TRF1 nega provimento à apelação da UFMA e determina adequação do prédio acadêmico para acessibilidade de pessoas com deficiência

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou provimento à apelação interposta pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), mantendo a sentença que condenou a ré a adequar o edifício às condições de acessibilidade para aluna com deficiência, e fixou indenização por danos morais em R$ 20.900,00.

A autora, matriculada no curso de Ciências Biológicas, é portadora de tetraparesia, enfermidade em que os músculos dos quatro membros ficam fracos, necessitando de cadeira de rodas e andador para locomoção, e o prédio não tem rampas ou elevadores entre os pisos.

Defendeu a ré, na apelação, a aplicação da Teoria da Reserva do Possível, que é quando a atuação do Estado se subordina à existência de recursos públicos disponíveis, prezando pelo direito da maioria.

Sustentou que a condenação compromete o orçamento da universidade e invocou a separação dos Poderes, porque a definição de políticas públicas incumbe aos Poderes Executivo e Legislativo, e pediu provimento à apelação.

Analisando o processo, o relator, desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão, observou que a Constituição Federal de 1988, em diversas passagens, prestigia a inclusão social das pessoas com deficiência física e o dever do Estado à educação. Ressaltou também que as Leis 10.098/2000 (que trata do acesso inclusivo a edifícios públicos ou de uso coletivo) e 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) determinam que, no mínimo, um dos acessos no interior de uma edificação pública devera´ estar livre de barreiras à acessibilidade.

Dessa forma, prosseguiu o voto, “em que pese as disposições constitucionais e legais quanto à acessibilidade para pessoas com deficiência, a ré, ainda em 2018 (data da petição inicial) permanecia sem efetivamente cumpri-la”, sendo, portanto, legítima a intervenção do Judiciário para garantir a observância ao direito, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e TRF1.

Destacou o magistrado que as provas evidenciam ainda um contexto de permanente violação à dignidade da autora, configurando o dano moral in re ipsa, ou seja, sem necessidade de efetiva comprovação do sofrimento moral, porque decorre do próprio fato, sendo devida a indenização no valor estabelecido.

O recurso ficou assim ementado:

CONSTITUCIONAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. APELAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ADEQUAÇÃO DE PRÉDIO DE UNIVERSIDADE. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ACESSIBILIDADE. TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. VIOLAÇÃO SEPARAÇÃO DE PODERES. INOCORRÊNCIA. DANOS MORAIS.

1. Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente o pedido, para garantir o direito à acessibilidade, consubstanciada na obrigação de adequação do prédio universitário, e para condenar em indenização de danos morais.

2. Verifica-se dos autos que a autora, aluna matriculada no Curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Maranhão, é portadora de tetraparesia, necessitando do uso de cadeira de rodas e de aparelho andador para seu deslocamento. No prédio onde ocorrem as aulas do curso não há acessibilidade para pessoas com deficiência, inexistindo rampas ou plataformas elevadoras para o segundo e o terceiro pisos.

3. A autonomia universitária não impede o judiciário de intervir, quando demandado, em situações de graves violações a direitos fundamentais, por absoluta e injustificável omissão administrativa, já expressamente disciplinados pelo legislador como política pública de inclusão social e proteção da dignidade humana. Não prospera, portanto, a alegação de violação ao princípio da separação dos poderes.

4. Na fixação dos objetivos fundamentais da República, a Constituição destaca a construção de uma sociedade livre justa e solidária, a promoção do bem de todos e a redução das desigualdades sociais (art. 3º da CF/88). Nesse sentido, a Carta da República em diversas passagens prestigia a inclusão social das pessoas com deficiência física. De forma expressa, quando trata do tema da educação, dispõe, na linha desses objetivos, que o dever do Estado com a educação será efetivado com atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência e que o acesso aos níveis mais elevados do ensino e da pesquisa deverá observar a capacidade de cada um.

5. De outra parte, a Constituição Federal, ao tratar do tema da educação, insere o valor do pluralismo de ideias. O conceito de pluralismo deve abrigar a contribuição das pessoas com deficiência. Isso porque tal inclusão desenvolve sentimentos de alteridade e empatia.

6. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu protocolo facultativo foram incorporados na ordem nacional, sendo a primeira convenção com status constitucional.

7. O art. 11, II, da Lei n.º 10.098/2000 é expresso ao determinar que no mínimo um dos acessos ao interior da edificação pública deverá estar livre de barreiras arquitetônicas e de obstáculos que impeçam ou dificultem a acessibilidade de pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida. No mesmo sentido, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, Lei nº 13.146/2015 (art.3º, I; art. 28, XVI; art. 56).

8. Restou evidenciado, pelas provas trazidas aos autos, que a autora teve frustrada a expectativa gerada para a vida acadêmica diante do permanente quadro de violação aos direitos da dignidade humana, da isonomia, da inclusão social.

9. Em face do contexto de grave violação objetiva ao direito da personalidade, em que não é necessário comprovar a dor e sofrimento, pois decorrente do fato, resta configurando o chamado dano moral in re ipsa. Dessa forma, mantém-se o valor estabelecido em danos morais no valor de R$ 20.900,00 (vinte mil e novecentos reais), razoável e proporcional no caso concreto.

10. Honorários recursais nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, que ora se acrescem em 2% ao valor fixado na sentença para a verba de sucumbência.

11. Apelação desprovida.

Processo 1000559-97.2018.4.01.3700

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