Barroso restabelece mandato do vereador Renato Freitas, de Curitiba

Com suspensão da cassação, vereador poderá participar das eleições deste ano. Ministro considerou que houve, por parte da Câmara Municipal, restrição ao direito fundamental à liberdade de expressão do parlamentar, exercida em defesa de grupo vulnerável.

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), restabeleceu o mandato do vereador Renato Freitas, de Curitiba, cassado em função de sua participação em protesto contra o racismo nas dependências da igreja do Rosário, na capital paranaense, após casos de homicídio de pessoas negras com grande repercussão nacional. Com a suspensão da cassação, Freitas poderá participar das eleições deste ano.

A liminar também suspendeu a eficácia de decisões do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), que negaram pedidos de tutela antecipada e mantiveram o ato da Câmara que decretou a cassação por quebra de decoro parlamentar.

Na Reclamação (RCL) 55948, o vereador afirma que o processo de cassação durou mais que 90 dias, prazo máximo previsto na legislação (Decreto-Lei 201/1967, artigo 5º, VII). Ele relata que o TJ-PR manteve o ato de cassação porque o Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Municipal prevê a prorrogação do prazo de duração do processo.

Freitas argumenta que as decisões do TJ-PR desrespeitaram a jurisprudência do Supremo (Súmula Vinculante 46), segundo a qual “a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União”. Aponta, ainda, que a manutenção das decisões implicaria dano grave e irreparável, já que além da subtração do mandato, ocasionaria o indeferimento do registro de sua candidatura a deputado estadual.

Na decisão, Barroso considerou a alegação de que o processo de cassação deve ser disciplinado por norma federal e não local, o que limita a duração do procedimento em 90 dias corridos. Ele salientou que as garantias legais do processo de cassação do mandato visam a proteger não só o direito individual do parlamentar, mas, sobretudo, o princípio democrático. “Em respeito ao voto popular, tal punição deve resultar de procedimento que observe com rigor as exigências legais”, disse.

Para o ministro, a punição da Câmara Municipal é ainda mais relevante, pois importou em restrição ao direito fundamental à liberdade de expressão do parlamentar, exercida em defesa de grupo vulnerável, submetido a constantes episódios de violência. “Em respeito ao voto popular, tal punição deve resultar de procedimento que observe com rigor as exigências legais”, afirmou.

Barroso frisou que, mesmo sem antecipar julgamentos, é impossível dissociar a cassação do mandato do pano de fundo do racismo estrutural da sociedade brasileira. Segundo ele, essa disfunção, ligada ao colonialismo e à escravização em sua origem, se manifesta não apenas em situações de discriminação direta ou intencional, como também na desigualdade de oportunidades e na disparidade de tratamento da população negra. “Na situação aqui examinada, e talvez não por acaso, o protesto pacífico em favor de vidas negras, feito pelo vereador reclamante dentro de igreja, motivou a primeira cassação de mandato na história da Câmara Municipal de Curitiba”, afirmou”.

Leia a íntegra da decisão.

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