O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) manteve sentença de primeiro grau que determinou a demolição de uma casa de veraneio construída há cerca de 50 anos em Área de Proteção Ambiental (APA) na Ilha do Óleo Cru, situada às margens do Rio Paraná. Em julgamento por sessão virtual ocorrido ontem (7/7), a 3ª Turma da Corte reafirmou o entendimento de que não há previsão legal que autorize o uso e a exploração de áreas públicas situadas em APA por particulares, e que a mera construção nesses locais já presume a existência de dano ambiental.
A ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o proprietário do imóvel faz parte de um inquérito civil instaurado em 2014, que busca a desocupação e demolição de construções ilícitas e a recuperação ambiental em toda APA das Ilhas e Várzeas do Rio Paraná localizadas no município de São Pedro do Paraná.
Segundo o órgão ministerial, a construção teria destituído a vegetação nativa de Mata Atlântica do local. O MPF também apontou que o imóvel não possui sistema adequado de coleta e tratamento de esgoto, representando risco de erosão e contaminação do solo e de rios adjacentes.
Em agosto de 2017, ao julgar o mérito do processo, a 1ª Vara Federal de Paranavaí acolheu os pedidos do MPF e determinou ao proprietário que providenciasse a demolição da residência e a recuperação ambiental da área degradada, sob orientação e fiscalização do Instituto Ambiental do Paraná (IAP). Anteriormente, o juízo de primeiro grau já havia autorizado liminarmente a lacração do imóvel. A sentença também impôs ao dono da casa o pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 10 mil.
Ele recorreu da decisão ao TRF4. No recurso de apelação, alegou que não poderia ser responsabilizado pelo dano ambiental, pois a área em litígio foi adquirida de terceiro.
A 3ª Turma, por unanimidade, manteve a determinação de demolição do imóvel e recuperação da área degradada, apenas revogando o pagamento da indenização por danos morais coletivos que havia sido determinado em primeira instância.
Em relação a recuperação da área danificada, a desembargadora federal Marga Inge Barth Tessler explicou em seu voto que, caso seja constatada a impossibilidade de restauração integral, o proprietário terá que pagar indenização pecuniária como forma de compensação, com valor a ser destinado ao Fundo Nacional do Meio Ambiente e calculado em liquidação de sentença.
Quanto a negativa do pedido de danos morais coletivos feito pelo MPF, a relatora da apelação considerou que não ficou demonstrado nos autos do processo a existência de prejuízo sensível para a coletividade decorrente da construção.
O recurso ficou assim ementado:
AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. DANO AMBIENTAL. RIO PARANÁ. ILHA. EDIFICAÇÃO. DEMOLIÇÃO. RESTAURAÇÃO AMBIENTAL. INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. DANOS MORAIS COLETIVOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
Mantida a sentença que, em ação civil pública, na parte em que determinou a demolição de edificação e restauração ambiental de imóvel localizado em ilha do Rio Paraná.
A indenização pecuniária, no caso, apenas será devida caso constatada a impossibilidade de restauração integral, a ser comprovada em liquidação de sentença.
Reformada a sentença quanto aos danos morais coletivos, levando-se em conta que, no caso, não foi demonstrado prejuízo sensível para a coletividade advindo da edificação em ilha.
Não são devidos honorários advocatícios ao MPF em ação civil pública.
Coleciono as ementas condutoras:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. IMOVEL CUJA OCUPAÇÃO FOI EXPRESSAMENTE AUTORIZADA PELA UNIÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA UNIÃO. PRECEDENTE. PRESUNÇÃO DE DANO AMBIENTAL POR CONSTRUÇÃO EM APP.
1. A área em que construída a residência está cadastrada no Serviço do Patrimônio da União, que autorizou a ocupação do local. Responde a União objetiva e solidariamente pela recuperação do local, ainda que não tenha contribuído para a ocorrência do dano, pois a edificação no local faz presumir o impedimento de regeneração da vegetação local em área de preservação permanente (Precedente do TRF da 4ª Região)
2. O descumprimento da legislação protetiva do meio ambiente por outrem, ou a omissão do Estado na fiscalização, não autorizam a exclusão da responsabilidade daquele que a descumpre.
3. Prescinde-se da comprovação de dano ambiental no caso de construção em área de preservação permanente sem autorização ambiental válida. 4. Apelação da União parcialmente provida, para redução do valor do dia multa. (TRF4, AC 5003796-36.2013.404.7201, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 04/08/2015). Grifei
DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO AMBIENTAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÃO IRREGULAR. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – APP. MATA ATLÂNTICA. VEGETAÇÃO DE RESTINGA. TERRENO DE MARINHA. DANO AMBIENTAL. OBRIGAÇÃO DE REPARAR. INDENIZAÇÃO. PRECEDENTES. . A obrigação de recompor o meio degradado tem natureza propter rem, ou seja, é inerente à função socioambiental da propriedade, de modo que acompanha o imóvel e pode ser exigida dos adquirentes posteriores, ainda que não tenham sido autores da lesão ecológica. Causa dano ecológico in re ipsa, presunção legal definitiva que dispensa produção de prova técnica de lesividade específica, quem, fora das exceções legais, desmata, ocupa ou explora APP, ou impede sua regeneração. (TRF4, AC 5002328-84.2011.404.7208, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Sérgio Renato Tejada Garcia, juntado aos autos em 21/08/2015). Grifei
ADMINISTRATIVO. JARDIM BOTÂNICO DO RIO DE JANEIRO. BEM PÚBLICO. DECRETO-LEI 9.760/46 PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL. BEM TOMBADO. ARTS. 11 E 17 DO DECRETO-LEI 25/1937. OCUPAÇÃO POR PARTICULARES. CONSTRUÇÃO. BENFEITORIAS. INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO DE RETENÇÃO. DESCABIMENTO. ARTS. 100, 102, 1.196, 1.219 E 1.255 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. […] 2. Os remanescentes 140 hectares, que atualmente formam o Jardim Botânico, são de propriedade da União, o que, independentemente das extraordinárias qualidades naturais e culturais, já obriga que qualquer utilização, uso ou exploração privada seja sempre de caráter excepcional, por tempo certo e cabalmente motivada no interesse público. 3. Não obstante leis de sentido e conteúdo induvidosos, que salvaguardam a titularidade dos bens confiados ao controle e gestão do Estado, a história fundiária do Brasil, tanto no campo como na cidade, está, infelizmente até os dias atuais, baseada na indevida apropriação privada dos espaços públicos, com freqüência às claras e, mais grave, até com estímulo censurável, tanto por ação como por leniência, de servidores públicos, precisamente aqueles que deveriam zelar, de maneira intransigente, pela integridade e longevidade do patrimônio nacional. 4. Além de rasgar a Constituição e humilhar o Estado de Direito, substituindo-o, com emprego de força ou manobras jurídicas, pela “lei da selva”, a privatização ilegal de espaços públicos, notadamente de bens tombados ou especialmente protegidos, dilapida o patrimônio da sociedade e compromete o seu gozo pelas gerações futuras. 5. Consoante o Código Civil (de 2002), “Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião” (art. 102) e os “de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação” (é o caso do Jardim Botânico), nos termos do art. 100. […] 6. A ocupação, a exploração e o uso de bem público – sobretudo os de interesse ambiental-cultural e, com maior razão, aqueles tombados – só se admitem se contarem com expresso, inequívoco, válido e atual assentimento do Poder Público, exigência inafastável tanto pelo Administrador como pelo Juiz, a qual se mantém incólume, independentemente da ancianidade, finalidade (residencial, comercial ou agrícola) ou grau de interferência nos atributos que justificam sua proteção. 7. Datar a ocupação, construção ou exploração de longo tempo, ou a circunstância de ter-se, na origem, constituído regularmente e só depois se transformado em indevida, não purifica sua ilegalidade, nem fragiliza ou afasta os mecanismos que o legislador instituiu para salvaguardar os bens públicos. Irregular é tanto a ocupação, exploração e uso que um dia foram regulares, mas deixaram de sê-lo, como os que, por nunca terem sido, não podem agora vir a sê-lo. 8. No que tange ao Jardim Botânico do Rio, nova ou velha a ocupação, a realidade é uma só: o bem é público, tombado, e qualquer uso, construção ou exploração nos seus domínios demanda rigoroso procedimento administrativo, o que não foi, in casu, observado. 9. Na falta de autorização expressa, inequívoca, válida e atual do titular do domínio, a ocupação de área pública é mera detenção ilícita (“grilagem”, na expressão popular), que não gera – nem pode gerar, a menos que se queira, contrariando a mens legis, estimular tais atos condenáveis – direitos, entre eles o de retenção, garantidos somente ao possuidor de boa-fé pelo Código Civil. Precedentes do STJ. 10. Os imóveis pertencentes à União Federal são regidos pelo Decreto-Lei 9.760/46, que em seu art. 71 dispõe que, na falta de assentimento (expresso, inequívoco, válido e atual) da autoridade legitimamente incumbida na sua guarda e zelo, o ocupante poderá ser sumariamente despejado e perderá, sem direito a indenização, tudo quanto haja incorporado ao solo, ficando ainda sujeito ao disposto nos arts. 513, 515 e 517 do Código Civil de 1916. 11. A apropriação, ao arrepio da lei, de terras e imóveis públicos (mais ainda de bem tombado desde 1937), além de acarretar o dever de imediata desocupação da área, dá ensejo à aplicação das sanções administrativas e penais previstas na legislação, bem como à obrigação de reparar eventuais danos causados.[…]16. Inexiste boa-fé contra expressa determinação legal. Ao revés, entende-se agir de má-fé o particular que, sem título expresso, inequívoco, válido e atual ocupa imóvel público, mesmo depois de notificação para abandoná-lo, situação típica de esbulho permanente, em que cabível a imediata reintegração judicial. 17. Na ocupação, uso ou exploração de bem público, a boa-fé é impresumível, requisitando prova cabal a cargo de quem a alega. Incompatível com a boa-fé agir com o reiterado ânimo de se furtar e até de burlar a letra e o espírito da lei, com sucessivas reformas e ampliações de construção em imóvel público, por isso mesmo feitas à sua conta e risco. […]20. Recurso Especial não provido. (REsp 808.708/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2009, DJe 04/05/2011). Grifei
DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÃO IRREGULAR EM ÁREA DE MARINHA. ZONA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DEMOLIÇÃO. RECUPERAÇÃO DA ÁREA. 1. Além de configurar terreno de marinha, a área em que está situada a construção localiza-se em Zona de Preservação Permanente (ZPP) prevista na Lei Orgânica do Município de Laguna/SC, consoante informado pela Administração Municipal. 2. Embora prática temerária da Administração, a ausência de resposta aos pedidos efetuados pelo requerido junto do Serviço de Patrimônio da União, em face das normas citadas, cujos preceitos, sem sombra de dúvida são cogentes, não tem o condão de possibilitar ao particular que se apodere do bem, utilizando segundo seus próprios interesses. 3. As praias são bens públicos de uso comum, isto é, de utilização comum pela coletividade, devendo seu acesso ser garantido a todos e não podem ser objeto de apropriação privada, mesmo quando seus elementos constitutivos pertençam a particulares. 4. A apropriação e transformação da praia para interesses meramente individuais, vai em sentido diametralmente oposto à destinação comum dada pelo legislador, devendo essa atitude ser coibida pelas vias competentes, impedindo que um bem dessa natureza seja modificado a bel prazer de alguns, que acreditam que possuem direito exclusivo sobre ele. 5. Sob este prisma exsurge inarredável a necessária ingerência do Judiciário sobre o mundo fático. Ocorre que, num mundo como o atual, onde cada vez mais, os problemas ambientais vêm degradando a qualidade de vida, todos têm responsabilidades a assumir e o Poder Judiciário, uma vez provocado, deve fazer prevalecer os postulados constitucionais e a lei, voltando-se para uma interpretação comprometida com essa realidade, para a melhoria do ecossistema. 6. Impõe-se a demolição da construção irregular (imóvel de alvenaria) e condenação do réu em proceder à completa reparação da área, através da remoção dos detritos, bem como pela plantação da vegetação característica do local. (TRF4, AC 2002.72.07.008762-6, Quarta Turma, Relator Marga Inge Barth Tessler, D.E. 27/08/2007). Grifei
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. EXTRAPOLAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA CONSTRUÇÃO. INVASÃO DE ÁREA PÚBLICA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL. ORLA DO LAGO PARANOÁ. CONSTRUÇÃO IRREGULAR. MÁ-FÉ. VIOLAÇÃO ÀS LEGISLAÇÕES AMBIENTAL E DISTRITAL. DEMOLIÇÃO. EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA. LEGITIMIDADE. […] 4. Irregularidades na construção decorrentes não apenas da inobservância à legislação ambiental, mas, também, do fato de ter sido efetuada com invasão de área pública. Caráter público das áreas ocupadas admitido pelos próprios impetrantes e reconhecido em sede judicial. Possibilidade de exercício do poder de polícia pela Administração. Improcedência da pretensão mandamental. 5. Conforme ressaltado pelo Ministério Público Federal, não há ‘maneira adequada’ de ocupar indevidamente área pública; o caráter público do bem não se subordina à apreciação subjetiva de seu ocupante; o manejo do direito de ação não pode servir de artifício para prolongar situação juridicamente insustentável em benefício de quem conscientemente e de má-fé se apropria de bem público, nele edifica heliponto e quadra de tênis sem autorização e se locupleta ilicitamente. 6. Recurso ordinário não-provido. (RMS 22.067/DF, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/08/2007, DJ 30/08/2007, p. 213). Grifei
AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANO AMBIENTAL. COMPROVAÇÃO. DEMOLIÇÃO E RECUPERAÇÃO DA ÁREA. Verificada a realização de construção irregular na faixa litorânea, sem qualquer licenciamento administrativo, deve ser determinada a demolição recuperação da área degradada. (TRF4, AC 5008547-06.2012.404.7200, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 03/12/2015). Grifei
Em caso análogo ao presente (construção de casa de veraneio em APA das Ilhas e Várzeas do Rio Paraná), já se manifestou o TRF da 4ª Região, destacando mais uma vez a importância da atuação do Poder Público em coibir o abuso de direito em detrimento da preservação do meio ambiente. Veja-se:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. LOCALIDADE DE PORTO FIGUEIRA. EDIFICAÇÃO SITUADA EM ÁREA DE PROTEÇÃO ESPECIAL DAS ILHAS E VÁRZEAS DO RIO PARANÁ, NO ENTORNO DA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO PARQUE NACIONAL DE ILHA GRANDE. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO PELOS ÓRGÃOS COMPETENTES. OCUPAÇÃO IRREGULAR. ZONA URBANA CONSOLIDADA. AUSÊNCIA DE EXCEÇÃO LEGAL. RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL. PROVIMENTO DAS APELAÇÕES. 1. É incontroverso nos autos que a área objeto desta lide, onde se localiza o imóvel do réu, encontra-se em Área de Preservação Permanente (APP), pois dista apenas 10 (dez) metros da margem do Rio Paraná, rio este que possui, em média, mais de 600 (seiscentos) metros de largura, em contrariedade ao que dispõe as regras protetivas ambientais, em especial o artigo 4º da Lei 12.651/2012, que repetiu previsão do antigo Código Florestal (art. 2º da Lei 4.771/65). 2. Mesmo que se admita que o Distrito de Porto Figueira teve sua criação iniciada desde os idos de 1960, a existência de edificações/construções irregulares no local não convalida o dano provocado pelo réu. É certo que a Lei n.º 4.771/1965 não permitia a supressão de vegetação em APP’s, exceto quando demonstrada utilidade pública ou interesse social e inexistência de alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, mediante autorização do órgão ambiental competente (art. 4º). Na hipótese, não há qualquer elemento de prova acerca da existência de autorização dos órgãos competentes. 3. Existe, na legislação e jurisprudência, certa tolerância para ocupação de áreas de preservação permanente em situações excepcionais, quando envolver hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental, conforme o arts. 8º da Lei n. 12.651/12, ou ainda nas áreas consolidadas, para moradia, conforme os artigos 64 e 65 do mesmo diploma legal. Todavia, tais requisitos não se verificam no caso, pois a casa do réu é utilizada para veraneio. 4. Por conseguinte, mesmo que o poder público tenha dotado a região de serviços públicos como luz, água e telefone, subsiste a qualidade de área de preservação permanente e a ilegalidade da construção sem suporte em autorizações válidas. 5. Além disso, quanto ao argumento de que o réu não teria causado danos ao meio ambiente, pois já teria adquirido o imóvel de outrem, a obrigação de recompor o meio degradado é propter rem, inerente à função socioambiental da propriedade, de modo que acompanha o imóvel e pode ser exigida dos adquirentes posteriores, ainda que não tenham sido autores da lesão ecológica. Precedentes. […] 6. Destaque-se que eventual dano anterior à área não retira dela a qualidade de área de preservação permanente, pois, se assim fosse, os loteamentos implantados com infração à legislação ambiental tornar-se-iam legais pela degradação completa do meio ambiente, justamente aquilo que a lei procura reprimir. 7. Em relação ao fundamento de que por se tratar de área com ocupação consolidada nenhum efeito surtirá ao meio ambiente a demolição da edificação, o STJ já entendeu que “ante o princípio da melhoria da qualidade ambiental, adotado no Direito brasileiro (art. 2°, caput, da Lei 6.938/81), inconcebível a proposição de que, se um imóvel, rural ou urbano, encontra-se em região já ecologicamente deteriorada ou comprometida por ação ou omissão de terceiros, dispensável ficaria sua preservação e conservação futuras (e, com maior ênfase, eventual restauração ou recuperação)”: 8. Quanto ao argumento de baixo impacto ambiental, comumente levantado em situações como a dos autos, em construções erigidas em áreas non aedificanti, a questão do baixo impacto “demanda avaliação na perspectiva de cada empreendimento, em si, isoladamente, mas sobremaneira na perspectiva do conjunto, ou seja, daquilo que se poderia chamar de universalidade ecológica: os seus efeitos cumulativos, grau de saturamento da região, sinergias, peculiaridades locais (existência, p. ex., de espécies ameaçadas de extinção), fragilidade do bioma”. Dessa forma, devem ser os impactos avaliados sob a perspectiva do conjunto, a “universalidade ecológica”. […]10. Diante disso, a apropriação e transformação da Área de Preservação Permanente para interesses meramente individuais, vai em sentido diametralmente oposto à destinação comum dada pelo legislador, devendo essa atitude ser coibida pelas vias competentes, impedindo que um bem dessa natureza seja modificado a bel prazer de alguns, que acreditam que possuem direito exclusivo sobre ele. Sob este prisma exsurge inarredável a necessária ingerência do Judiciário sobre o mundo fático. Ocorre que, num mundo como o atual, onde, cada vez mais, os problemas ambientais vem degradando a qualidade de vida, todos possuem responsabilidades a assumir e o Poder Judiciário, uma vez provocado, deve fazer prevalecer os postulados constitucionais e a lei, voltando-se para uma interpretação comprometida com essa realidade, para a melhoria do ecossistema. (TRF4, AC 5005418-96.2012.404.7004, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 29/05/2015). Grifei
AMBIENTAL. UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL (LEI 9.985/00). OCUPAÇÃO E CONSTRUÇÃO ILEGAL POR PARTICULAR NO PARQUE ESTADUAL DE JACUPIRANGA. TURBAÇÃO E ESBULHO DE BEM PÚBLICO. DEVER-PODER DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL DO ESTADO. OMISSÃO. ART. 70, § 1º, DA LEI 9.605/1998. DESFORÇO IMEDIATO. ART. 1.210, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL. ARTIGOS 2º, I E V, 3º, IV, 6º E 14, § 1º, DA LEI 6.938/1981 (LEI DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE). CONCEITO DE POLUIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO DE NATUREZA SOLIDÁRIA, OBJETIVA, ILIMITADA E DE EXECUÇÃO SUBSIDIÁRIA. LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO.[…] 3. A criação de Unidades de Conservação não é um fim em si mesmo, vinculada que se encontra a claros objetivos constitucionais e legais de proteção da Natureza. Por isso, em nada resolve, freia ou mitiga a crise da biodiversidade – diretamente associada à insustentável e veloz destruição de habitat natural -, se não vier acompanhada do compromisso estatal de, sincera e eficazmente, zelar pela sua integridade físico-ecológica e providenciar os meios para sua gestão técnica, transparente e democrática. A ser diferente, nada além de um “sistema de áreas protegidas de papel ou de fachada” existirá, espaços de ninguém, onde a omissão das autoridades é compreendida pelos degradadores de plantão como autorização implícita para o desmatamento, a exploração predatória e a ocupação ilícita. 4. Qualquer que seja a qualificação jurídica do degradador, público ou privado, no Direito brasileiro a responsabilidade civil pelo dano ambiental é de natureza objetiva, solidária e ilimitada, sendo regida pelos princípios do poluidor-pagador, da reparação in integrum, da prioridade da reparação in natura, e do favor debilis, este último a legitimar uma série de técnicas de facilitação do acesso à Justiça, entre as quais se inclui a inversão do ônus da prova em favor da vítima ambiental. Precedentes do STJ. […] 11. O conceito de poluidor, no Direito ambiental brasileiro, é amplíssimo, confundindo-se, por expressa disposição legal, com o de degradador da qualidade ambiental, isto é, toda e qualquer “pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (art. 3º, IV, da Lei 6.938/1981, grifo adicionado). 12. Para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano urbanístico-ambiental e de eventual solidariedade passiva, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem não se importa que façam, quem cala quando lhe cabe denunciar, quem financia para que façam e quem se beneficia quando outros fazem. […]18. Recurso Especial provido. REsp 1071741/SP, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, 2ª Turma, DJe 16/12/2010. Grifei
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÃO NO INTERIOR UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL – APA BALEIA FRANCA. PROVA DA OCORRÊNCIA DO DANO AMBIENTAL. EXISTÊNCIA. Constatada pelo ICMBIO a existência de construção em área de dunas, solo não edificável, no interior da Unidade de Conservação Federal – APA Baleia Franca, em área localizada entre a faixa de marinha e o mar, e não tendo o infrator se desincumbido do ônus de afastar a presunção de legitimidade da atuação do órgão ambiental, resta comprovado o dano ambiental e caracterizada a obrigação do infrator de desfazer a construção e de reparar o dano (art. 225 da CF). Ainda que se trate de reforma e ampliação de imóvel, isso não afasta a responsabilidade do infrator porque sua permanência e intervenções no local significaram perpetuação do dano e empecilho à regeneração daquele meio ambiente. O fato de existirem outras residências nas proximidades não autoriza a permanência desta construção primeiro porque não se sabe qual a situação de cada uma das outras construções, se são regulares ou irregulares, e, por isso, não servem de parâmetro para o presente julgamento; segundo porque não é razoável considerar consolidada uma construção irregular, em área de preservação permanente, somente com base na existência de outras construções, como se a pluralidade de infratores tornasse lícito aquilo que a lei prevê como ilícito. (TRF4, APELREEX 5002856-24.2011.404.7207, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo Silva Leal Junior, juntado aos autos em 05/06/2014). Grifei
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. PROCESSO CIVIL. EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – APP. DEMOLIÇÃO. INDENIZAÇÃO. 1. Apelação do MPF provida, para condenar o réu à demolição, de resíduo de edificação construída, visto que a área objeto da construção está enquadrada como área de preservação permanente – APP. 2. Em casos de degradação ambiental, o Superior Tribunal de Justiça, não descarta a possibilidade de cumulação de obrigação de fazer e eventual indenização por dano ainda remanescente. 3. A obrigação de não fazer, abstenção de construção de muro no local, vem como reforço às restrições ao uso e ocupação do solo da área de marinha, que foram previamente descumpridas. (TRF4, APELREEX 5008485-26.2013.404.7201, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto D’azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 21/10/2015). Grifei
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE. INTERESSE PROCESSUAL. AUTO DE INFRAÇÃO. CONDENAÇÃO. Surgem os réus como responsáveis solidários pela reparação do dano ambiental, porquanto, direta ou indiretamente, se aproveitam da atividade poluidora, auferindo lucros com a atividade pesqueira realizada. Há independência entre as instâncias penal, civil e administrativa, não existindo óbice ao ajuizamento de ações judiciais nas esferas penal e civil enquanto tramita o procedimento administrativo. O auto de infração não padece de nulidade, pois a conduta irregular está perfeitamente descrita, indicando-se as espécies capturadas e o dispositivo legal infringido. O valor da multa aplicada pelo IBAMA atende aos requisitos exigidos para embasar a condenação no presente feito. É desnecessária a condenação dos réus a se absterem de pescar espécimes proibidos porquanto a legislação ambiental já prevê penalidade para tal infração, que há de ser analisada no caso concreto, não se podendo impor sanções prévias sem oportunizar o contraditório e a ampla defesa ao interessado. (TRF4, AC 5002587-46.2010.404.7101, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Lúcia Luz Leiria, juntado aos autos em 04/08/2011). Grifei
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO INEXISTENTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. CONDENAÇÃO A DANO EXTRAPATRIMONIAL OU DANO MORAL COLETIVO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO NATURA. […] 2. A Segunda Turma recentemente pronunciou-se no sentido de que, ainda que de forma reflexa, a degradação ao meio ambiente dá ensejo ao dano moral coletivo. 3. Haveria contra sensu jurídico na admissão de ressarcimento por lesão a dano moral individual sem que se pudesse dar à coletividade o mesmo tratamento, afinal, se a honra de cada um dos indivíduos deste mesmo grupo é afetada, os danos são passíveis de indenização. 4. As normas ambientais devem atender aos fins sociais a que se destinam, ou seja, necessária a interpretação e a integração de acordo com o princípio hermenêutico in dubio pro natura. Recurso especial improvido. (REsp 1367923/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/08/2013, DJe 06/09/2013). Grifei
PROCESSO CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ORDEM URBANÍSTICA. LOTEAMENTO RURAL CLANDESTINO. ILEGALIDADES E IRREGULARIDADES DEMONSTRADAS. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO MUNICIPAL. DANO AO MEIO AMBIENTE CONFIGURADO. DANO MORAL COLETIVO. 1. Recurso especial em que se discute a ocorrência de dano moral coletivo em razão de dano ambiental decorrente de parcelamento irregular do solo urbanístico, que, além de invadir Área de Preservação Ambiental Permanente, submeteu os moradores da região a condições precárias de sobrevivência. 2. Hipótese em que o Tribunal de origem determinou as medidas específicas para reparar e prevenir os danos ambientais, mediante a regularização do loteamento, mas negou provimento ao pedido de ressarcimento de dano moral coletivo. 3. A reparação ambiental deve ser plena. A condenação a recuperar a área danificada não afasta o dever de indenizar, alcançando o dano moral coletivo e o dano residual. Nesse sentido: REsp 1.180.078/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 28/02/2012. 4. “O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base. (…) O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos” (REsp 1.057.274/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe 26/02/2010.). 5. No caso, o dano moral coletivo surge diretamente da ofensa ao direito ao meio ambiente equilibrado. Em determinadas hipóteses, reconhece-se que o dano moral decorre da simples violação do bem jurídico tutelado, sendo configurado pela ofensa aos valores da pessoa humana. Prescinde-se, no caso, da dor ou padecimento (que são consequência ou resultado da violação). Nesse sentido: REsp 1.245.550/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 16/04/2015. Recurso especial provido. (REsp 1410698/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/06/2015, DJe 30/06/2015). Grifei