Benefício previdenciário negado judicialmentee recebido por meio de tutela antecipada não precisa ser devolvido ao erário

A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou o pedido do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que pretendia receber de volta valores pagos a um beneficiário a título de tutela antecipada. 
Tutela antecipada é o nome jurídico que se dá quando o juízo permite que o autor de uma ação obtenha antecipadamente algo que pediu no processo, enquanto a ação segue tramitando até seu julgamento final. 
No caso, um beneficiário do INSS pretendia a concessão de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez, mas perdeu a ação. O valor pago pelo instituto a título de tutela antecipada era o que pretendia o INSS junto ao TRF1 após a sentença que lhe negou o pedido. 
O INSS alegou que, independentemente da boa-fé do autor para o recebimento do benefício, cabe o ressarcimento ao erário. A autarquia citou entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que afirma ser cabível a devolução de valores recebidos a título de tutela antecipada, posteriormente revogada, solicitando a reforma da sentença nesse ponto específico.  
Novo entendimento – Ao examinar a apelação, o relator, desembargador federal João Luiz de Sousa, afirmou que a sentença não merece reparo.  Ele alegou que, de fato, o benefício não concedido estava sendo pago por antecipação de tutela e que o STJ já adotou entendimento no sentido de devolução desses valores indevidamente recebidos — contudo, posteriormente, houve orientação diversa do Supremo Tribunal Federal (STF) mudando esse entendimento.  
Além disso, o magistrado defendeu que não se pode exigir a devolução de tais verbas por serem destinadas à subsistência do segurado, sendo necessário considerar possível hipossuficiência. O desembargador também alegou que tais beneficiários podem não ter condições de fazer a devolução dos valores por viverem no limite do necessário à sobrevivência com dignidade.  
O recurso ficou assim ementado:

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA-FÉ. TEMA 979, RESP 1381734/RN. SENTENÇA MANTIDA.

1. Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez e deixou de determinar a devolução dos valores efetuados a título de tutela antecipada, a qual fora revogada. Em suas razões o INSS alegou, em síntese, que o dever de ressarcimento ao erário independe da boa-fé do autor na percepção do benefício. Aduz que a r. sentença teria sido editada em afronta ao recente entendimento jurisprudencial do e. STJ, em sede de representatividade de controvérsia, e viola o art. 115 da Lei n. 8.213/91. Afirma que o STJ, na decisão proferida nos autos da petição nº 10.996/SC entendeu pelo “cabimento da devolução de valores recebidos a título de tutela antecipada posteriormente revogada.”

2.  Não obstante a revogação da antecipação de tutela, não se pode exigir a devolução dos valores recebidos a título de benefício previdenciário ou assistencial, visto que se cuidam de montante destinado à subsistência do segurado ou assistido, ou de quem afirma deter essa qualidade, pessoas geralmente hipossuficientes e sem condições materiais de proceder à restituição, vivendo no limite do necessário à sobrevivência com dignidade. (TRF-1 – AC: 00247788720184019199, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO NEVES DA CUNHA, Data de Julgamento: 05/12/2018, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: 25/01/2019)

3.  “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes. (…) Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/1991. Precedentes.” (ARE 734242 agR, relator Ministro ROBERTO BARROSO, 1ª T,DJe-175, pub. 08/09/2015).

4. O recurso não merece prosperar, “ainda que invocando o Tema 692, Resp 1401560/MT,  julgado em fevereiro de 2014, pelo qual se considerou possível a repetição dos valores previdenciários pagos indevidamente, diante do repertório jurisprudencial mais recente, igualmente representativo de controvérsia, no tema 979, Resp 1381734/RN, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021, que somente admitiu a devolução na hipótese de erro, quando não inequívoca a presença da boa-fé, bem como do ARE 734242 AgR, julgado no c. STF, na relatoria do e. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, Julgado em 04/08/2015, Processo Eletrônico DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015, segundo o qual Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/1991”. (TRF-1 – AI: 10142874820214010000, Relator: JUIZ FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO, Data de Julgamento: 01/07/2021, Data de Publicação: PJe 01/07/2021 PAG PJe 01/07/2021 PAG)

5. Apelação do INSS desprovida.

A Turma acompanhou o voto do relator, por unanimidade. 
Processo: 1008311-02.2022.4.01.9999

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