A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou nesta quarta-feira (19) o entendimento de que é preciso comprovar a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso, nos termos do parágrafo 6º do artigo 1.003 do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015).
O colegiado rejeitou, por maioria, o pedido feito por uma técnica de enfermagem para que fosse reconhecida a tempestividade do seu agravo em recurso especial, interposto após o prazo legal de 15 dias úteis a partir da intimação, por conta da suspensão dos prazos processuais no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) provocada pelo feriado de aniversário da capital paulista, celebrado em 25 de janeiro.
A profissional de saúde buscava a condenação por danos morais de um hospital que teria se equivocado no preenchimento de atestado médico apresentado à sua ex-empregadora, o que levou à demissão por justa causa. A ação indenizatória foi julgada improcedente nas instâncias ordinárias. O TJSP também inadmitiu o recurso especial interposto pela técnica de enfermagem.
No STJ, em decisão monocrática da presidência, o pedido da recorrente para a admissão do recurso especial não foi conhecido, sob o fundamento de que o agravo era manifestamente intempestivo por não conter a comprovação de feriado local no momento de sua interposição.
Segunda de Carnaval
O relator do recurso especial, ministro Luis Felipe Salomão, votou para prover o agravo interno e afastar a declaração de intempestividade, mas sem conhecer do agravo em recurso especial. Em nome da segurança jurídica, o relator propôs a aplicação a todos os feriados locais da tese fixada na apreciação do REsp 1.813.684. Ao modular os efeitos dessa decisão, a Corte Especial admitiu que a parte demonstre a existência do feriado de segunda-feira de Carnaval depois de interpor o recurso, nos casos anteriores à publicação do acórdão.
Por sua vez, a ministra Nancy Andrighi, no voto que prevaleceu no julgamento, lembrou que, ao analisar questão de ordem, a Corte Especial decidiu, por maioria, que a modulação dos efeitos do REsp 1.813.684 é restrita ao feriado de segunda de Carnaval, não valendo para os demais feriados.
De acordo com a magistrada, uma modulação “ampla, geral e irrestrita” somente poderia ter ocorrido por ocasião do julgamento do AREsp 957.821, no qual se firmou o entendimento de que a falta de comprovação de feriado local no ato de interposição do recurso resulta na configuração de sua intempestividade, como previsto no CPC/2015.
“Estima-se que, desde a entrada em vigor da nova legislação processual, esta corte tenha proferido mais de 105 mil decisões unipessoais e acórdãos aplicando a tese segundo a qual é o ato de interposição o único momento processual adequado para a comprovação da tempestividade”, destacou Nancy Andrighi ao alertar sobre o risco à segurança jurídica diante de eventual mudança jurisprudencial nessa matéria.
Na mesma sessão de julgamento, a Corte Especial iniciou a análise de outros processos nos quais se discute o reconhecimento da tempestividade na hipótese em que a prova do feriado de Corpus Christi é feita posteriormente ao protocolo da petição do recurso.
O recurso ficou assim ementado:
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE FERIADO LOCAL. APLICABILIDADE DO PRECEDENTE VINCULANTE DA CORTE ESPECIAL QUE, À LUZ DO ART. 1.003, §6º, DO CPC/15, ENTENDEU SER NECESSÁRIA A COMPROVAÇÃO NO ATO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO DIRIGIDO AO STJ. JULGADO COM AMPLA PUBLICIDADE E QUE PACIFICOU A OSCILAÇÃO JURISPRUDENCIAL EXISTENTE NESTA CORTE (AG. INT NO ARESP 957.821/MS). SOLIDEZ JURISPRUDENCIAL. SEGURANÇA JURÍDICA. COERÊNCIA. SEGUNDA-FEIRA DE CARNAVAL. CIRCUNSTÂNCIA EXCEPCIONAL QUE LEVOU À CORTE ESPECIAL A FLEXIBILIZAR A ORIENTAÇÃO DO PRECEDENTE, ADMITINDO A COMPROVAÇÃO POSTERIOR APENAS POR DETERMINADO LAPSO TEMPORAL (RESP 1.813.684/SP E RESPECTIVA QO). GENERALIZAÇÃO DO ENTENDIMENTO EXCEPCIONAL PARA TODOS OS FERIADOS LOCAIS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE SUPERAÇÃO DO PRECEDENTE VINCULANTE, MAS SOMENTE DE SUPERAÇÃO DA REGRA CRIADA PELO PRECEDENTE. MODULAÇÃO AMPLA, GERAL E IRRESTRITA, QUE DEVERIA TER SIDO REALIZADA NO JULGAMENTO DO AG. INT NO ARESP 957.821/MS. IMPOSSIBILIDADE DE MODULAÇÃO APÓS LONGO PERÍODO. RISCO DE INSEGURANÇA JURÍDICA. VIOLAÇÃO À ISONOMIA.
1- O propósito recursal é definir se, a despeito do precedente vinculante da Corte Especial no sentido de ser necessária a comprovação da existência de feriado local no ato de interposição de recursos endereçados ao STJ (AgInt no AREsp 957.821/MS), é admissível estender a modulação de efeitos realizada na QO no REsp 1.813.684/SP também a todos os demais feriados locais.
2- Com a entrada em vigor do CPC/15, a Corte Especial formou precedente vinculante, em 2017, no sentido de que, à luz do art. 1.003, §6º, é indispensável a comprovação da existência de todos os feriados locais no ato de interposição de recursos dirigidos ao STJ, ocasião em que se pacificou a divergência jurisprudencial que havia se instalado desde a edição da nova legislação processual (AgInt no AREsp 957.821/MS).
3- Desde a fixação da referida tese, todos os órgãos fracionários da Corte passaram a aplicar o precedente vinculante, gerando situação de solidez jurisprudencial apta a propiciar segurança jurídica, integridade, previsibilidade, estabilidade e coerência da jurisprudência.
4- Em virtude de uma circunstância especificamente relacionada à segunda-feira de carnaval, a Corte Especial deliberou pela possibilidade de excepcional flexibilização dessa orientação, de modo a permitir, por meio da técnica de modulação de efeitos restrita a um determinado lapso temporal (até 19/11/2019), a comprovação posterior da existência do feriado local de segunda-feira de carnaval (QO no REsp 1.813.684/SP).
5- Conjugados a cronologia dos fatos e os objetos das deliberações da Corte Especial, conclui-se que a tese jurídica fixada no julgamento do AgInt no AREsp 957.821/MS não foi, em nenhum momento, implícita ou expressamente, superada pela Corte Especial, o que veda a generalização da regra excepcionalmente criada por ocasião do julgamento do REsp 1.813.684/SP para todos os demais feriados locais.
6- A modulação de efeitos, que é excepcional, deve ocorrer no próprio julgamento em que se formou o precedente vinculante e deve constar do respectivo acórdão, de modo que, pacificada a divergência jurisprudencial existente no âmbito do STJ, não se admite modulação mais de 03 anos após a conclusão do julgamento que fixou a tese, sob pena de grave insegurança jurídica e violação à isonomia.
7- Agravo interno desprovido.
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