RECURSOS REPETITIVOS
Compartilhe:
Processo
REsp 2.174.028-AL, Rel. Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 8/5/2025, DJEN 13/5/2025. (Tema 1318).
REsp 2.174.008-AL, Rel. Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 8/5/2025, DJEN 13/5/2025 (Tema 1318).
Ramo do Direito
DIREITO PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Dosimetria da pena. Premeditação. Valoração negativa da culpabilidade. Possibilidade. Tema 1318.
Destaque
- A premeditação autoriza a valoração negativa da circunstância da culpabilidade prevista no art. 59 do Código Penal, desde que não constitua elementar ou seja ínsita ao tipo penal nem seja pressuposto para a incidência de circunstância agravante ou qualificadora;
- A exasperação da pena-base pela premeditação não é automática, reclamando fundamentação específica acerca da maior reprovabilidade da conduta no caso concreto.
Informações do Inteiro Teor
A questão consiste em definir se a premeditação autoriza a valoração negativa da circunstância da culpabilidade, prevista no art. 59 do Código Penal, e se essa valoração configura bis in idem.
O Código Penal em vigor não prevê, textualmente, a premeditação como elemento autônomo para incidência na dosimetria da pena, ao contrário do que já ocorreu em diplomas penais brasileiros anteriores.
Nada obstante, é uníssona a jurisprudência de ambas as Turmas de Direito Penal do STJ e também do STF no sentido de que a premeditação autoriza a valoração negativa na dosimetria da pena, incidindo ainda em primeira fase, quando da avaliação das circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal.
“A premeditação demonstra que o agente teve uma maior reflexão, um tempo para ponderar, trabalhando psiquicamente a conduta criminosa, o que demonstra um maior grau de censura ao comportamento do indivíduo, apto a majorar a pena-base” (AgRg no REsp 1.721.816/PA, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 29/6/2018), motivo pelo qual é tranquilo nesta Corte Superior o entendimento de que o locus para a sua valoração é o vetor da culpabilidade, “que diz respeito à demonstração do grau de reprovabilidade ou censurabilidade da conduta praticada” (REsp 1.352.043/SP, Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 28/11/2013).
A premeditação não é inerente ao dolo, não sendo elemento inexorável à conformação típica, pelo que a objeção calcada na proibição de bis in idem não se sustenta para o afastamento, em abstrato, de sua utilização para a valoração negativa da culpabilidade. Todavia, a proibição de dupla punição é preocupação relevante para a análise dos casos concretos, não podendo a premeditação (i) constituir elementar ou ser ínsita ao tipo penal; (ii) ser pressuposto necessário para a incidência de agravante ou qualificadora; ou (iii) ser tratada como de incidência automática, devendo ser demonstrada, no caso concreto, a maior reprovabilidade da conduta.
Torna-se necessária, assim, uma cuidadosa avaliação, a cada caso, do que se extrai da reflexão e ponderação do agente, para que não se valore negativamente, a título de premeditação, a conduta titubeante que, ao invés de fria e meticulosa preparação do fato criminoso, demonstre ter sido tangenciada a desistência ou revele relutância na realização da prática criminosa. É dizer: se a premeditação pode implicar na desvaloração da culpabilidade, não significa que deva, sempre, desaguar na majoração da pena-base.
Dessa forma, caberá ao magistrado a análise dos contornos fáticos e da prova dos autos para verificar se os elementos concretos demonstram a maior reprovabilidade da conduta – devendo fundamentar tal constatação, conforme determina o art. 93, IX, da Constituição Federal.
Ante o exposto, para fins dos arts. 927, III, 1.039 e seguintes do CPC/2015, fixam-se as seguintes teses:
- A premeditação autoriza a valoração negativa da circunstância da culpabilidade prevista no art. 59 do Código Penal, desde que não constitua elementar ou seja ínsita ao tipo penal nem seja pressuposto para a incidência de circunstância agravante ou qualificadora;
- A exasperação da pena-base pela premeditação não é automática, reclamando fundamentação específica acerca da maior reprovabilidade da conduta no caso concreto.
Informações Adicionais
Legislação
Código Penal, art. 59
Saiba mais:
Jurisprudência em Teses / DIREITO PENAL – EDIÇÃO N. 26: APLICAÇÃO DA PENA
Pesquisa Pronta / DIREITO PENAL – DOSIMETRIA DA PENA.
CORTE ESPECIAL
Compartilhe:
Processo
EAREsp 1.479.019-SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por maioria, julgado em 7/5/2025, DJEN 19/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Efetivação de obrigação de fazer ou de não fazer ou de entregar. Multa periódica (astreintes). Valor acumulado da multa vencida. Revisão. Impossibilidade. Regra específica no CPC/2015. Desestímulo à recalcitrância e à litigância abusiva reversa. Precedente vinculante da Corte Especial. Observância obrigatória. Pendência de discussão sobre a multa. Relação com o vencimento. Inexistência. Abuso do credor. Conversão em perdas e danos de ofício. Possibilidade. Resultado prático equivalente ao adimplemento. Ordens judiciais a órgãos públicos e instituições privadas. Preferência.
Destaque
- A modificação das astreintes somente é possível em relação à multa vincenda, nos termos do art. 537, § 1°, do CPC e de precedente vinculante da Corte Especial do STJ, de modo que não é lícita a redução da multa vencida, ainda que alcançados patamares elevados.
- O problema dos valores elevados alcançados com a incidência da multa periódica deve ser combatido preventivamente das seguintes formas: i) conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, de ofício, quando verificada a inércia abusiva do credor em relação ao exercício da faculdade prevista no art. 499 do CPC; e ii) preferência pela expedição de ordens judiciais a órgãos públicos e instituições privadas visando ao alcance do resultado prático equivalente ao adimplemento, substituindo a atuação do obrigado, quando possível.
Informações do Inteiro Teor
A controvérsia resume-se em definir se é possível a redução do valor das astreintes quando alcançados patamares elevados, caso em que o excesso deve ser verificado a partir do total acumulado ou levando-se em conta o valor da multa periódica.
Todavia, independentemente do parâmetro a ser utilizado para aferição do excesso, a Corte Especial do STJ decidiu, há cerca de um ano, que “segundo o art. 537, § 1°, do CPC/2015, a modificação somente é possível em relação à ‘multa vincenda'” (EAREsp n. 1.766.665/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, julgado em 3/4/2024, DJe 6/6/2024).
Considerando que se trata de acórdão proferido pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, tem natureza jurídica de precedente vinculante, nos termos do art. 927 do CPC.
Portanto, como não se cogita de superação ou distinção, impõe-se a observância do precedente para preservar a segurança jurídica, lembrando que os tribunais devem manter a sua jurisprudência “estável, íntegra e coerente”, conforme determina o art. 926 do CPC.
Por outro lado, verifica-se que a Quarta Turma do STJ, no julgamento do AgInt no AREsp n. 2.558.173/RS (DJe 5.9.2024), sob relatoria do Ministro Marco Buzzi concluiu, por unanimidade, que “o art. 537, §1°, do Código de Processo Civil de 2015 não se restringe somente à multa vincenda, pois, enquanto houver discussão acerca do montante a ser pago a título da multa cominatória, não há falar em multa vencida”.
Em primeiro lugar, não se afigura adequado invocar um julgado que desrespeitou um precedente da Corte Especial do STJ para sustentar a necessidade de superação desse mesmo precedente.
Em segundo lugar, o fundamento adotado pela Quarta Turma do STJ foi rechaçado expressamente no julgamento dos EAREsp n. 1.766.665/RS, conforme se depreende do seguinte trecho do respectivo acórdão: “No entanto, analisando a questão com mais profundidade, tem-se que a pendência de discussão acerca do montante da multa não guarda relação com o seu vencimento, mas, sim, com a sua definitividade”.
Reafirma-se, portanto, que a pendência de discussão sobre a multa cominatória não guarda relação com o seu vencimento, o qual ocorre de pleno direito quando o prazo fixado na decisão judicial é alcançado sem que a obrigação seja cumprida. É o que se extrai da regra do art. 537, § 4º, do CPC.
De qualquer forma, mesmo que fosse possível superar um precedente apenas em virtude de “uma leitura mais atenta”, a regra do art. 537, §1º, do CPC não deixa margem a dúvidas ao determinar que “o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: (…)”.
Ainda que se aplique o princípio do “quem pode o mais pode o menos”, a autorização para exclusão da multa indicaria a possibilidade de sua redução, mas, de toda sorte, apenas no tocante à vincenda.
Por outro lado, não se encontra doutrina sustentando a tese no sentido de que a expressão “vincenda”, utilizada pelo legislador no § 1º do art. 537, refere-se apenas à “periodicidade da multa”.
A norma tem a finalidade de combater a inércia do devedor que, como ocorreu no caso, permanece durante anos sem cumprir a obrigação que lhe foi imposta e se limita a requerer a redução da multa que alcançou patamares elevados tão somente em razão da sua recalcitrância.
Ainda sobre a recalcitrância, destaca-se a advertência feita pelo Presidente do STJ, Ministro Herman Benjamin, na sessão da Corte Especial do dia 13 de março deste ano, sobre a necessidade de enfrentamento da litigância predatória (ou abusiva) reversa, nos termos seguintes: “É importante que nós alertemos a doutrina e os juízes que existe a litigância predatória reversa. Grandes litigantes, empresas normalmente, que se recusam a cumprir decisões judiciais, súmulas, repetitivos, texto expresso de lei, não buscam, e quando são chamados não mandam representante ou então mandam sem poderes para transigir (…) e nós estamos muitas vezes falando de duzentos mil, de quinhentos mil litígios provocados por um comportamento absolutamente predatório por parte de um dos agentes econômicos ou do próprio Estado (…)”.
Neste caso, como em tantos outros, o pano de fundo é a litigância abusiva reversa da instituição financeira, que deve ser combatida com firmeza, o que certamente não ocorrerá se o STJ, contrariando o texto expresso da lei, decidir pelo enfraquecimento da principal técnica processual que garante a efetividade da tutela jurisdicional.
A questão dos valores muito elevados que decorrem da renitência do devedor deve ser enfrentada de outras formas.
O STJ já reconheceu que o magistrado pode determinar, de ofício, a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos quando constatada a impossibilidade de cumprimento da tutela específica (REsp n. 2.121.365/MG, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 3/9/2024, DJe 9/9/2024).
Seguindo a mesma linha, também deve ser considerada lícita a conversão de ofício quando verificado o abuso do direito do credor que, na expectativa de elevar o montante alcançado com a incidência da multa, não exerce a prerrogativa prevista no art. 499 do CPC – requerimento de conversão em perdas e danos -, comportamento que, ademais, viola o dever de mitigação do próprio prejuízo (duty to mitigate the loss).
Dessa forma, restariam compatibilizados os deveres de “boa-fé e cooperação, direcionados a ambas as partes”, com a necessidade de manter hígidas as técnicas processuais que garantem a efetividade da tutela jurisdicional.
Ainda, quando se mostrar viável no caso concreto, compete ao magistrado, de ofício, substituir a multa periódica ou qualquer outra medida coercitiva pelas “medidas necessárias” para a “obtenção do resultado prático equivalente” ao adimplemento, conforme dispõe o art. 536 do CPC.
Assim, deve-se dar preferência à expedição de ordens judiciais encaminhadas diretamente a órgãos públicos e instituições privadas determinando, por exemplo, o cancelamento de gravames de veículos, a exclusão de dados de cadastros de inadimplentes, a suspensão da publicidade de protesto de título e o registro de contratos em cadastros públicos.
De qualquer forma, não adotadas essas providências e não convertida a obrigação de fazer (ou de não fazer ou de entregar) em perdas e danos, não é lícita a redução da multa vencida.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Civil (CPC), art. 499; art. 536; art. 537, § 1° e § 4º; art. 926 e art. 927.
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 806
Informativo de Jurisprudência n. 691
Informativo de Jurisprudência n. 495
Informativo de Jurisprudência n. 490
Pesquisa Pronta / DIREITO PROCESSUAL CIVIL – MULTA DIÁRIA (ASTREINTES)
PRIMEIRA TURMA
Compartilhe:
Processo
RMS 67.965-MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 3/6/2025.
Ramo do Direito
DIREITO ADMINISTRATIVO
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Lei de Acesso à Informação (LAI). Acesso a informações públicas. Livro de portaria de unidade prisional. Restrição de acesso e sigilo. Possibilidade.
Destaque
A negativa de acesso a informações do livro de portaria de unidade prisional, documento classificado como sigiloso (acesso restrito), não viola o direito líquido e certo do impetrante de obter informações públicas.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia em saber se a negativa de acesso a informações do livro de portaria de unidade prisional, documento classificado como sigiloso (acesso restrito), viola o direito líquido e certo do impetrante de obter informações públicas.
A administração pública encontra-se vinculada ao princípio da publicidade, o qual determina que seus atos serão amplamente divulgados, permitindo seu conhecimento pela coletividade e viabilizando o controle por parte dos interessados, conforme disposto no art. 37, caput, da Constituição Federal.
Nesse sentido, a regra geral imposta ao Poder Público é a publicidade de seus atos, devendo o sigilo ser tratado como exceção (art. 3º, I, da Lei de Acesso à Informação – Lei n. 12.527/2011), e somente admissível nos casos expressamente autorizados por lei.
Assim, diante da presunção de publicidade dos atos administrativos, não se admite, como regra, a negativa de acesso a informações, salvo nas hipóteses excepcionais legalmente previstas, especialmente quando relacionadas à proteção da segurança ou à privacidade/intimidade das pessoas.
Nos termos do que dispõe o art. 6º da Lei de Acesso à Informação (LAI), incumbe aos órgãos e às entidades da administração pública, com observância das normas e dos procedimentos legais pertinentes, garantir a proteção das informações classificadas como sigilosas e daquelas de natureza pessoal, proteção essa que deve assegurar não apenas a restrição de acesso mas também a preservação da disponibilidade, da autenticidade e da integridade desses dados, de modo a resguardar o interesse público envolvido.
Seguindo esse raciocínio, a própria Lei de Acesso à Informação prevê expressamente três categorias distintas de restrição ao acesso informacional, quais sejam, (1) dados cujo sigilo decorre de imposição legal, conforme disposto no art. 22; (2) informações de natureza pessoal, nos termos do art. 31; e (3) informações classificadas como sigilosas segundo o procedimento formal previsto no art. 23 da referida norma.
Diante desse cenário, a administração pública, ao classificar informações como sigilosas, deve observar estritamente os critérios legais, assegurando o equilíbrio entre a necessária transparência dos atos administrativos e a proteção legítima do segredo informacional.
O livro de portaria de unidade prisional é um documento em que são registradas informações sobre pessoas, rotinas e ocorrências no respectivo setor, que, por sua vez, é notoriamente um local sensível e estratégico para a segurança de cada unidade prisional e da população em geral.
No caso, a negativa de acesso foi fundamentada na presença de dados sigilosos e sensíveis, cuja divulgação pode comprometer a segurança da unidade prisional, das pessoas e da sociedade em geral.
Dessa forma, depreende-se que, diante do pedido de acesso formulado pela parte, o agente público verificou a viabilidade da prestação de informações e, nos termos da Lei de Acesso à Informação, identificou o caráter sigiloso da informação, respondendo mediante decisão fundamentada, negou o pedido de acesso e classificou o sigilo, não incorrendo, pois, em ilegalidade.
Informações Adicionais
Legislação
Constituição Federal (CF), art. 37, caput
Lei de Acesso à Informação (LAI), artigos 3º, I; 6º; 22; 23 e 31
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 11 – Edição Especial
SEGUNDA TURMA
Compartilhe:
Processo
AgInt no REsp 2.027.287-MT, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 30/4/2025, DJEN 7/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tempestividade. Alegação de intempestividade do recurso da parte contrária. Comprovação. Juntada de “prints” de tela no próprio corpo da petição. Impossibilidade.
Destaque
Não é possível o reconhecimento da intempestividade do recurso da parte contrária por meio da mera juntada de “prints” de telas no próprio corpo da petição.
Informações do Inteiro Teor
A controvérsia versa sobre a possibilidade de comprovação da intempestividade do recurso da parte contrária por meio da juntada de prints de telas no próprio corpo da petição.
No caso, a parte apenas colacionou prints, sem anexar quaisquer certidões formais, emitidas pela Corte local, contendo a data de intimação da Fazenda Pública, sendo certo que, nos autos, há apenas a certidão emitida pela Corte de origem, indicando a tempestividade do recurso especial interposto.
É bem verdade que as certidões de tempestividade lavradas na instância antecedente não vinculam o juízo de admissibilidade a ser feito no Superior Tribunal de Justiça. E assim o é, pois compete ao STJ o exame definitivo sobre a tempestividade do recurso que lhe é dirigido, o que é aferido sempre a partir dos elementos constantes nos autos, notadamente, as certidões de intimação da parte quanto ao acórdão recorrido e a data de interposição do recurso especial.
É por isso que, examinando a data de intimação da recorrente e de interposição do recurso especial, pode-se até mesmo desconsiderar a certidão de tempestividade do recurso especial emitida na origem, que, eventualmente, pode ter levado em consideração feriado local não comprovado ou até mesmo estar eivada de erros de qualquer natureza.
No entanto, a situação em análise é peculiar: não se trata de irresignação da parte recorrente quanto a eventual constatação de intempestividade de seu recurso, mas sim de inconformismo da recorrida pelo não reconhecimento da intempestividade do apelo nobre da parte adversa. E, para tanto, agravante firma-se em premissa de fato manifestamente contrária àquela certificada pela Corte local, sem que existam, nos autos, elementos que corroborem sua alegação.
Em verdade, a recorrente apenas colacionou prints de telas no próprio corpo da petição, sem anexar quaisquer certidões formais, emitidas na origem, contendo a data de intimação da Fazenda Pública, sendo certo que, nos autos, há apenas a certidão atestando a ciência do ente público em 26/4/2022.
Nesse sentido, tendo-se em vista que o STJ firmou a compreensão de que o mero print de sites da internet não é suficiente para comprovar a tempestividade do apelo nobre, por coerência lógica, a mesma conclusão deve ser aplicada para a pretensão inversa, isto é, para o pretendido reconhecimento da intempestividade recursal, mormente em se tratando de postulação contrária a premissa contida em certidão que goza de presunção relativa de veracidade.
TERCEIRA TURMA
Compartilhe:
Processo
REsp 2.125.599-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 3/6/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Sessão de julgamento virtual assíncrona. Realização durante o recesso forense. Sustentação oral. Garantia de atuação dos advogados. Inviabilização. Nulidade processual.
Destaque
A realização de sessão de julgamento virtual assíncrona durante o recesso forense é nula, por violar o direito de defesa e a garantia de suspensão dos prazos processuais.
Informações do Inteiro Teor
A discussão consiste em definir se há nulidade processual na realização de sessões de julgamento assíncrono durante o recesso forense, e em razão da não viabilização de sustentação oral em sessão de julgamento presencial.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assenta-se no sentido de que inexiste hierarquia entre as modalidades de julgamento, presencial ou em ambiente virtual.
Atualmente, nas Cortes Superiores, ações e recursos de alta complexidade, a exemplo de recursos especiais, recursos extraordinários e demandas de controle concentrado de constitucionalidade, têm sido julgadas com o devido zelo e eficiência em ambiente virtual. Desse modo, a objeção acerca da modalidade eleita pelo relator, bem como o não deferimento de destaque aos recursos a fim de possibilitar o exercício de sustentação oral em julgamento presencial, não caracteriza cerceamento do direito de defesa da parte.
O julgamento na modalidade virtual assíncrona e o indeferimento de sustentação oral na modalidade presencial não acarretam, por si só, nulidade processual.
No entanto, a realização de sessões de julgamento durante o recesso forense viola o art. 220, § 2º, do Código de Processo Civil, que prevê a suspensão dos prazos processuais e a vedação de audiências e sessões de julgamento nesse período. Com efeito, durante o período de recesso forense só é permitida a prática de atos que independem da atividade dos advogados.
A modalidade de julgamento virtual não afasta a garantia de participação das partes da solenidade, de modo que sua realização durante o recesso forense prejudica o exercício do direito de defesa dos interesses das partes, na medida em que fere legítima expectativa quanto à ausência de atividade que demande atuação do procurador.
Dessa forma, a observância da suspensão do curso dos prazos processuais e a vedação de realização de audiência e sessões de julgamento consistem em garantia das partes e seus procuradores para que, em período limitado do ano, pré-estabelecido, quando ausente hipótese de urgência ou excepcionalidade diante da natureza da ação, estejam desobrigadas da vigilância constante necessária a boa atuação.
Na hipótese, o prejuízo restou caracterizado com a impossibilidade do pleno exercício de defesa, a exemplo do envio de memoriais em prazo hábil ou envio de sustentação oral ao julgamento virtual, além do próprio resultado desfavorável.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Civil (CPC), art. 220, § 2º
QUARTA TURMA
Compartilhe:
Processo
RO 289-DF, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 28/4/2025, DJEN 6/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO DO CONSUMIDOR
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Passagem aérea cancelada. Emissão equivocada de passagem aérea. Reembolso. Estado estrangeiro contra empresa de turismo brasileira. Falha na prestação do serviço. Responsabilidade objetiva do fornecedor.
Destaque
A empresa de turismo é responsável pela falha na prestação do serviço ao emitir passagem em classe diversa da solicitada, devendo indenizar o consumidor pelos prejuízos decorrentes.
Informações do Inteiro Teor
Trata-se de ação de indenização movida por embaixada estrangeira contra empresa de turismo brasileira. No caso, a embaixada, por meio de seu representante diplomático, solicitou a cotação de uma passagem aérea de ida e volta do Brasil, em classe executiva. No entanto, após a compra, o bilhete de retorno foi emitido em classe econômica, sem qualquer aviso prévio, fato percebido apenas na conferência do horário do voo internacional. A embaixada destacou que, por motivos de segurança e protocolo diplomático, seus agentes e familiares somente realizam viagens aéreas em classe executiva, sendo-lhes vedado realizar voos em classe econômica, o que foi devidamente informado à empresa de turismo antes da compra.
Nos termos do art. 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o fornecedor de serviços responde objetivamente (ou seja, independentemente de culpa ou dolo) pela reparação dos danos suportados pelos consumidores, decorrentes da má prestação do serviço.
Além disso, o § 3º do referido dispositivo legal prevê que o fornecedor só não será responsabilizado quando provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Sendo que a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro deve ser cabalmente comprovada pelo fornecedor de serviços, a fim de romper o nexo de causalidade e, consequentemente, ilidir a sua responsabilidade objetiva.
Na hipótese, a embaixada solicitou a compra de passagem aérea, ida e volta do Brasil, em classe executiva, por questões de segurança e protocolo diplomático. Não obstante, o bilhete de volta foi emitido na classe econômica.
Nesse caso, a empresa de turismo tinha a obrigação de verificar se os bilhetes foram emitidos em conformidade com o solicitado pelo consumidor. Então, ela não cumpriu com essa obrigação e ocasionou o cancelamento da passagem, sujeitando a autora a adquirir novo bilhete em outra companhia aérea. Dessa forma, deve arcar com os prejuízos materiais sofridos.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Defesa do Consumidor (CDC), art. 14, capu t e § 3º.
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 842
Informativo de Jurisprudência n. 788
Compartilhe:
Processo
REsp 2.104.122-MG, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 20/5/2025, DJEN 28/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Bitcoins. Transferência indevida. Indenização. Uso de autenticação em dois fatores. Responsabilidade civil da plataforma de investimento em criptomoedas. Configuração.
Destaque
As plataformas destinadas às transações de criptomoedas respondem objetivamente por transação fraudulenta quando verificado que a transferência de bitcoins ocorreu mediante utilização de login, senha e autenticação de dois fatores.
Informações do Inteiro Teor
A controvérsia tem origem na ação de indenização ajuizada contra plataforma de investimentos em criptomoedas visando ao ressarcimento de valores por conta de transferência indevida de bitcoins e ao pagamento de indenização por danos morais, alegando-se falha no sistema de segurança da ré.
Entendeu o Tribunal de origem que (i) o desaparecimento dos bitcoins decorreu de culpa exclusiva do recorrente e de terceiros (hackers) e (ii) que a plataforma não teria apresentado falhas no seu sistema de segurança, sendo que o autor, ao negligenciar a proteção de seus dados pessoais, é que teria contribuído involuntariamente para a ocorrência da fraude.
Nesse contexto, note-se que o Superior Tribunal de Justiça entende que “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias” (Súmula 479 do STJ).
Portanto, a corretora de intermediação de compra e venda de criptomoedas é instituição financeira, constando, inclusive, da lista de instituições autorizadas, reguladas e supervisionadas pelo Banco Central do Brasil – BACEN (Lei n. 4.595/1964, art. 17).
Em se tratando de instituição financeira, em caso de fraude no âmbito de suas operações, a sua responsabilidade é objetiva, só podendo ser afastada se demonstrada causa excludente da referida responsabilidade, como culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, nos termos do art. 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor – CDC.
No caso, as operações na plataforma se dão por meio “de login, senha, número PIN e acesso a link de confirmação enviado por e-mail”, sendo que as transações somente são concluídas “caso o cliente confirme, no e-mail recebido, que realmente está ciente e de acordo com a transação, acessando o link correspondente”.
Note-se que, diante da forma como se dão as transações de bitcoins na plataforma, para afastar a responsabilidade da empresa pela transferência contestada, ela deveria demonstrar que o seu cliente atuou de maneira indevida em toda a cadeia necessária para conclusão da operação, ou seja, deveria demonstrar que ele fez login e inseriu senha e seu código PIN para transferir os bitcoins e, também, que confirmou esta específica operação por meio de link enviado pela recorrida por e-mail.
Na hipótese, a corretora não apresentou o e-mail de confirmação da transação, sendo que esta prova era indispensável para afastar a sua responsabilidade pelo desaparecimento das criptomoedas.
Ainda que se admitisse, contudo, que houve invasão por terceiros (hackers), não se trataria de fortuito externo apto a ensejar a exclusão de responsabilidade da instituição financeira.
Com efeito, se a plataforma não tem segurança adequada para combater ataques cibernéticos, a responsabilidade por isso é dela, e não dos seus clientes, usuários da plataforma.
Por fim, cabe destacar que, embora a jurisprudência do STJ afaste a responsabilização de instituições financeiras por saques indevidos, na hipótese de uso de cartão magnético e senha pessoal, no caso, diante da dinâmica da operação envolvendo bitcoins, que nem sequer envolve cartão, mas dupla autenticação, esse entendimento não se aplica.
Destarte, constatada a violação ao art. 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor, além do art. 373, caput, II e § 1º, do Código de Processo Civil, deve ser reconhecida a responsabilidade da corretora/plataforma pela transferência indevida de bitcoins no presente caso.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Defesa do Consumidor (CDC), art. 14, § 3º, II
Lei n. 4.595/1964, art. 17
Código de Processo Civil (CPC), art. 373, caput, II e § 1º.
Súmulas
Súmula n. 479/STJ.
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 719
Compartilhe:
Processo
REsp 2.183.714-SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 3/6/2025.
Ramo do Direito
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Tema
Saúde e Bem-Estar Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Recuperação judicial. Cooperativas médicas. Possibilidade. Alteração da Lei n. 11.101/2005 pela Lei n. 14.112/2020.
Destaque
As cooperativas médicas estão legitimadas, expressamente, por força de lei, a requerer o benefício da recuperação judicial.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia em saber se as cooperativas médicas podem se submeter ao regime de recuperação judicial, conforme a alteração promovida pela Lei n. 14.112/2020 na Lei n. 11.101/2005.
Registra-se que não há, na hipótese, antinomia (conflito aparente) entre regras jurídicas. A Lei n. 5.764/1971 é norma geral que define, de forma ampla, a política nacional de cooperativismo. Por sua vez, a Lei n. 11.101/2005 (Lei de Recuperação Judicial e Falências ) estabelece um regime jurídico especial para as sociedades que desenvolvem atividades empresariais e enfrentam dificuldades financeiras, com o objetivo de manter a viabilidade econômica delas, para, assim, superar a crise econômica.
Sendo certo que o regramento e a aplicação da Lei de Recuperação Judicial e Falências – LRJF, por expressa dicção legal (art. 2º), são excepcionados em apenas duas hipóteses literais.
E no caso, observa-se claramente do texto legal que as cooperativas médicas não estão nominalmente excluídas do regime recuperacional, visto que a exceção contida no art. 4º da Lei n. 5.764/1971 afasta tão-somente a possibilidade de decretação de falência. Mesmo nesse particular, relativo à vedação de sua submissão ao regime falimentar, é importante que ao intérprete não é dado realizar uma análise recortada da lei, visto que, conforme o método do diálogo das fontes, há de ser compreendido o sentido sistêmico da legislação em exame, porquanto o ordenamento jurídico é harmônico entre si.
Assim, verifica-se que o artigo 6º, § 13, da Lei n. 11.101/2005, é particularmente relevante ao afirmar que as sociedades cooperativas médicas estão sujeitas ao disposto na lei em foco. Esse dispositivo, incluído pela Lei n. 14.112 de 2020, dispõe apenas sobre os efeitos da recuperação judicial em relação aos contratos e às obrigações decorrentes dos atos cooperativos praticados pelas sociedades cooperativas em relação aos seus cooperados. E, na parte final do § 13, excepciona da vedação ao regime da recuperação judicial, a cooperativa médica operadora de plano de assistência à saúde.
A inclusão expressa das sociedades cooperativas no âmbito da Lei n. 11.101/2005, demonstra que o legislador reconheceu a importância de garantir a essas entidades a possibilidade de reestruturação financeira por meio da recuperação judicial. Esse entendimento é reforçado pelo fato de que as cooperativas médicas desempenham um papel social relevante, contribuindo para o acesso à saúde e para a sustentabilidade do sistema de saúde como um todo.
É importante dizer que a redação final do art. 6º, § 13, da Lei n. 11.101/2005, foi objeto de análise, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, ADI 7442/DF, em que foi declarada a constitucionalidade da inclusão das cooperativas médicas no regime de recuperação judicial, reforçando a legitimidade dessas entidades para requerer tal benefício.
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 11.101/2005, art. 2º e art. 6º, § 13
Lei n. 14.112/2020
Lei n. 5.764/1971
Precedentes Qualificados
ADI 7442/DF
QUINTA TURMA
Compartilhe:
Processo
AgRg no REsp 2.184.785-PR, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 14/4/2025, DJEN 24/4/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Contrabando de cigarro eletrônicos. Princípio da insignificância. Limite de 1.000 maços. Valor dos tributos iludidos. Irrelevância. Tema Repetitivo 1143. Não aplicação.
Destaque
- O limite de 1.000 maços estabelecido no Tema Repetitivo 1143 para a incidência do princípio da insignificância não se aplica aos cigarros eletrônicos.
- A excepcional aplicação do princípio da insignificância no delito de contrabando de cigarros não leva em consideração o valor dos tributos iludidos, parâmetro pertinente ao crime de descaminho.
Informações do Inteiro Teor
A questão consiste em saber se o princípio da insignificância é aplicável ao contrabando de cigarros eletrônicos, considerando a quantidade apreendida.
A Terceira Seção do STJ, no julgamento do Tema Repetitivo 1143, fixou a tese de que “o princípio da insignificância é aplicável ao crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar 1.000 (mil) maços, seja pela diminuta reprovabilidade da conduta, seja pela necessidade de se dar efetividade à repressão ao contrabando de vulto, excetuada a hipótese de reiteração da conduta, circunstância apta a indicar maior reprovabilidade e periculosidade social da ação”.
Esse novo entendimento levou em consideração dados estatísticos apresentados pelo Ministério Público Federal, em especial aqueles relativos ao ano de 2022, demonstrando que as apreensões de cigarros de até 1.000 maços são insignificantes diante do volume total de maços apreendidos, de maneira que a persecução penal nessas hipóteses seria ineficaz para a proteção dos bens jurídicos tutelados, além de não ser razoável do ponto de vista de política criminal e gestão de recursos.
No que diz respeito à quantidade de cigarros apreendidos, não se mostra cabível a consideração do limite de 1.000 maços previsto no referido Tema Repetitivo 1143 para a incidência do princípio da insignificância, visto que a hipótese em análise refere-se a 80 cigarros eletrônicos, os quais não se consomem com o uso, podendo um mesmo cigarro ser utilizado por diversos usuários e por período indeterminado, aumentando de forma considerável o perigo à saúde pública, especialmente porque tais produtos são de uso proibido no país.
Ademais, na excepcional aplicação do princípio da insignificância no delito de contrabando (art. 334-A do CP) de cigarros, não se questiona o valor dos tributos iludidos, sendo irrelevante o limite de R$ 20.000,00 estipulado para ajuizamento de execução fiscal, parâmetro pertinente ao crime de descaminho (art. 334 do CP).
Informações Adicionais
Legislação
Código Penal (CP), art. 334 e art. 334-A
Precedentes Qualificados
Tema Repetitivo 1143
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 21 – Edição Especial
Informativo de Jurisprudência n. 787
Informativo de Jurisprudência n. 635
Compartilhe:
Processo
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 21/5/2025, DJEN 27/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Instrução criminal. Resposta à acusação. Defesa que não teve acesso aos elementos de prova colhidos no inquérito. Nulidade processual. Reconhecimento.
Destaque
A falta de acesso da defesa aos elementos de prova colhidos na fase inquisitiva, antes do início da instrução criminal, configura nulidade processual por prejuízo à capacidade defensiva do réu.
Informações do Inteiro Teor
A questão consiste em saber se a falta de acesso da defesa aos elementos de prova colhidos na fase inquisitiva, antes do início da instrução criminal, configura nulidade processual, em razão de prejuízo à capacidade defensiva do réu.
Sobre o tema, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que a declaração de nulidade exige a comprovação de prejuízo, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief, consagrado no art. 563 do Código de Processo Penal.
No caso, a defesa postulou o acesso a todo o material desde o início da ação penal, mas ele só foi disponibilizado antes da apresentação das alegações finais, tendo os elementos de prova permanecido inacessíveis até então, daí porque o réu apontou a existência de prejuízo na elaboração da resposta à acusação.
Nota-se que o prejuízo à defesa é evidente, na medida em que, ao não lhe ter sido franqueado o exame, antes do início da instrução criminal dos dados colhidos na fase inquisitiva, mesmo tendo sido requerido o referido acesso, reduziu-se a capacidade defensiva de refutar a acusação e produzir contraprova, em evidente ofensa à paridade entre os sujeitos do processo.
Com efeito, a resposta à acusação apresentada não pode ser considerada adequada aos interesses do réu, se não foi dado acesso à íntegra dos documentos que subsidiaram a acusação e que poderiam influenciar, inclusive, no rol de testemunhas ou nas provas a serem requeridas ou, ainda, na apresentação de documentação que pudesse contribuir à defesa.
Nesse contexto, o feito é nulo desde a decisão que recebeu a denúncia, a fim de oportunizar à defesa a apresentação da resposta à acusação à luz dos elementos de prova agora disponíveis.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Penal (CPP), art. 563
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 784
Compartilhe:
Processo
AgRg no AREsp 2.704.728-MG, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 20/5/2025, DJEN 28/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tribunal do Júri. Debates orais. Quebra de incomunicabilidade. Uso prolongado de celular pelo jurado. Prejuízo presumido à defesa. Nulidade reconhecida.
Destaque
O uso prolongado de aparelho celular por jurado durante os debates orais compromete a imparcialidade e a independência dos julgadores leigos, configurando nulidade do julgamento.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia sobre a validade do julgamento pelo Tribunal do Júri em que um dos jurados utilizou aparelho celular durante a tréplica da defesa, circunstância que levou o Tribunal de origem a reconhecer a nulidade do feito por quebra da incomunicabilidade.
No caso, a defesa registrou imediatamente seu inconformismo, fazendo constar na ata de julgamento que: “Pela defesa, foi requerida a dissolução do Conselho de Sentença, ao fundamento que houve ofensa à incomunicabilidade dos jurados, na medida em que um dos jurados, segundo imagem captada pelo advogado, estaria a manusear o celular durante a sustentação em plenário da defesa (tréplica)”.
No que tange à necessidade de demonstração de prejuízo, embora seja regra geral no processo penal (art. 563 do CPP), a jurisprudência tem reconhecido que, em determinadas hipóteses, o prejuízo é presumido.
Ora, a filmagem realizada pela defesa constitui prova robusta da quebra da incomunicabilidade, não se tratando de mera alegação defensiva ou nulidade de algibeira. A incomunicabilidade dos jurados constitui garantia fundamental do Tribunal do Júri, diretamente relacionada à imparcialidade e à independência dos julgadores leigos, sendo o prejuízo presumido em casos de violação.
Como pontuou o Tribunal a quo, o jurado utilizou o aparelho celular “em momento significativo, em que as partes buscavam convencer os jurados acerca da procedência de suas razões”. O uso do telefone durante a tréplica da defesa evidencia não apenas possível comunicação externa, mas também desatenção a momento crucial dos debates, comprometendo a própria plenitude de defesa, garantia constitucional do Tribunal do Júri.
Ademais, é impossível aferir com precisão o conteúdo das eventuais comunicações realizadas pelo jurado através do celular, sendo razoável presumir que o acesso à internet ou a aplicativos de mensagens durante o julgamento pode ter influenciado sua convicção. A incomunicabilidade visa justamente preservar a formação do convencimento dos jurados com base exclusivamente nos elementos apresentados em plenário.
Por fim, embora a ata da sessão não registre manifestações sobre quebra de incomunicabilidade durante o julgamento, tal circunstância não invalida a prova videográfica produzida pela defesa, que demonstra de forma inequívoca o uso prolongado do celular pelo jurado durante o momento dos debates.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Penal (CPP), art. 563
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 630
Informativo de Jurisprudência n. 668
Jurisprudência em Teses / DIREITO PROCESSUAL PENAL – EDIÇÃO N. 78: TRIBUNAL DO JÚRI – II
Jurisprudência em Teses / DIREITO PROCESSUAL PENAL – EDIÇÃO N. 75: TRIBUNAL DO JÚRI – I
SEXTA TURMA
Compartilhe:
Processo
AREsp 2.313.729-SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 3/6/2025.
Ramo do Direito
DIREITO AMBIENTAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Crime ambiental. Art. 34 da Lei n. 9.605/1998. Pesca proibida. Parque estadual marinho criado por decreto estadual. Ausência de interesse da União. Não comprovação de dano ambiental regional ou nacional. Competência da Justiça Estadual.
Destaque
A simples localização do crime em mar territorial, bem pertencente à União, não atrai, por si só, a competência da Justiça Federal, sendo necessária a demonstração de que o dano ambiental gerou reflexos em âmbito regional ou nacional.
Informações do Inteiro Teor
De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o interesse da União que enseja o deslocamento da competência para a Justiça Federal para o julgamento de crime ambiental se caracteriza quando a área de preservação for criada por decreto federal.
No caso, o Parque Estadual Marinho da Laje de Santos é uma unidade de conservação criada pelo Estado de São Paulo, por meio do Decreto Estadual n. 37.537/1993, o que atrai a competência da Justiça Estadual para o julgamento do feito.
Além disso, quanto à espécie de peixe apreendida, o Tribunal de origem consignou que o peixe “Cioba” não consta na lista de espécies ameaçadas de extinção da Portaria MMA n. 445/2014, o que afasta o interesse da União sob tal fundamento.
Ademais, conforme também destacou o Tribunal a quo, os danos ambientais afetaram apenas a localidade em que a infração foi verificada, não havendo notícia de dano regional ou nacional aptos a vulnerar os interesses da União.
Com efeito, a simples localização do crime em mar territorial, bem pertencente à União, não atrai, por si só, a competência da Justiça Federal, sendo necessária a demonstração de que o dano ambiental gerou reflexos em âmbito regional ou nacional, o que não ocorreu no caso concreto.
Informações Adicionais
Legislação
Portaria MMA n. 445/2014
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 135
Informativo de Jurisprudência n. 848
Informativo de Jurisprudência n. 24 – Edição Especial
Compartilhe:
Processo
HC 857.566-PB, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 14/5/2025, DJEN 21/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Crime de parcelamento irregular de solo urbano. Regularização anterior à denúncia. Ausência de dolo. Atipicidade da conduta.
Destaque
A regularização do loteamento antes do oferecimento da denúncia afasta a tipicidade da conduta imputada, ante a ausência de dolo do agente.
Informações do Inteiro Teor
A questão consiste em saber se a regularização do loteamento antes do oferecimento da denúncia afasta a tipicidade da conduta imputada, com fundamento na ausência de dolo do investigado.
No caso, a regularização do loteamento é fato incontroverso, incluindo licenças e certidão de aprovação definitiva do parcelamento do solo urbano.
Com efeito, “Ao interpretar o artigo 50, inciso I, da Lei 6.766/1979, esta Corte Superior de Justiça firmou o entendimento de que se o loteamento é regularizado antes do oferecimento da denúncia, não se vislumbra a existência de dolo do agente, motivo pelo qual não há que se falar em crime”. (RHC 33.909/RJ, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 23/10/2013).
Dessa forma, a regularização do loteamento antes do oferecimento da denúncia é circunstância que afasta a tipicidade da conduta, ante a ausência de dolo, elemento subjetivo indispensável à caracterização do crime em tela.
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 6.766/1979, artigo 50, inciso I.
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 221
Compartilhe:
Processo
EDcl no HC 956.760-CE, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, por maioria, julgado em 20/5/2025, DJEN 28/5/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Tema
Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Prisão preventiva. Pedido de substituição por prisão domiciliar. Paciente mãe que exerce papel de destaque em organização criminosa. Ausência de demonstração da imprescindibilidade aos cuidados de filho adolescente. Não cabimento.
Destaque
Não é cabível a substituição da custódia cautelar por prisão domiciliar quando estiverem presentes indícios de que a custodiada exerce papel de destaque em organização criminosa de grande poderio econômico, bem como não tiver sido demonstrada a imprescindibilidade dos seus cuidados a filho adolescente.
Informações do Inteiro Teor
Sobre a concessão da prisão domiciliar, verifica-se que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Habeas Corpus coletivo n. 143.641/SP, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski, em 20/2/2018, concedeu comando geral para cumprimento do art. 318, V, do Código de Processo Penal, em sua redação atual.
A orientação da Suprema Corte é substituir a prisão preventiva pela domiciliar de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, nos termos do art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA e da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiências (Decreto Legislativo n. 186/2008 e Lei n. 13.146/2015), salvo as seguintes situações: crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício.
No caso, a Corte local consignou que não é possível a substituição da prisão preventiva por domiciliar, pois há indícios de que a paciente seja integrante de organização criminosa de grande poderio econômico, diretamente associada a integrantes da cúpula do PCC, voltada à execução de atividades ilícitas no Estado do Ceará, entre elas o tráfico de drogas, tráfico de armas, jogos de azar, lavagem de dinheiro e sonegação tributária.
Nesse contexto, constou que a paciente ocupa posição de “relevante liderança” no chamado “núcleo decisor”, em que se apresenta como uma das receptores finais de significativa parcela dos recursos auferidos com as atividades ilícitas do grupo e também uma das responsáveis por decidir os meandros das atividades operacionalizadas pelos membros dos núcleos logísticos e financeiros, além de ser responsável por decidir sobre assuntos sensíveis à organização, entre eles o destino dos gastos dos recursos que são direcionados à sua pessoa, a quantidade de drogas a ser traficada e até mesmo o assassinato de pessoas.
Além disso, é importante destacar que o filho da paciente conta com 15 anos de idade e o relatório médico apresentado aponta que ele seguirá em monitorização clínica psiquiátrica e que há outros responsáveis que podem manter a vigilância.
Ainda que assim não fosse, eventual análise da situação particular do filho da paciente deverá ser precedida de perícia determinada pelo juízo, não se podendo acolher, de plano, apenas a conclusão do relatório médico produzido pela própria parte interessada.
Assim, no caso, é inaplicável a substituição da custódia cautelar por prisão domiciliar, por causa da presença de indícios de que a paciente é integrante de organização criminosa e exerce papel de destaque ou, ainda que superado esse ponto, por não ter sido demonstrada a imprescindibilidade dos cuidados específicos da mãe, dado que seu filho conta 15 anos de idade, e pela ausência de perícia médica que corrobore a conclusão do profissional particular.
Informações Adicionais
Doutrina
Habeas Corpus coletivo n. 143.641-SP/STF
Legislação
Código de Processo Penal (CPP), art. 318, V;
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), art. 2º;
Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiências (Decreto Legislativo n. 186/2008 e Lei n. 13.146/2015)
Saiba mais:
Informativo de Jurisprudência n. 765
Informativo de Jurisprudência n. 4 – Edição Especial