A metodologia utilizada para quantificar a multa imposta pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) ao dono de uma aeronave foi tema de um julgamento no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1). O caso envolveu as infrações cometidas pela prática de “deixar de indicar a localidade da área de pouso no campo ‘observações’ do diário de bordo”.
O dono da aeronave deu início ao processo porque a ANAC aplicou multa no valor de R$1.200,00 a cada um dos 19 voos realizados por uma aeronave em um único auto de infração, somando R$ 22.800,00 a serem pagos. Ele defendeu que deveria ser aplicada multa única em vez do somatório de várias multas pela mesma infração, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Na sentença da 9ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF), o juiz deu razão ao autor e estabeleceu que a Agência determinasse um novo valor único para a multa, sem somar todas as vezes em que ocorreu a infração.
Porém, o juízo de primeiro grau entendeu que “a multa a ser exigida pelo descumprimento da norma por 19 (dezenove) vezes deve, necessariamente, ser superior a multa que seria imposta se essa determinação fosse infringida uma única vez”.
Único auto de infração – A Agência recorreu ao TRF1 porque entendeu que deve ser aplicada a multa conforme havia sido calculada e afirmou que a jurisprudência do STJ não se aplicava a este tipo de infração.
A 5ª Turma do TRF1 confirmou a sentença e determinou que a ANAC arbitre um novo valor para a multa única a ser aplicada. Relatora, a desembargadora federal Daniele Maranhão verificou que as infrações foram lavradas em um único auto de infração, devendo ser aplicado ao caso o reconhecimento da infração continuada, aplicada uma única multa e não um somatório ou multiplicidade de multas, e que a sentença estava de acordo com a jurisprudência do STJ para o caso.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO. MULTA. ANAC. ÚNICO AUTO DE INFRAÇÃO.INFRAÇÃO CONTINUADA. MULTA SINGULAR. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. HONORÁRIOS. ART. 85, §§2º E 3º DO CPC. PROVEITO ECONÔMICO ESTIMÁVEL. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
1. A controvérsia versa sobre a legalidade das multas aplicadas pela ANAC à parte autora no âmbito do processo administrativo no 00068.003450/2016-45 (auto de infração nº. 004164/2016), no que tange à metodologia utilizada para a quantificação da sanção pecuniária imposta.
2. Por reputar comprovada a prática de 19 (dezenove) infrações à seção 137.521 (d) do RBAC 137, a ANAC, com espeque no Anexo I, da Resolução n.º 25 da ANAC, de 25 de abril de 2008, aplicou multa de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) para cada um dos 19 (dezenove) voos realizados com a aeronave PT-GYR, lavrando o auto de infração n.º 004164/2016, totalizando, assim, pena pecuniária na importância global de R$ 22.800,00 (vinte e dois mil e oitocentos reais).
3. Sucede que, de acordo com a jurisprudência do STJ, a apuração de múltiplas infrações da mesma natureza, quando lavradas em um único auto de infração, devem ser consideradas como infração continuada para aplicação da penalidade cabível, ensejando a aplicação de uma única multa ao caso (AgInt no AREsp n. 1.356.452/RJ, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 9/2/2021, DJe de 17/2/2021).
4. Considerando que na hipótese dos autos houve a apuração de dezenove infrações referentes à prática de “deixar de indicar a localidade da área de pouso no campo ‘observações’ do diário de bordo (…), contrariando a seção 137.521 do RBAC 137”, infrações estas lavradas em um único auto de infração (AI no 004164/2016), deve ser aplicado ao caso o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido do reconhecimento da infração continuada, sendo aplicada uma única multa à espécie, conforme entendimento constante na sentença recorrida.
5. Assiste razão em parte à ANAC no que tange à irresignação quanto aos honorários advocatícios fixados na origem. Isso porque o juízo de origem, em redação confusa, fixou os honorários advocatícios “em 90% dos percentuais mínimos do artigo 85, do CPC”.
6. Sucede que o art. 85, § 2º prevê que os honorários advocatícios somente serão fixados sobre o valor atualizado da causa quando não for possível a mensuração do valor da condenação ou do proveito econômico obtido, o que não é o caso dos autos, uma vez ser possível na espécie a aferição do proveito econômico obtido pelo autor, resultante da diferença entre o valor da multa originalmente aplicada e o valor da multa singular a ser aplicada como resultado desta ação, montante este a ser aferido em sede de liquidação de sentença. Ademais, o § 3º do mesmo artigo dispõe que, nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários deverá observar o percentual mínimo de 10% (dez por cento) nas condenações até 200 (duzentos) salários-mínimos.
7. Destarte, a sentença deve ser reformada, para que, em atenção ao disposto no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, os honorários advocatícios sejam fixados em 10% (dez por cento) do proveito econômico obtido pelo autor, a ser apurado em sede de liquidação de sentença (art. 85, § 4º, II, do CPC).
8. Apelação da ANAC a que se dá parcial provimento, nos termos do item 7.
A decisão do colegiado foi unânime, nos termos do voto da relatora.
Processo: 1039153-76.2019.4.01.3400