Na Bahia, uma mulher procurou a Justiça após seu marido ter sofrido grave acidente em uma rodovia federal que resultou na morte do esposo. Conforme consta nos autos, a motocicleta do homem se chocou com um equino que estava solto na pista. A autora pediu indenização por danos materiais e morais, responsabilizando o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) pelo ocorrido.
O DNIT, por sua vez, apelou requerendo diminuição do montante a título de indenização por danos morais que foi fixado em 1ª instância no valor de R$200.000,00. Segundo a autarquia, quem deveria arcar com os danos sofridos seria o proprietário do animal. Além disso, o apelante defendeu que a responsabilidade pelo tráfego das rodovias federais é da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e ainda culpou a vítima pelo acidente, argumentando que é dever do condutor reduzir a velocidade do veículo quando há aproximação de animais na pista.
No entendimento do relator, desembargador federal Souza Prudente, é atribuição do órgão providenciar sinalização com a finalidade de alertar sobre a existência de animais nos arredores assim como disponibilizar barreira protetiva para impedir que os animais invadam a pista de rodagem e, de fato, cabe ao DNIT zelar pela segurança e integridade física dos que trafegam nas rodovias federais. Caso contrário, pode-se configurar negligência na prestação de serviço.
Sendo assim, a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região negou o pedido de diminuição do valor da indenização requerido pelo DNIT e a título de danos materiais determinou que o órgão pagasse pensão civil à viúva e às suas duas filhas na proporção de 1/3 (um terço) para cada uma.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. ACIDENTE RODOVIÁRIO. ÓBITO DO MARIDO DA AUTORA. ANIMAL SOLTO NA PISTA DE ROLAMENTO. DEVER DE FISCALIZAÇÃO E MANUTENÇÃO. OMISSÃO DO DNIT. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS. VALOR RAZOÁVEL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. PRELIMINAR REJEITADA.
I- O DNIT tem legitimidade para figurar no polo passivo da demanda, porquanto é atribuição do referido órgão providenciar sinalização, com a finalidade de alertar aqueles que trafegam por rodovia federal acerca da existência de animais nos arredores, assim como barreira protetiva, para impedir que tais semoventes invadam a pista de rodagem (AC n. 000261-81.2013.4.01.3302, Relator Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, Relator Convocado Juiz Federal Roberto Carlos de Oliveira, e-DJF1 de 08.03.2019). Preliminar rejeitada.
II – Nos termos do art. 1º, § 2º, da Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), “o trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito” e, por isso, “os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro” (§ 3º).
III – Nesse contexto, demonstrada a ocorrência do fato danoso e caracterizada a omissão do órgão responsável pela adequada manutenção da rodovia federal, de forma a evitar os riscos de acidentes, como no caso, resta configurada a responsabilidade civil do Estado, não havendo que se falar em culpa exclusiva ou concorrente da vítima, competindo aos promovidos a reparação pelos prejuízos de ordem moral e material sofridos pelas autoras em função do sinistro descrito nos autos, que vitimou fatalmente o genitor/ companheiro delas.
IV- Segundo entendimento firmado pelo Superior Tribunal de justiça, “o benefício previdenciário é diverso e independente da indenização por danos materiais ou morais, porquanto, ambos têm origens distintas. Este, pelo direito comum; aquele, assegurado pela Previdência. A indenização por ato ilícito é autônoma em relação a qualquer benefício previdenciário que a vítima receba” (AgRg no AgRg no REsp 1.292.983/AL, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe de 7.3.2012).
V- Na espécie, as autoras possuem direito ao recebimento de pensão civil em virtude do falecimento do seu genitor/ companheiro, uma vez que na inteligência jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, a dependência econômica da esposa/companheira e dos filhos menores é presumida, dispensando a demonstração por qualquer outro meio de prova (STJ – AgRg no REsp: 1401717 RS 2011/0085510-8, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 21/06/2016, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/06/2016). Referida pensão deverá ser partilhada entre a companheira e as duas filhas do falecido, na proporção de 1/3 (um terço) para cada uma, de modo que a primeira receberá sua fração até a data em que o falecido completaria 65 (sessenta e cinco) anos de idade, e as filhas até completarem 25 (vinte e cinco) anos de idade. O valor da pensão mensal deve corresponder a dois terços dos proventos do falecido, uma vez que, desse montante, deve ser descontado o que era necessário para o sustento da própria vítima. Inexistindo comprovação dos rendimentos, como na hipótese dos autos, a base de cálculo da pensão mensal a ser recebida por seus dependentes deve corresponder a um salário-mínimo.
VI – A jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça considera presumidos os danos morais em casos de falecimento de parentes, tendo em vista que o trauma e o sentimento causado pela perda da pessoa amada são inerentes aos familiares próximos à vítima.
VII – No que tange ao valor da indenização por dano moral, impende verificar que inexiste parâmetro legal definido para a sua fixação, devendo este ser quantificado segundo os critérios de proporcionalidade, moderação e razoabilidade, submetidos ao prudente arbítrio judicial, com observância das peculiaridades inerentes aos fatos e circunstâncias que envolvem o caso em exame. O quantum da reparação, portanto, não pode ser ínfimo, para não representar uma ausência de sanção efetiva ao ofensor, nem excessivo, para não constituir um enriquecimento sem causa em favor do ofendido, afigurando-se razoável, na espécie, o valor fixado na instância de origem, correspondente a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).
VIII- No tocante aos juros e à correção monetária, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Tema 905, realizado pelo rito dos recursos repetitivos, confirmado no julgamento do RE 870.947/SE pelo Supremo Tribunal Federal, decidiu que as condenações da Fazenda Pública de natureza administrativa sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondente à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E.
IX– Apelação do DNIT desprovida. Apelação das autoras parcialmente provida. Sentença reformada em parte. Honorários advocatícios majorados para acrescer ao percentual fixado na origem, 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, a importância de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, § 11, do CPC, observados os limites estabelecidos no §3º do mesmo artigo.
Processo: 0002423-45.2017.4.01.3306