Embora a competência para rejulgar a causa, em razão da procedência de ação rescisória, seja do mesmo órgão julgador que proferiu o juízo rescindente, os autos devem retornar para correção do vício quando houver o reconhecimento de nulidade de algum ato processual gerador de cerceamento de defesa.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou o retorno de um processo à origem para que proceda a novo julgamento da apelação, após o reconhecimento de nulidade na intimação do advogado de uma das partes.
A ação rescisória apontou nulidade porque a intimação para o julgamento da apelação foi feita em nome de advogado que havia falecido, o que impediu a apresentação de memoriais e a realização de sustentação oral na sessão.
O Primeiro Grupo de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo julgou a ação rescisória procedente e, na sequência, proferiu novo julgamento do recurso de apelação, negando-lhe provimento. No recurso especial ao STJ, a parte autora da rescisória sustentou que a corte estadual deveria ter devolvido o processo à câmara julgadora para nova análise da apelação, após a devida intimação.
Rejulgamento incompatível com a solução do caso
O relator, ministro Villas Bôas Cueva, lembrou que, conforme o artigo 974, caput, do Código de Processo Civil (CPC), sendo procedente o pedido da ação rescisória, “o tribunal rescindirá a decisão, proferirá, se for o caso, novo julgamento e determinará a restituição do depósito a que se refere o inciso II do artigo 968“.
Segundo o ministro, a doutrina ensina que o julgamento de mérito da ação rescisória pelo órgão colegiado do tribunal normalmente compreende duas etapas: o juízo rescindente, que corresponde à desconstituição do julgado; e o juízo rescisório, que diz respeito ao novo julgamento da demanda.
Em nome do princípio da economia processual, explicou, a competência para o rejulgamento da causa, em regra, é do mesmo órgão que proferiu o juízo rescindente, não havendo espaço em tal situação para se falar em supressão de instância.
“A regra cede, contudo, nos casos em que o pronto rejulgamento da causa pelo mesmo órgão julgador é incompatível com a solução dada ao caso, como, por exemplo, nas hipóteses de reconhecimento da incompetência absoluta ou nos casos de declaração de nulidade de algum ato jurídico que precisa ser renovado”, disse.
Tribunal incorreu no mesmo erro que levou à rescisão do julgado
O ministro observou que, da mesma forma, sendo verificada a nulidade de algum ato processual gerador de cerceamento de defesa, é imperativo o retorno dos autos para a correção do vício, com o posterior prosseguimento regular do processo, sob pena de o tribunal incorrer no mesmo erro que levou à rescisão do julgado.
No caso em análise, o relator verificou que a ação rescisória apontou a nulidade da intimação do advogado de uma das partes para o julgamento da apelação.
“O vício de nulidade do ato impossibilitou a parte de exercer o seu direito de defesa”, avaliou Villas Bôas Cueva, acrescentando que, “a despeito disso, o tribunal local passou a rejulgar diretamente a causa sem proceder à renovação da intimação, que considerou indispensável, incidindo no mesmo erro que culminou com a rescisão do julgado por cerceamento do direito de defesa”.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ERRO DE PROCEDIMENTO. RECURSO DE APELAÇÃO. NULIDADE. INTIMAÇÃO. SESSÃO DE JULGAMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. ATO. RENOVAÇÃO. NECESSIDADE. NOVO JULGAMENTO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cuida-se de ação rescisória julgada procedente para reconhecer vício de nulidade de intimação para o julgamento do recurso de apelação.
3. Cinge-se a controvérsia a definir (i) se o acórdão recorrido padece de vício de nulidade por negativa de prestação jurisdicional e (ii)se, após a rescisão do julgado por vício de nulidade da intimação para a sessão de julgamento do recurso de apelação, o mesmo órgão julgador pode, ato contínuo, proceder a novo julgamento da causa.
4. O recurso especial que indica violação do artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, mas traz somente alegação genérica de negativa de prestação jurisdicional, é deficiente em sua fundamentação, o que atrai o óbice da Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal.
5. O julgamento de mérito da ação rescisória pelo órgão colegiado do Tribunal normalmente compreende duas etapas: o juízo rescindente, que corresponde à desconstituição do julgado, e o juízo rescisório, que compreende o novo julgamento da demanda.
6. Em nome do princípio da economia processual, em regra, a competência para o rejulgamento da causa, em etapa subsequente à desconstituição do julgado, é do mesmo órgão julgador que proferiu o juízo rescindente, não havendo espaço para se falar em supressão de instância. A regra cede, contudo, nos casos em que o pronto rejulgamento da causa pelo mesmo órgão julgador é incompatível com a solução dada ao caso, como, por exemplo, nas hipóteses de reconhecimento da incompetência absoluta ou nos casos de declaração de nulidade de algum ato jurídico que precisa ser renovado.
7. No caso de verificação de nulidade de ato processual gerador de cerceamento de defesa, impõem-se o retorno dos autos para correção do vício e o posterior prosseguimento regular do processo, sob pena de o Tribunal incorrer no mesmo erro que ensejou a rescisão do julgado.
8. Recurso especial provido.
Leia o acórdão no REsp 1.982.586.