Carro utilizado para infração ambiental pode ser apreendido mesmo se a prática não é reiterada

A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região discutiu sobre um novo entendimento referente a infrações ambientais e concluiu que veículo utilizado para transporte irregular de madeira pode ser apreendido mesmo se a prática não é reiterada. Esse entendimento, porém, só deve ser considerado a partir de 24/02/202, quando nova jurisprudência foi validada – por isso, um recurso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) não foi acatado pela Turma, que determinou a liberação de um carro apreendido. 
 O caso foi analisado pelo TRF1 após o Ibama apelar da decisão que havia determinado arestituição de veículo apreendido em infração ambiental. A apreensão ocorreu no Pará devido ao transporte de madeira serrada com essência, em desacordo à licença concedida pelo órgão ambiental competente. 
 Sustentou o Ibama que não houve ilegalidade ou abuso de poder na apreensão pois foi constatada infração ambiental por meio de legítima fiscalização pelo órgão, com o conhecimento do proprietário.
 Ao analisar o processo, o relator, desembargador federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, destacou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vinha adotando posicionamento de que nas matérias que tratam de infração ambiental a apreensão e destinação do veículo transportador de mercadoria irregular somente se justificaria se ficasse caracterizada sua utilização específica e reiterada na atividade ilícita.
 Contudo, esclareceu o magistrado, posteriormente, houve alteração desse entendimento, afastando a exigência de¿utilização específica e reiterada do veículo em atividade ilícita¿para justificar sua apreensão, sendo a medida um importante mecanismo para a tutela do meio ambiente.
 De acordo com o desembargador, o novo entendimento considera que a apreensão dos veículos utilizados na prática de infrações ambientais visa evitar a reiteração, assegurando um melhor resultado no processo administrativo instaurado perante o órgão competente e permitindo uma eventual recuperação do dano.
Nova data da jurisprudência – Desse modo,¿destacou o magistrado, a apreensão de veículos autuados pela prática de infrações ambientais está em conformidade com a legislação, contudo, no caso concreto, foi determinada a liberação dos veículos apreendidos, em fevereiro de 2016, fundamentada na tese de que não houve comprovação do uso específico, exclusivo ou habitual do veículo. 
  Para o desembargador, não é razoável a aplicação de novo entendimento de modo a se pretender a apreensão de veículo, já liberado por decisão judicial, cuja medida, em momento posterior, mostra-se descabida e até mesmo impossível de ser cumprida.¿
  Assim, concluiu o relator, de modo a se resguardar o princípio da segurança jurídica e a estabilidade das situações já consolidadas no tempo, a tese de apreensão de veículos pela prática de infração ambiental, independentemente do seu uso específico, exclusivo ou habitual para o cometimento de irregularidades, deve ser considerada somente a partir de 24/02/2021, data de validação da nova jurisprudência.
  Por fim, em concordância com os argumentos do relator, a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região resolveu não acatar o recurso do Ibama, determinando, por unanimidade, a liberação em definitivo do veículo apreendido.
O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. INFRAÇÃO AMBIENTAL. LEI N. 9.605/98. APREENSÃO DE VEÍCULO PELO IBAMA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA UTILIZAÇÃO ESPECÍFICA E REITERADA NA ATIVIDADE ILÍCITA. STJ. RESP N. 1.814.944/RN. RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. TEMA 1036. VEÍCULOS LIBERADOS ANTES DA TESE FIXADA PELO STJ. SITUAÇÃO JURÍDICA CONSOLIDADA.

1. Trata-se de apelação interposta pelo IBAMA em face da sentença que determinou a restituição dos veículos da impetrante, na condição de fiel depositária, apreendidos por suposta infração ambiental, em razão de estarem sendo utilizados no transporte de madeira serrada com essência em desacordo com a licença outorgada pelo órgão ambiental competente. Pela impetrante foi interposto recurso adesivo, requerendo a liberação definitiva dos veículos.

2. Nos termos dos arts. 70 e 71 da Lei n. 9.605/98, no caso de ocorrência de infração administrativa ambiental, deverá a autoridade competente “lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo”, assegurando ao possível infrator o direito à ampla defesa e ao contraditório, estando previstas, entre as sanções aplicáveis, a de “apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração” (art. 72, inciso IV).

3. A jurisprudência deste Tribunal, em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, vinha adotando posicionamento no sentido de que, nas matérias que tratam de infração ambiental, a apreensão e destinação do veículo transportador de mercadoria irregular somente se justificava se ficasse caracterizada sua utilização específica e reiterada em atividade ilícita.

4. Sucede que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1.814.944/RN, sob o rito dos recursos repetitivos, definiu que a apreensão do instrumento utilizado para a prática de infração ambiental, prevista na Lei n. 9.605/1998, não exige que este seja utilizado de forma específica, exclusiva ou habitual para a atividade lesiva ao meio ambiente. Foi fixada a seguinte tese pelo STJ: “A apreensão do instrumento utilizado na infração ambiental, fundada na atual redação do § 4º do art. 25 da Lei 9.605/1998, independe do uso específico, exclusivo ou habitual para a empreitada infracional” (Tema 1036). 

5. De acordo com essa nova posição do STJ, “a exigência de requisito não expressamente previsto na legislação de regência para a aplicação dessas sanções compromete a eficácia dissuasória inerente à medida, consistindo em incentivo, sob a perspectiva da teoria econômica do crime, às condutas lesivas ao meio ambiente”. Firmou-se o entendimento de que “a apreensão definitiva do veículo impede a sua reutilização na prática de infração ambiental – além de desestimular a participação de outros agentes nessa mesma prática, caso cientificados dos inerentes e relevantes riscos dessa atividade, em especial os de ordem patrimonial -, dando maior eficácia à legislação que dispõe as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente” (REsp 1.814.944/RN, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Primeira Seção, julgado em 10/02/2021, DJe 24/02/2021).

6. Portanto, afasta-se a exigência, construída pela jurisprudência, de utilização específica e reiterada do veículo em atividade ilícita para justificar sua apreensão, sendo a medida um importante mecanismo para a tutela do meio ambiente.

7. Em que pese o novo entendimento fixado pelo STJ no Tema 1036, devem ser resguardadas as situações jurídicas consolidadas pelo decurso do tempo, tendo em vista a pouca efetividade, do ponto de vista prático, de se fazer cumprir ordem de apreensão de veículos há muito já liberados por ordem judicial.

8. No caso dos autos, os veículos da impetrante, apreendidos em virtude de sua utilização no transporte irregular de madeira, tiveram determinada sua liberação em fevereiro de 2016, muito antes, portanto, da tese fixada pelo STJ, por não ter sido identificada situação de uso específico e exclusivo para prática de atividade ilícita, por isso que deve ser mantida a sentença no ponto, dando-se provimento à apelação da impetrante para liberação definitiva dos veículos.

9. Apelação do réu e remessa oficial desprovidas; recurso adesivo da impetrante provido.

Processo: 0000579-55.2016.4.01.3901

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