Para a 8ª Turma, a proteção à mulher prevista na CLT vai contra o princípio da isonomia
A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho julgou improcedente a reclamação trabalhista ajuizada pelo Sindicato dos Empregados no Comércio de Florianópolis (SC), que pretendia que as empregadas da Rede Catarinense de Supermercados Ltda. tivessem uma folga aos domingos a cada duas semanas, como prevê o artigo 386 da CLT. Para o colegiado, a norma, inserida no capítulo da proteção do trabalho da mulher, vai de encontro ao princípio da isonomia, previsto no artigo 5º da Constituição da República.
Proteção x discriminação
O juízo da 7ª Vara do Trabalho da capital catarinense negou o pedido, por considerar que o artigo 386 da CLT não foi recepcionado pela Constituição, ou seja, não é compatível com o princípio da isonomia entre homens e mulheres.
Recepção x incompatibilidade
O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, contudo, condenou a empresa ao pagamento em dobro de um descanso dominical por mês para cada empregada durante a vigência do contrato de trabalho nas hipóteses em que tenha havido desrespeito à regra da CLT. Segundo o TRT, o artigo 384, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, está no mesmo capítulo do artigo 386 – o Capítulo III, que estabelece diversas medidas a fim de proteger a mulher no ambiente de trabalho e nas relações de emprego. “Reconhecida a constitucionalidade do artigo 384, não há a menor lógica em afirmar que o artigo 386 não é constitucional, pois ambos tratam de garantias com enormes semelhanças entre si”, escreveu o relator.
Igualdade
A relatora do recurso de revista da rede de supermercados, ministra Dora Maria da Costa, assinalou que a Constituição considera homens e mulheres iguais em direitos e obrigações e não impõe que o repouso semanal remunerado recaia sempre no dia de domingo, mas preferencialmente. No mesmo sentido, o artigo 6º, parágrafo único, da Lei 10.101/2000 determina que o repouso deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo.
De acordo com a ministra, as empregadas da rede tinham assegurada a folga semanal, tendo-se por compensados os demais domingos trabalhados. Assim, concluiu não ser devido o pagamento do descanso dominical na forma deferida pelo TRT, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da isonomia. “Não obstante homens e mulheres se diferenciarem em alguns pontos, especialmente no concernente ao aspecto fisiológico, esse diferencial não dá amparo ao gozo de mais folgas no dia de domingo às mulheres do que aos homens, já que o gozo da folga semanal em outro dia da semana não resulta em desgaste físico maior”, afirmou.
Na decisão, a Oitava Turma entendeu, ainda, que a Constituição estabelece a proteção às mulheres mediante incentivos específicos, razão pela qual devem ser repelidas regras que resultem em desestímulo ao trabalho da mulher.
O recurso ficou assim ementado:
A) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA. APLICABILIDADE DO ART. 386 DA CLT. O agravo de instrumento merece provimento, com consequente processamento do recurso de revista, haja vista que a reclamada logrou demonstrar a configuração de possível ofensa ao art. 5°, I, da CF. Agravo de instrumento conhecido e provido. B) RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA. APLICABILIDADE DO ART. 386 DA CLT. 1. No Capítulo III, no qual dispõe sobre a proteção do trabalho da mulher, o art. 386 da CLT estabelece que, “havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical“. Por sua vez, a Constituição Federal veda a discriminação em razão do sexo, consoante os termos do inciso I do art. 5°, segundo o qual “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição“. 3. Se não bastasse, nos termos do art. 7°, XV, da CF, o repouso semanal remunerado deve ser concedido preferencialmente aos domingos, e o art. 6°, parágrafo único, da Lei n° 10.101/00 determina que “o repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho e outras a serem estipuladas em negociação coletiva”. 4. Como se observa, a Constituição Federal, além de consignar que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, não determina que o repouso semanal remunerado ocorra sempre no dia de domingo, sendo certo haver disposição legal de que o repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o referido dia. 5. Dentro desse contexto, se as empregadas substituídas tinham assegurada a folga semanal, nos moldes do art. 6°, parágrafo único, da Lei n° 10.101/00, têm-se por compensados os demais domingos trabalhados, não havendo falar em condenação ao pagamento do descanso dominical, na forma deferida pelo Tribunal a quo, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da isonomia, mormente porque, não obstante homens e mulheres diferenciarem-se em alguns pontos, especialmente no concernente ao aspecto fisiológico, esse diferencial não dá amparo ao gozo de mais folgas no dia de domingo às mulheres do que aos homens, já que o gozo da folga semanal em outro dia da semana não resulta em desgaste físico maior. 6. Ademais, o art. 7°, XX, da CF estabelece a proteção do trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, razão pela qual se repelem regras que resultem em desestímulo ao trabalho da mulher, de modo que, com fulcro no referido dispositivo consitucional, tem-se pela aplicabilidade do comando do art. 6°, parágrafo único, da Lei n° 10.101/00 a todos os trabalhadores, sem distinção de sexo. Recurso de revista conhecido e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-1606-35.2016.5.12.0037