TRF3 determina pagamento de pensão por morte a viúva em união estável

Décima Turma observou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero

A Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) condenou o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ao pagamento de pensão por morte a uma mulher que, após se divorciar, viveu em união estável com o ex-marido.

A decisão do TRF3 levou em consideração o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, instituído pelo Conselho Nacional de Justiça, e reformou sentença, que havia negado o pedido da viúva.

Pelo Protocolo, o julgador deve se abster de perguntas calcadas em estereótipos de gênero ou em temas íntimos irrelevantes, devendo dirigir a instrução probatória aos elementos objetivos para caracterização da união estável — convivência pública, contínua e duradoura, e dependência econômica.

Com base no voto da relatora, desembargadora federal Gabriela Araújo, a Décima Turma entendeu que houve falha na condução do depoimento da viúva em razão de indagações de natureza íntima consideradas irrelevantes para decidir sobre o direito à pensão por morte.

Na ocasião, foram perguntados os motivos da separação e da reconciliação, se o segurado agredia a mulher, se costumava se embriagar, se o casal dormia no mesmo quarto, se havia relacionamento sexual e se ele mantinha relações extraconjugais.

“Tais questionamentos reiterados traduzem uma visão extremamente estigmatizante com relação ao papel e aos direitos da mulher dentro de uma relação conjugal”, afirmou a relatora.

“A manutenção, em quaisquer atos judiciais, de práticas eivadas de um machismo, afronta o caráter protetivo do benefício previdenciário e desvirtua a real finalidade do processo”, frisou a desembargadora federal.

O acórdão também cita a Lei nº 15.069, de 23 de dezembro de 2024, que instituiu a Política Nacional de Cuidados.

“Admitir que a mulher assuma uma função não remunerada de cuidar de seu companheiro enfermo e ao mesmo tempo afirmar que tal responsabilidade não é suficiente para configurar a relação afetiva entre o casal acaba por reforçar esse estereótipo de gênero extremamente discriminatório, como se a parte autora fosse obrigada a cuidar do ‘de cujus’, pelo simples fato de ser mulher”, disse a relatora.

O casal teve duas filhas, divorciou-se em 2017 e, posteriormente, viveu em regime de união estável até a morte do segurado, em decorrência de câncer, em setembro de 2020.

Conforme a decisão da Décima Turma, a pensão por morte será concedida em caráter vitalício, desde a data do falecimento. A implantação do benefício deverá ser imediata, independentemente do trânsito em julgado do processo.

Apelação Cível 5002022-79.2023.4.03.6123

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