Titular comprovou uso indevido do documento e falsificação da assinatura
A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou sentença que garantiu a um morador de Campo Grande/MS o direito ao cancelamento de seu Cadastro de Pessoa Física (CPF), em razão do uso fraudulento por terceiros para abertura de uma empresa. A decisão também determinou à União que não seja efetuada cobrança de qualquer débito federal existente em relação ao fato.
Para o colegiado, ficou comprovado que o autor foi vítima de fraude, mediante uso indevido de seus documentos e falsificação de sua assinatura, conforme laudo de exame grafoscópico.
De acordo com os autos, o homem relatou que teve os documentos pessoais (carteira de identidade, CPF, título de eleitor e certificado de reservista) extraviados. A partir de então, passou a ter problemas com a criação ilegal de empresa individual em seu nome, que gerou irregularidades perante a Receita Federal. O uso indevido dos documentos foi registrado em boletim de ocorrência.
Em primeira instância, a Justiça Federal de Campo Grande havia condenado a União a anular o registro da firma individual junto à base de dados da Secretaria da Receita Federal; desvincular o CPF e o nome do autor de qualquer débito federal existente em relação à empresa criada; cancelar o número do documento do autor; e emitir nova numeração. O ente federal recorreu ao TRF3, sob o argumento de impossibilidade de cancelamento e de nova inscrição do CPF.
Ao analisar o processo, o desembargador federal relator Nery Júnior não acatou as alegações da União e ressaltou que Receita Federal é o órgão responsável pelo processamento do CPF e do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ).
“Conquanto a Instrução Normativa RFB nº 1042/2010 não tenha previsto expressamente a hipótese de cancelamento do número de inscrição no CPF e atribuição de novo número em caso de uso indevido por terceiros, o inciso IV, do seu artigo 30, prevê a situação por decisão judicial”, disse o magistrado.
O relator afirmou, ainda, que a decisão de primeiro grau está de acordo com o entendimento jurisprudencial do TRF3 em casos análogos.
Assim, a Terceira Turma, por maioria, manteve a condenação da União, determinando o cancelamento do documento, a emissão de nova inscrição e declaração de não haver débitos federais em nome do autor do processo referente à empresa criada por meio fraudulento.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. CADASTRO DE PESSOAS FÍSICAS – CPF. USO INDEVIDO POR TERCEIROS. CANCELAMENTO E EMISSÃO DE NOVA INSCRIÇÃO. POSSIBILIDADE. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO.
1. A Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB, subordinada ao Ministério da Economia, é o órgão responsável pelo processamento do Cadastro de Pessoas Físicas – CPF e do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ. Afasto, portanto, a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam alegada pela União.
2. In casu, restou comprovado que o autor foi vítima de fraude perpetrada por terceiros, mediante uso indevido de seus documentos e falsificação de sua assinatura, para abertura da empresa “Claudemir Figueiredo ME”, CNPJ 03.494.594/0001-2, conforme Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico).
3. A Instrução Normativa RFB nº 1005/2010, em vigor quando da propositura da demanda, prevê expressamente que, constatado vício na inscrição no CNPJ, o ato de concessão será nulo (art. 49). Assim, em face da comprovação do uso de fraude por terceiros para abertura da supracitada firma individual mercantil, de rigor o cancelamento do referido número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica. Pelo mesmo motivo, não há que se exigir do autor qualquer débito federal existente em relação a tal empresa.
4. No que tange ao número de inscrição do autor no Cadastro de Pessoas Físicas, conquanto a Instrução Normativa RFB nº 1042/2010, vigente à época do ajuizamento da presente ação, não tenha previsto expressamente a hipótese de cancelamento do número de inscrição no CPF e atribuição de novo número em caso de uso indevido por terceiros, o inciso IV, do seu artigo 30, prevê seu cancelamento por decisão judicial.
5. Esta Corte tem entendimento jurisprudencial no sentido da possibilidade de cancelamento e atribuição de novo número de inscrição no CPF em casos análogos aos dos autos. Precedentes.
6. Quanto a condenação da União ao pagamento de honorários de sucumbência, impende registrar que, no caso vertente, o autor foi assistido em juízo pela Defensoria Pública da União.
7. A Corte Especial do c. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1199715/RJ, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, sob a sistemática dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese jurídica: “Não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando ela atua contra pessoa jurídica de direito público integrante da mesma Fazenda Pública”.
8. Outrossim, dispõe a Súmula STJ nº 421: “Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença”.
9. Apelação e remessa oficial parcialmente providas.
Apelação Cível 0009830-61.2010.4.03.6000