impede que, após o implemento da carência, haja a mudança de domicílio, além do que, mesmo residindo em área urbana, pode haver o deslocamento para a zona rural diariamente.
6. O vínculo urbano mantido pelo cônjuge com a Administração Municipal entre os anos de 2001 a 2005 não afasta a qualidade de segurada especial. Isso porque a desqualificação de um dos cônjuges como rurícola pode não alcançar o outro cônjuge como segurado especial da Previdência Social, se ficar comprovado que este é, de fato, trabalhador rural. Assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça, em julgado submetido à sistemática dos recursos repetitivos, consolidando o entendimento de que “o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)” REsp 1304479/SP.
7. Confirmado o direito à aposentadoria por idade, no valor de um salário-mínimo vigente em cada competência, o termo inicial do benefício deve coincidir com a data do requerimento administrativo, na forma do art. 49, II, da Lei nº 8.213/91.
8. Honorários advocatícios majorados em 1% (um por cento), nos termos do § 11º do art. 85 do CPC.
9. Apelação desprovida.
Diante disso, o Colegiado negou provimento à apelação, nos termos do voto do relator.
Processo nº: 1027917-21.2019.4.01.9999