Cancelamento de curso superior após processo seletivo enseja responsabilização da Administração por perda de chance

A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou provimento à apelação do Município de Itaituba (PA) e pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará (Cefet/PA), de sentença que julgou procedentes os pedidos de danos morais e materiais formulados por candidato aprovado em vestibular cujo curso foi cancelado antes do início das aulas.

O Cefet/PA imputou a responsabilidade do cancelamento do curso à omissão do Município de Itaituba/PA, que deixou de providenciar a infraestrutura, conforme o convênio firmado. Pediu ainda a redução da condenação ao dano moral por considerar excessivo.
O  Município de Itaituba/PA sustentou excludente de culpabilidade no caso concreto, porque o gestor da época já teria falecido, sendo que em momento algum o município agiu de forma omissiva. Argumenta ainda que a condenação em honorários não foi objeto do pedido da inicial e a condenação neste ponto estaria além do que foi pedido (extra petita).
Ao analisar o caso, o relator, juiz federal convocado Rafael Paulo Soares Pinto, destacou que a frustração decorrente do cancelamento de curso superior, após realização e aprovação do candidato em vestibular, causa considerável abalo psíquico, pela frustração da expectativa de conquistar melhor ocupação decorrente da qualificação superior, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de justiça (STJ) e do TRF1.
Asseverou que a frustração decorrente do cancelamento do curso se enquadra perfeitamente à teoria da perda de uma chance, que “visa à responsabilização do agente causador não de um dano emergente, tampouco de lucros cessantes, mas de algo intermediário entre um e outro, precisamente a perda da possibilidade de se buscar posição mais vantajosa que muito provavelmente se alcançaria, não fosse o ato ilícito praticado”.
Concluindo o voto, o magistrado constatou que a fixação de honorários de advogado é implícito ao pedido, e consequência lógica da sucumbência, mantendo a sentença também nesse ponto.
O recurso ficou assim ementado:

APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DO PARÁ – CEFET/PA. PROCESSO SELETIVO (VESTIBULAR). CURSO CANCELADO. INDENIZAÇÃO PELA PERDA DE UMA CHANCE. MUNICÍPIO. PERSONALIDADE JURÍDICA. DANO MORAL PRESUMIDO. HONORÁRIOS. PEDIDO IMPLÍCITO. SENTENÇA MANTIDA.

I. Configurada a hipótese de perda de uma chance, entendeu o STJ: “A teoria da perda de uma chance (perte d’une chance) visa à responsabilização do agente causador não de um dano emergente, tampouco de lucros cessantes, mas de algo intermediário entre um e outro, precisamente a perda da possibilidade de se buscar posição mais vantajosa que muito provavelmente se alcançaria, não fosse o ato ilícito praticado. Nesse passo, a perda de uma chance – desde que essa seja razoável, séria e real, e não somente fluida ou hipotética – é considerada uma lesão às justas expectativas frustradas do indivíduo, que, ao perseguir uma posição jurídica mais vantajosa, teve o curso normal dos acontecimentos interrompido por ato ilícito de terceiro” (REsp 1.190.180/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 22/11/2010).

II. A frustração decorrente do cancelamento do curso causa considerável abalo psíquico, na medida em que depositadas esperanças de, mediante a participação em curso de ensino superior, da conquista de emprego mais bem remunerado, o que reflete nas condições de vida de toda a família. Precedentes do TRF1.

III. Não prospera a alegação do Município de Itaituba de que o falecimento de seu prefeito acarretaria excludente de responsabilidade por motivo de força maior, uma vez que, evidentemente, a personalidade do Município não se confunde com a dos respectivos ocupantes de cargos eletivos.

IV. Na fixação do quantum indenizatório o julgador deve ter em mente que o valor, a um só tempo, tem de servir como punição ao faltoso e reparação ao lesado. (Dano moral indenização R$ 12.000,00 a ser pago por cada réu, totalizando R$ 24.000,00 e dano material correspondente à taxa de inscrição paga de R$ 50,00)

V. A fixação de honorários advocatícios, ainda que não requeridos explicitamente na inicial, não configura julgamento “ultra petita” porque os honorários de advogado integram o conteúdo implícito do pedido e se revelam consectários lógicos da sucumbência. Precedentes do STJ.

VI. Recursos de apelação aos quais se nega provimento.

O Colegiado negou provimento às apelações nos termos do voto do relator.
Processo 0000089-16.2005.4.01.3902

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