Ao fundamento de que a acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11 de setembro de 1997 e de que o impetrante (mandado de segurança) somente adquiriu o direito à aposentadoria por tempo de contribuição em 1998, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) deu provimento à remessa oficial da sentença que havia determinado o restabelecimento do pagamento do benefício de auxílio-acidente ao requerente, sem prejuízo do direito de ele continuar recebendo o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
O processo chegou ao Tribunal por meio de remessa oficial, instituto do Código de Processo Civil (artigo 496), também conhecido como reexame necessário ou duplo grau obrigatório, que exige que o juiz encaminhe o processo ao tribunal de segunda instância, havendo ou não apelação das partes, sempre que a sentença for contrária a algum ente público.
Sob a relatoria do juiz federal convocado Rodrigo de Godoy Mendes, o magistrado observou que no caso concreto o benefício de auxílio-acidente foi concedido em 18/10/1974, mas o impetrante somente adquiriu o direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em 28/04/1998.
Incide na hipótese, prosseguiu o relator, a Súmula 507 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Tema 555 do mesmo Tribunal, que determinam que a acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social), promovida em 11/11/1997.
Verificou ainda o juiz convocado que não é devida a devolução dos valores excedentes recebidos indevidamente pelo segurado, que os recebeu de boa-fé, pagos em função da interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração.
O recurso ficou assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA EM MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE RECURSO VOLUNTÁRIO. ACUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE COM APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO CONCEDIDA APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 9.528/97. IMPOSSIBILIDADE. RESP REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA Nº 1.296.673, TEMAS 555 E 556 STJ. INEXISTÊNCIA DE DISCUSSÃO RELATIVA À CONCESSÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. MATÉRIA CONTROVERSA LIMITADA À ACUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA 154.240/STJ. REMESSA NECESSÁRIA PROVIDA PARA REFORMAR A SENTENÇA.
1. Trata-se de remessa necessária da sentença id 158567204 págs. 1/4, proferida na vigência do CPC/73 (18/08/2009) que, em mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por Moacir Marcelino de Abreu, contra ato do Gerente Executivo do INSS em Contagem/MG, concedeu a segurança “para determinar à Autoridade impetrada que restabeleça o pagamento do benefício de auxílio-acidente ao Impetrante, sem prejuízo do direito de continuar recebendo o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. As parcelas vencidas após o ajuizamento da ação deverão ser pagas pelo INSS com correção monetária e juros de mora de 1% ao mês, contados da citação, até o efetivo pagamento”.
2. A competência para o julgamento das ações em que se discute a possibilidade de acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria previdenciária, ainda que o primeiro decorra de acidente de trabalho, é da Justiça Federal, conforme precedente da 1ª Seção do STJ (CC 154.240/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2019, DJe 28/05/2019): “… 2. A causa de pedir é a cessação do benefício acidentário em razão da proibição de sua cumulação com aposentadoria, conforme prescrito no art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei n. 8.213/1991. 3. Pedido e causa de pedir não derivados de acidente de trabalho. …”.
3. No que se refere à acumulação de benefícios, em precedente julgado sob o procedimento repetitivo, decidiu o Superior Tribunal de Justiça, proferindo a seguinte tese no Tema 555 (REsp 1.296.673, Min. Herman Benjamin) de sua jurisprudência de repercussão geral: “A acumulação do auxílio-acidente com proventos de aposentadoria pressupõe que a eclosão da lesão incapacitante, apta a gerar o direito ao auxílio-acidente, e a concessão da aposentadoria sejam anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, promovida em 11/11/1997 pela Medida Provisória 1.596-14/1997, posteriormente convertida na Lei 9.528/1997“. No caso concreto em exame, o benefício de auxílio-acidente (NB 030.381.515-9) foi concedido em 18/10/1974, mas o impetrante somente adquiriu o direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em 28/04/1998, ou seja, em data posterior à referida alteração legislativa.
4. Também nesse sentido a Súmula 507/STJ: “A acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho. (SÚMULA 507, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/03/2014, DJe 31/03/2014) (DIREITO PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-ACIDENTE)”.
5. No caso dos autos, não há obrigação de a parte impetrante devolver os valores que recebeu de forma indevida, porquanto, em princípio, tem-se presente a sua boa-fé quanto ao recebimento do auxílio-acidente, consoante decidiu o Superior Tribunal de Justiça: “Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.” (Tema 979, REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021).
6. Precedentes deste Tribunal declinados no voto: EDAC 1001502-98.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 – PRIMEIRA TURMA, PJe 02/03/2021 PAG.; AC 1022154-05.2020.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL GILDA SIGMARINGA SEIXAS, TRF1 – PRIMEIRA TURMA, PJe 17/11/2020 PAG.
7. Remessa necessária provida para reformar a sentença no que se refere ao restabelecimento do pagamento do benefício de auxílio-acidente, denegando a segurança quanto ao ponto, afastando-se, todavia, a obrigação de devolução (ressarcimento) dos valores indevidamente recebidos em razão desse benefício.
Com essas considerações, o Colegiado dou provimento à remessa oficial, reformando a sentença, nos termos do voto do relator.
Processo: 0008534-96.2009.4.01.3800