Gestante de 32 semanas impedida de embarcar deve ser indenizada

A 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do DF manteve a sentença que condenou a Gol Linhas Aéreas a indenizar uma gestante de embarcar, mesmo tendo apresentado declaração de responsabilidade preenchida no check in. O colegiado concluiu que, ao impedir o embarque, a empresa agiu de forma irregular e ilegítima.

Consta nos autos que a passageira e o marido compraram passagem de Brasília para João Pessoa (PB) para realizar ensaio fotográfico de gestação. Relatam que, mesmo apresentando o atestado médico nos termos da companhia aérea, a passageira gestante, que à época estava com 32 semanas, foi impedida de embarcar.  Afirmam que, por conta disso, não puderam realizar o ensaio programado. Defendem que a ré deve ser condenada a indenizá-los pelos danos materiais e morais.

Decisão do 3º Juizado Especial Cível de Ceilândia condenou a ré a indenizar os autores. A empresa recorreu, alegando que os autores estavam sem os documentos necessários para o embarque. Explica que a passageira estava gestante em período que se exige a liberação médica. Defende que houve culpa dos passageiros e que não há dano a ser indenizado.

Ao analisar o recurso, a Turma destacou que a autora apresentou, além da declaração de responsabilidade, autorização médica para viagem. A companhia, por sua vez, não demonstrou justificativa para impedir o embarque, o que, de acordo com o colegiado, configura falha na prestação do serviço.

“Portanto, conclui-se que a ré não agiu em exercício regular do direito e agiu de forma irregular e ilegítima ao impedir a viagem dos autores, devendo responder pelos danos causados aos consumidores”, destacou o relator, explicando que, além de ressarcir os autores com os gastos em razão da falha na prestação do serviço, ré deve também indenizar os autores pelos danos morais sofridos.

A conduta da ré de impedir, injustificadamente, o embarque dos autores à viagem previamente programada com finalidade específica – realizar o ensaio fotográfico de gestante – é situação que extrapola o mero dissabor e tem o potencial de causar danos à esfera personalíssima dos indivíduos, configurando danos morais. Cabe ressaltar que os autores ainda suportaram dissabores no embarque ao ter que aguardar por mais de 40 minutos pela confirmação do pagamento e estavam munidos da documentação necessária à viagem”, registrou o magistrado.

Dessa forma, a Turma manteve a sentença que condenou a Gol a pagar R$ 2 mil para cada autor a título de indenização por danos morais. A ré terá ainda que ressarcir o valor de R$ 1.046,04, equivalente às passagens compradas e não usufruídas pela passageira gestante, ao balão adquirido para a realização do ensaio fotográfico planejado e não realizado e ao veículo alugado e não utilizado.

O recurso ficou assim ementado:

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS.  RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO NACIONAL. PASSAGEIRA GESTANTE. 32 SEMANAS DE GESTAÇÃO. DECLARAÇÃO DE RESPONSABILIDADE PREENCHIDA. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM ARBITRADO COM RAZOABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

  1. Ação de Indenização cuja sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para condenar a requerida a pagar aos autores a quantia de R$ 1.046,04 (mil e quarenta e seis reais e quatro centavos), a título de danos materiais; bem como ao pagamento do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais)para cada requerente, por danos morais.

  2. A parte ré interpôs recurso inominado no qual alega, em síntese, que os recorridos não tomaram a devida cautela quanto à documentação exigida para o embarque no voo contratado. Argumenta que a parte recorrida estava sem o documento necessário, qual seja: o laudo médico, impresso, com todas as informações e a devida autorização para realização de viagem aérea, visto que estava gestante em período em que se exige liberação do médico e que não embarcou por sua própria culpa. Impugna as condenações e os valores das mesmas. Contrarrazões apresentadas.

  3. A relação jurídica travada entre as partes é de natureza consumerista, uma vez que as partes se enquadram nos conceitos de fornecedor e de consumidor previstos no Código de Defesa do Consumidor. Aplicam-se, assim, ao caso em comento as regras de proteção do consumidor, inclusive as pertinentes à responsabilidade objetiva na prestação dos serviços.

  4. No presente caso, os autores comprovaram que adquiriram passagens aéreas de ida e volta para o trecho Brasília-João Pessoa em viagem que seria realizada entre os dias 18 e 21 de dezembro de 2020 (ID 31252620). É incontroverso nos autos que os recorridos não puderam embarcar por, supostamente, não estarem com a documentação necessária uma vez que a 1ª autora se encontrava grávida no dia da viagem. Ademais, é igualmente incontroverso que no momento do check-in os autores tiveram que aguardar por cerca de 40 minutos até que se confirmasse que o pagamento das passagens fora realizado.

  5. A controvérsia em questão consiste em aferir se a parte ré agiu em exercício regular do direito ao exigir a documentação específica da autora para que a mesma pudesse embarcar.

  6. Conforme a documentação apresentada pela ré em contestação (ID 31252635, página 5), da 28ª até a 35ª semana de gestação, a gestante, para embarcar, deverá preencher a Declaração de Responsabilidade fornecida pela companhia aérea. Na presente situação, os autores comprovaram que a referida declaração foi devidamente preenchida, contando, inclusive, com assinatura de médico (ID 31252628). Ademais, cumpre destacar que os autores ainda apresentaram autorização médica específica para o embarque (ID 31252627), de modo que não havia qualquer restrição ou impedimento aos autores para a realização da viagem. Portanto, conclui-se que a ré não agiu em exercício regular do direito e agiu de forma irregular e ilegítima ao impedir a viagem dos autores, devendo responder pelos danos causados aos consumidores.

  7. Conforme dispõe o art. 737 do Código Civil: “o transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena de responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior”. Na hipótese, a requerida/recorrente não trouxe aos autos qualquer justificativa ou razão para o impedimento de embarque dos autores, o que caracteriza, evidentemente, falha na prestação dos serviços e impõe à ré a obrigação de reparar os danos suportados pelos consumidores.

  8. Os autores comprovaram que, além dos gastos com as passagens aéreas (R$ 956,08) – ID 31252620, tiveram gastos com aluguel de carro (R$ 498,00) – ID 31252621, e com balões para o ensaio fotográfico (R$ 70,00) – ID 31252623, serviços estes que não foram usufruídos em razão da falha na prestação dos serviços da companhia aérea, totalizando um dano material no valor de R$ 1.524,08. Contudo, em razão da impossibilidade de reforma em prejuízo do recorrente, a sentença deve ser mantida quanto ao dano material.

  9. A conduta da ré de impedir, injustificadamente, o embarque dos autores a viagem previamente programada com finalidade específica – realizar o ensaio fotográfico de gestante – é situação que extrapola o mero dissabor e tem o potencial de causar danos à esfera personalíssima dos indivíduos, configurando danos morais. Cabe ressaltar que os autores ainda suportaram dissabores no embarque ao ter que aguardar por mais de 40 minutos pela confirmação do pagamento e estavam munidos da documentação necessária à viagem.

  10. Quanto ao valor da condenação, é certo que a conduta da ré, negligente em relação às suas obrigações básicas e por todo o desgaste pelo qual os autores passaram, tendo que aguardar a confirmação do pagamento e, embora tivessem providenciado toda documentação médica respectiva, impedidos embarcar, conduz à conclusão de que a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais) para cada autor, atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e observa as peculiaridades do caso concreto.

  11. Recurso da parte ré conhecido e não provido. Sentença mantida por seus próprios fundamentos.

  12. Custas recolhidas. Condenada a parte recorrente ao pagamento dos honorários advocatícios em favor do patrono da parte recorrida, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (art. 55 da Lei n.º 9.099/95).

  13. Acórdão elaborado de conformidade com o disposto nos artigos 46 da Lei 9.099/1995.

A decisão foi unânime.

Acesse o PJe2 e saiba mais sobre o processo: 0718805-47.2021.8.07.0003

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