A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que as distribuidoras de energia elétrica não podem ser responsabilizadas pela interrupção momentânea da prestação desses serviços em decorrência de falha técnica no Sistema Interligado Nacional (SIN).
No caso, a Companhia Energética do Ceará (Coelce) ajuizou ação contra a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) requerendo a suspensão de atos da autarquia que resultou no pagamento da compensação financeira de R$ 1,2 milhão e o rebaixamento dos índices de qualidade dos serviços prestados pela empresa.
A sentença julgou procedente o pedido ao fundamento de que a interrupção de serviço segue a hipótese de que interrupções não caracterizam descontinuidade do serviço e anulou os atos administrativos impostos pela Aneel.
O mesmo procedimento ocorreu ao julgar o recurso da Aneel no TRF1. O relator, desembargador federal Jamil de Jesus Oliveira, informou que a Lei 8.987/1995, que dispõe sobre o regime de concessão e de permissão da prestação de serviços públicos, estabelece que não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando motivada pelas razões de ordem técnica ou de segurança das instalações.
Falha técnica – Segundo o magistrado, a própria Aneel reconheceu que a causadora da falha objeto dos autos foi a Belo Monte Transmissora de Energia (BMTE), uma transmissora de energia localizada no Xingu, estado do Pará.
“Mesmo com a existência de limite (franquia) para interrupções do fornecimento de energia elétrica por parte das distribuidoras, não se afigura razoável punir o agente distribuidor de energia em razão de falha do agente transmissor. Patente, no caso, que a interrupção decorreu de falha técnica, cuja culpa é imputável a terceiro”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. INTERRUPÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. FALHA NO SISTEMA INTERLIGADO NACIONAL SIN. DEFEITO IMPUTÁVEL A AGENTE TRANSMISSOR E NÃO À DISTRIBUIDORA DE ENERGIA. INCIDÊNCIA DA LEI N. 8.987/95, ART. 6º, § 3, INCISO I. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. CPC, ART. 85, § 3º, INCISOS I E II E § 5º. TEMA N. 1.076 STJ. SENTENÇA MANTIDA NO MÉRITO E REFORMADA QUANTO À FIXAÇAO DE HONORÁRIOS.
1. Trata-se de apelações interpostas pela Agência Nacional de Energia Elétrica ANEEL e pela Companhia Energética do Ceará – COELCE em face de sentença que julgou procedente o pedido da parte autora e anulou os atos administrativos impugnados.
2. Na origem, a COELCE ajuizou ação em face da ANEEL requerendo a suspensão dos aludidos atos administrativos que resultaram em obrigação de pagamento de compensação financeira no montante de R$ 1.221.347,14 (um milhão duzentos e vinte e um mil trezentos e quarenta e sete reais e catorze centavos) e rebaixamento dos índices de qualidade do serviço prestado pela autora, em razão de interrupção na distribuição de energia elétrica, em 21/03/2018, causada por falha no Sistema Interligado Nacional SIN.
3. A Lei n. 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, estabelece que não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando: I – motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; (art. 6º, § 3º, inciso I).
4. No caso dos autos, a própria agência reguladora reconheceu que a causadora da falha não foi a parte autora e sim uma transmissora de energia localizada no Xingu, no Estado do Pará, a Belo Monte Transmissora de Energia BMTE.
5. Mesmo com a existência de limite (franquia) para interrupções do fornecimento de energia elétrica por parte das distribuidoras, não se afigura razoável punir o agente distribuidor de energia em razão de falha do agente transmissor. Patente, no caso, que a interrupção decorreu de falha técnica, cuja culpa é imputável a terceiro.
6. Nesse sentido, a jurisprudência da Sexta Turma: A exceção do § 3º, I, do art. 6º da Lei 8.987/1995 se amolda ao caso das autoras/apeladas, pois conforme reconhecido pela ANEEL o desligamento decorreu da atuação indevida do disjuntor na subestação Xingu, no Pará, farto que repercutiu também em outras distribuidoras das regiões Norte e Nordeste, que deixaram de receber a energia elétrica das distribuidoras e por consequência de fornecer aos seus mercados. (AC 1005463-56.2019.4.01.3400, Desembargador Federal JIRAIR ARAM MEGUERIAN, TRF1 – Sexta Turma, PJe 22/10/2020). Outro precedente declinado no voto.
7. Sentença reformada no ponto em que arbitrou honorários no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) em causa com proveito econômico fixado pela parte autora em R$ 1.221.347,14 (um milhão duzentos e vinte e um mil trezentos e quarenta e sete reais e catorze centavos).
8. Incidência da tese fixada no Tema 1.076 do STJ: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC – a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo.
9. Honorários advocatícios devidos à parte autora arbitrados em 10% (dez por cento) sobre os primeiros 200 (duzentos) salários mínimos e em 8% (oito por cento) sobre o valor do proveito econômico que excede 200 (duzentos) salários mínimos, mas é inferior a 2.000 (dois mil) salários mínimos, nos termos dos incisos I e II do § 3º c/c o § 5º do art. 85 do CPC.
10. Honorários advocatícios recursais fixados nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
11. Apelação da ANEEL e remessa oficial, tida por interposta, desprovidas; apelação da COELCE provida.
A 6ª Turma do TRF1, por unanimidade, negou provimento à apelação da Aneel e deu provimento ao recurso da Coelce.
Processo: 1006364-24.2019.4.01.3400