Luvas, férias, adicionais e 13º salário de atletas integram base de cálculo de contribuições previdenciárias para terceiros

Decisão do TRF3 confirmou parcialmente sentença que negou mandado de segurança impetrado pelo São Paulo Futebol Clube

A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou a legalidade da incidência de contribuições previdenciárias para terceiros sobre pagamentos efetuados a título de bônus de contratação de atletas (luvas), férias, adicionais de hora extra, noturno e periculosidade e décimo terceiro salário.

A decisão foi proferida em recurso do São Paulo Futebol Clube (SPFC) contra sentença da 14ª Vara Cível, em mandado de segurança. A Justiça Federal havia negado o pedido para que fosse reconhecida a ilegalidade nos pagamentos efetuados pelo clube da incidência de contribuições para o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Serviço Nacional do Comércio (SESC), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

O valor pago a título de “luvas” é comum na contratação de atletas por clubes esportivos e decorre de cláusula diretamente relacionada à assinatura de novo contrato de trabalho ou de prestação de serviços.

Na ação, o SPFC alegava que, por ser associação desportiva e manter equipe de futebol profissional, está sujeito à contribuição previdenciária patronal na ordem de 5% sobre a receita de bilheteria de eventos esportivos, bem como a contribuições para terceiros, calculadas sobre folha de salários.

O clube sustentava ainda que é ilegal a imposição de contribuições a terceiros, por não terem natureza salarial, e pedia a desoneração das verbas e a recuperação de valores recolhidos indevidamente.

Ao analisar o recurso, o relator do processo no TRF3, desembargador federal Wilson Zauhy, confirmou a legalidade da incidência das contribuições a terceiros sobre férias, salário-paternidade, adicionais de hora extra, noturno e periculosidade, décimo terceiro e bônus de contratação.

“Conforme já analisado por esta Turma, o valor pago a título de bônus de contratação (“luvas”) ostenta natureza remuneratória, incidindo sobre ele contribuições previdenciárias e a terceiros”, destacou.

No entanto, o magistrado pontuou que não incide contribuição a terceiros sobre salário-maternidade, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário 576.967.

Na decisão, o desembargador federal também reconheceu o direito à compensação, com limitações impostas pela legislação.

“Há restrições que tomam em conta o período de apuração das contribuições sociais e de terceiros, sendo certo que a compensação nos moldes do artigo 74, da Lei 9.430/1996 igualmente não se revela possível para aquelas exações anteriores à utilização do e-Social (ou para exações posteriores que serão compensadas com tributos anteriores à utilização do e-Social)”, concluiu o relator.

O recurso ficou assim ementado:

MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÕES A TERCEIROS. BÔNUS DE CONTRATAÇÃO (“LUVAS”). FÉRIAS GOZADAS. SALÁRIO MATERNIDADE. LICENÇA PATERNIDADE. ADICIONAL DE HORAS EXTRAS. ADICIONAL NOTURNO/PERICULOSIDADE. 13º SALÁRIO. COMPENSAÇÃO.

1. Conforme já analisado por esta Turma, o valor pago a título de bônus de contratação (“luvas”) ostenta natureza remuneratória, incidindo sobre ele contribuições previdenciárias e a terceiros (APELAÇÃO CÍVEL ApCiv 0000129-72.2007.4.03.6100, RELATOR DES FED HELIO NOGUEIRA:, TRF3 – PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/10/2018).

2. As férias gozadas constituem licença autorizada do empregado expressamente prevista pelo artigo 129 da CLT, sendo que neste período o empregado fará jus ao recebimento da remuneração. Nestas condições, os valores pagos sob este título ostentam evidente natureza salarial, de modo que sua inclusão na base de cálculo da contribuição é legítima.

3. Em recente decisão, o STF, no RE 576.967, decidiu que “É inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade”.

4. O STJ tem entendimento pacífico de que a contribuição previdenciária incide sobre o salário paternidade.

5. O pagamento de adicional às horas extraordinárias é previsto pelo artigo 7º, XVI, da Constituição Federal e deve corresponder, no mínimo, a cinquenta por cento do valor da hora normal. Trata-se de verdadeiro acréscimo à hora normal de trabalho como retribuição ao trabalho além da jornada normal, restando evidenciada sua natureza remuneratória. Nestas condições afigura-se legítima a incidência tributária sobre o respectivo valor.

6. Com relação aos valores pagos a título de adicional noturno/periculosidade/insalubridade, tanto o C. STJ quanto esta Egrégia Corte Regional têm se manifestado no sentido de que tais verbas integram a remuneração do empregado, representando, assim, base de cálculo para as contribuições previdenciárias previstas pela Lei n. 8.212/1991.

7. Legítima a incidência da contribuição previdenciária sobre o valor pago a título de 13º salário, ante sua evidente natureza remuneratória.

8. A compensação só pode ser efetuada após o trânsito em julgado (art. 170-A do CTN), e o crédito deve ser corrigido exclusivamente pela taxa Selic.  Obviamente mantém-se o direito da autoridade competente de fiscalizar a compensação efetuada. A compensação deverá observar a legislação pertinente. Cabe acrescentar, também, que o prazo prescricional a ser observado é o quinquenal (artigo 168 do CTN).

9. Com relação à legislação aplicável à compensação,  tese comum levantada pelos contribuintes é de que têm direito de optar pela lei vigente à época do encontro de contas na compensação administrativa, traçando uma possível distinção quanto à forma da compensação, distinguindo-se a judicial, que deveria observar a data do ajuizamento do pedido, da administrativa, em que vigoraria a legislação existente na data do encontro de contas.

10. Sob esse aspecto, na linha do entendimento do REsp 1.137.738, pode-se afirmar que tratando-se de compensação tributária, deve ser considerado o regime jurídico vigente à época do ajuizamento da demanda, não podendo ser a causa julgada à luz do direito superveniente.

11. Essa regra, portanto, não é absoluta, e foi relativizada (esclarecida) pelo Superior Tribunal de Justiça, que, a par desse entendimento primeiro, admite a possibilidade de legislação posterior disciplinar a compensação de forma diversa da existente no momento do ajuizamento, permitindo a aplicação da lei vigente no momento do encontro de contas.

12. Confira-se o que restou decidido pelo STJ no REsp 1.164.452: “É importante não confundir esse entendimento com o adotado pela jurisprudência da 1a. Seção, a partir do Eresp 488.452 (Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 07.06.04), precedente, que, às vezes, é interpretado como tendo afirmado que a lei aplicável à compensação é a data da propositura da ação. Não foi isso o que lá se decidiu, até porque, para promover a compensação tributária, não se exige o ajuizamento da ação. O que se decidiu, na oportunidade, após ficar historiada a evolução legislativa corrida nos anos anteriores tratando da matéria de compensação tributária, foi, conforme registrou a ementa, simplesmente que: ‘6. É inviável, na hipótese, apreciar o pedido à luz do direito superveniente, porque os novos preceitos normativos, ao mesmo tempo em que ampliaram o rol das espécies normativas, ao mesmo tempo em que ampliaram o rol das espécies tributárias compensáveis, condicionaram a realização da compensação a outros requisitos, cuja existência não constou da causa de pedir e nem foi objeto de exame nas instâncias ordinárias’. Em outras palavras, o que se disse é que não se poderia julgar aquela causa, então em fase de embargos infringentes, à luz do direito superveniente à propositura da demanda. De modo algum se negou a tese de que a lei aplicável à compensação é a vigente à data do encontro de contas. Pelo contrário, tal tese foi, na oportunidade, explicitamente afirmada no item 4 do voto que proferi como relator. Mais: embora julgando improcedente o pedido, ficou expressamente consignada a possibilidade da realização da compensação à luz das normas (que não as da data da propositura da ação) vigente quando da efetiva realização da compensação (ou seja, do encontro de contas). Constou da ementa: ‘7. Assim, tendo em vista a causa de pedir posta na inicial e o regime normativo vigente à época da postulação (1995), é de se julgar improcedente o pedido, o que não impede que a compensação seja realizada nos termos atualmente admitidos, desde que presentes os requisitos próprios.” (grifei)

13. Como se extrai da orientação jurisprudencial, não existe a aponta rigidez quanto aos requisitos da compensação tributária, dado que esse mecanismo mostrou-se, nos últimos tempos, extremamente dinâmico no que se refere a seus requisitos e limites, a exemplo do advento do artigo 26-A, já referido.

14. Ocorre que no campo das contribuições tributárias, o regime previsto em lei para o encontro de contas sempre foi o de permitir esse ajuste, exclusivamente, com tributos da mesma espécie.

15. Com o advento da Lei n. 11.457/2007, que introduziu o artigo 26-A, rompendo aquela restrição à compensação de tributos de espécies diversas, criou-se a falsa ideia de que a partir do advento da nova regra todas as contribuições declaradas repetíveis em favor do contribuinte, poderiam ser compensadas, não só com as mesmas contribuições vincendas, como também com quaisquer outros tributos administrados pela Receita Federal do Brasil. Tendo em conta essa interpretação, apressada, da legislação superveniente, estabeleceu-se nova discussão sobre a forma, o momento e os limites da compensação tributária da espécie contribuição social. Essa discussão, no entanto, perde qualquer sentido quando se realiza a leitura da nova regra (art. 26-A, da Lei 9.430/96), dado que a nova disciplina estabeleceu limites temporais para a realização da compensação ampliada (contribuição com tributos de espécies diversas), convivendo o instituto da compensação com a disciplina anterior, restritiva (contribuição com contribuição, exclusivamente).

16. E essa convivência de duas possibilidades de compensação tributária é que tem gerado a falsa expectativa dos contribuintes acerca da possibilidade de se aplicar a nova regra sem levar em conta o momento em que o indébito tributário efetivamente ocorreu. O artigo 26, da Lei 9.430/96 não foi revogado, aplicando-se a todas as hipóteses não contempladas no artigo 26-A. O artigo 26-A da Lei 9.430/96 apenas afastou a aplicabilidade, nos casos expressamente consignados, do artigo 74, da Lei 9430/96. Isso porque, como se fará ver, doravante, o novel instituto possibilitou a compensação ampliada apenas para os créditos constituídos sob a modalidade de pagamento pelo eSocial.

17. Para os créditos constituídos (com direito à repetição reconhecido) fora dessa modalidade de declaração e pagamento (eSocial), aplica-se a norma do artigo 26, da Lei 9.430/96, que não foi revogado. Com relação à definição dos tributos compensáveis, impõe-se a observância do disposto no artigo 26-A da Lei 11.457/2007, tendo em vista que atualmente é o dispositivo que está em vigor, prevendo limitações a serem observadas pelo contribuinte. A Jurisprudência formada no Superior Tribunal de Justiça não contradiz a interpretação legal ora formulada, como se vê do precedente já referido. Passa-se, assim, à análise dos termos do disposto na legislação superveniente.

18. Como se percebe pela dicção do artigo 26-A da Lei 11.457/2007, para que o contribuinte possa compensar seus créditos com outros tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, diversas condições devem ser preenchidas. Essa possibilidade tem por mira contribuições sociais previstas pelo art. 11, parágrafo único, alíneas “a”, “b”, “c”, da Lei n. 8.212/1991 e contribuições de terceiro, e o contribuinte deve se valer do recém-instituído e-Social, não podendo ser estendida aos demais sujeitos passivos de obrigações tributárias, nem mesmo para o empregador doméstico.
Portanto, o afastamento da disciplina posta pelo  art. 74 da Lei n. 9.430/1996 não induz à conclusão de que qualquer crédito constituído antes do advento (e da adesão) ao e-Social possa ser objeto de compensação com quaisquer tributos administrados pela Receita Federal do Brasil; as condições impostas pela lei para tal modalidade de compensação são bem claras: não são compensáveis a) débitos apurados anteriormente ao e-Social e b) créditos das contribuições relativos a períodos anteriores. Em suma: só se admite a compensação indistinta de créditos novos com débitos novos.

19. Há, portanto, restrições que tomam em conta o período de apuração das contribuições sociais e de terceiros, sendo certo que para aquelas exações anteriores à utilização do e-Social (ou para exações posteriores que serão compensadas com tributos anteriores à utilização do e-Social), a compensação nos moldes do art. 74, da Lei n. 9.430/1996 igualmente não se revela possível.

20. Apelação da impetrante parcialmente provida.

Apelação Cível 5029652-58.2018.4.03.6100

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