Candidato com surdez unilateral nomeado e empossado em vaga para pessoa com deficiência (PCD) por força de sentença judicial deve permanecer no cargo em atenção aos princípios da segurança jurídica, boa-fé e dignidade humana, assim decidiu a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) mesmo que o entendimento jurisprudencial tenha se alterado após nomeação e posse.
Apelações foram interpostas pela Fundação Universidade de Brasília (FUB) e pela União contra a sentença que, ao deferir a segurança, determinou à autoridade a nomeação e posse da impetrante, em concurso público para cargos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em vaga reservada para deficiente por ter ela sido diagnosticada com surdez unilateral ao argumento de que a deficiência da candidata não se enquadrava no rol do art. 4º do Decreto 3.298/99, alterado pelo Decreto 5.296/2004.
Sustentaram as apelantes que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) mudou o entendimento no sentido de que o portador de perda auditiva unilateral não tem direito a concorrer às vagas destinadas aos deficientes em concurso público.
Relator, o desembargador federal João Batista Moreira explicou que o TRF1 e STJ, em orientação mais recente, manifestaram entendimento de que “o portador de surdez unilateral não se qualifica como pessoa com deficiência para o fim de disputar as vagas reservadas em concursos públicos” (Súmula 552/STJ).
Todavia, destacou o magistrado que a impetrante tomou posse e entrou em exercício por força de sentença judicial que confirmou a liminar antes do primeiro julgado que firmou entendimento contrário ao que já estava consolidado no STJ.
Com essas considerações, o desembargador concluiu que “embora o pedido da parte impetrante não encontre acolhimento na jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, a proteção da confiança legítima no entendimento à época vigente recomenda a manutenção da situação alicerçada em decisão judicial”.
O recurso ficou assim ementado:
CONCURSO PÚBLICO. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). EDITAL N. 1/2012. RESERVA DE VAGAS PARA DEFICIENTES. SURDEZ UNILATERAL. DIREITO DE CONCORRER ÀS VAGAS RESERVADAS. AUSÊNCIA. SÚMULA N. 552/STJ. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. CANDIDATO EMPOSSADO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL ANTERIOR À REFERIDA SÚMULA. DESCONSTITUIÇÃO NÃO RECOMENDÁVEL DO ATO. 1. Apelações interpostas pela Fundação Universidade de Brasília (FUB) e pela União contra sentença proferida em mandado de segurança versando sobre reserva de vagas em concurso público para pessoas com deficiência, na qual a segurança foi deferida, determinando às autoridades coatoras que tornem definitiva a classificação final da impetrante no concurso, conforme decisão liminar, permitindo a nomeação e posse dela, caso logre êxito total na disputa e em condições de ser chamada para o ingresso no serviço público. 2. Em laudo médico juntado aos autos, indica-se que a parte impetrante apresenta perda auditiva neurossensorial unilateral total (anacusia à direita) no ouvido direito, de causa provável de surdez congênita, e limiares auditivos dentro dos padrões de normalidade no ouvido esquerdo. 3. O Superior Tribunal Justiça consolidou entendimento de que o portador de surdez unilateral não se qualifica como pessoa com deficiência para o fim de disputar as vagas reservadas em concursos públicos (Súmula n. 552/STJ). 4. Entretanto, foi deferida liminar em 26/09/2013, confirmada pela sentença. A parte impetrante alega que já tomou posse e entrou em exercício e que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, desde a década de 1990, sempre reconheceu a deficiência auditiva unilateral como deficiência para fins de concurso público. Prestou o concurso em 2012, quando a jurisprudência ainda era favorável. Somente em 2013 houve o primeiro julgado que firmou entendimento contrário ao que já estava consolidado na Corte Superior de Justiça. 5. Em que pese a recente alteração de entendimento do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no sentido de não ser possível assegurar às pessoas portadoras de deficiência auditiva unilateral o direito de concorrer como candidatos portadores de deficiência em concursos públicos, na presente hipótese, considerando que, por força da sentença os impetrantes foram nomeados e empossados, e em se tratando de situação envolvendo pessoas integrantes de grupo vulnerável, vez que comprovadamente portadoras de deficiência, nos termos dos arts. 3º, I, e 4º do Decreto n. 3.298/99, tal situação deve ser mantida em atenção aos princípios da dignidade humana, da boa-fé e da segurança jurídica (TRF1, AMS 0051848-26.2012.4.01.3400, relator Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, 6T, e-DJF1 29/04/2015, p. 652.) 6. Negado provimento às apelações. Sentença mantida por outro fundamento.
A decisão do Colegiado acompanhando o voto do relator foi unânime.
Processo: 0051420-10.2013.4.01.3400