Ao ser desligado do Curso de Formação de Agentes da Polícia Federal devido à reprovação na fase de investigação social, um candidato acionou a Justiça Federal no intuito de garantir o direto à nomeação, posse e exercício no cargo de agente da instituição.
De acordo com os autos, a Comissão de Investigação Social do certame registrou a existência de procedimento administrativo, aberto no banco em que o candidato trabalhava, para investigar a participação dele em fatos ilícitos, que envolviam fraudes de senhas e movimentações financeiras suspeitas, resultando em demissão por justa causa.
Para a 6ª Turma do TRF1, o ato administrativo de desligamento do requerente é legal, considerando que a Sindicância da Vida Pregressa tem o objetivo de apurar a idoneidade moral e o bom comportamento de candidatos ao cargo de agente da PF, constituindo requisito para matrícula no referido curso.
O relator, desembargador federal Daniel Paes Ribeiro, ressaltou que “na hipótese, é descabido se falar em ofensa ao princípio da presunção da inocência, porquanto não se trata da análise de infrações penais, eventualmente cometidas pelo recorrente, mas da prática de outras condutas desabonadoras de sua idoneidade, que não são compatíveis com o decoro exigido para o cargo de agente de Polícia Federal”.
Nesses termos, o Colegiado entendeu que o requerente não faz jus ao direito de nomeação ao cargo, tendo em vista que o ingresso na carreira policial exige retidão de conduta, que, no caso em questão, é afastada pela apuração das diversas atividades irregulares envolvendo a participação do autor.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. UNIÃO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO AO CARGO DE AGENTE DE POLÍCIA FEDERAL. INVESTIGAÇÃO DA VIDA PREGRESSA. CONDUTA ILÍCITA PERPETRADA PELO CANDIDATO NA QUALIDADE DE FUNCIONÁRIO DO BANCO DO BRASIL S.A. DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA. AJUIZAMENTO DE AÇÃO TRABALHISTA. EXCLUSÃO DO CERTAME. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO ATO ADMINISTRATIVO. PREVISÃO EDITALÍCIA. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS JUDICIAIS. OFENSA À PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO, NA ESPÉCIE. PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL. DECURSO DO PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. PRELIMINAR QUE SE REJEITA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. O decurso do prazo de validade do concurso público não implica a perda de objeto, especialmente quando a ação foi proposta dentro do prazo de validade do certame (AC n. 0024321-11.2012.4.01.3300 – Relator Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro – e-DJF1 de 27/11/2018). Preliminar que se rejeita.
2. Ao que consta dos autos, o demandante participou do concurso público promovido pelo Departamento de Polícia Federal, disputando vaga destinada ao cargo de Agente de Polícia Federal, sendo certo que obteve aprovação nas diversas etapas do aludido certame, chegando a ser convocado para participar do Curso de Formação Profissional, contudo, foi notificado dos fatos apurados pela Comissão de Investigação Social, registrando a existência de procedimento administrativo instaurado pelo Banco do Brasil S.A. com a finalidade de apurar a participação do ora apelante em fatos ilícitos envolvendo fraudes de senhas e manipulações ilícitas das contas, além de que o investigado apresentava movimentação financeira incoerente com os vencimentos percebidos, circunstâncias que resultaram em sua demissão por justa causa.
3. No julgamento do Recurso Ordinário n. 0000918-19.2014.5.05.0561, nos autos da ação trabalhista, foi acolhido o pleito de reversão do ato de demissão por justa causa, ao fundamento de que houve evidente cerceamento de defesa e falta de observância a norma interna da própria instituição bancária que regulamenta o trâmite do procedimento administrativo disciplinar.
4. É preciso considerar que a Sindicância da Vida Pregressa tem por objetivo apurar a idoneidade moral e o bom comportamento do candidato ao cargo de Agente de Polícia Federal e constitui requisito para matrícula no respectivo Curso de Formação Profissional, de acordo com o art. 8°, inciso I, do Decreto-Lei n. 2.320/1987. Não há que se falar em ofensa, na espécie, ao princípio da presunção de inocência, porquanto, diante das relevantes funções vinculadas ao cargo público almejado pelo recorrente, o ingresso na carreira policial exige uma retidão de conduta, caracterizada pelo procedimento irrepreensível e idoneidade moral inatacável, o que torna a apuração da vida pregressa do candidato mais rigorosa do que a exigida para outros cargos públicos.
5. Ademais, analisando detidamente as circunstâncias trazidas à apreciação, constata-se que não está mesmo caracterizado o vício na motivação do ato, diante da expressa previsão no edital regulador do processo seletivo de que seria realizada a aludida sindicância, dotada de caráter eliminatório, de modo que os organizadores do certame agiram em conformidade com a regra editalícia.
6. O ajuizamento da reclamação trabalhista não tem o condão de desconstituir os fatos que desabonam a conduta profissional do apelante junto à instituição financeira, especialmente porque os ilícitos apurados não foram, em nenhum momento desconstituídos, apegando-se o recorrente à decisão proferida pela Justiça Obreira, conquanto não revestida de definitividade, e que se ateve a questões meramente formais para invalidar sua demissão por justa causa.
7. Acertada, portanto, a conclusão da magistrada de que merece relevo a independência entre as instâncias administrativa, judicial e penal, de modo que, não sendo incontroversa a negativa de autoria dos fatos imputados, as circunstâncias podem repercutir na esfera moral do candidato, em virtude do rigor exigido para a função policial.
8. Deve ser considerado, no caso em apreço, que foram apuradas diversas atitudes irregulares envolvendo a participação do autor, tais como consulta do cadastro de clientes, cujas contas foram posteriormente fraudadas, além do que sua imagem foi capturada segundos depois de serem realizados dois saques suspeitos de fraude, fatos que infirmam a necessária idoneidade moral e o comportamento irrepreensível exigidos para continuidade no certame.
9. Deve ser acrescido à substanciosa análise empreendida pela julgadora em 1º grau de jurisdição que, na hipótese, é descabido se falar em ofensa ao princípio da presunção da inocência, porquanto não se trata da análise de infrações penais, eventualmente cometidas pelo recorrente, mas da prática de outras condutas desabonadoras de sua idoneidade, que não são compatíveis com o decoro exigido para o cargo de Agente de Polícia Federal, as quais ocasionaram, inclusive, sua demissão por justa causa do Banco do Brasil S.A. e o ajuizamento de uma ação judicial em trâmite na Justiça do Trabalho. Precedente.
10. A ordem judicial oriunda do agravo de instrumento foi proferida em exame de caráter perfunctório, próprio das medidas de urgência. No entanto, o exame mais acurado da questão, favorecido no âmbito da ação de rito ordinário, que permite a análise exauriente da questão, revela o acerto da sentença combatida que, por isso, deve ser mantida.
11. Apelação não provida.
Processo: 0070693-04.2015.4.01.3400