Telefônica terá de indenizar atendente por vincular pausas para ir ao banheiro a remuneração

Segundo o processo, as pausas eram utilizadas como critério de pagamento de prêmio.

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Telefônica Brasil S.A., em Maringá (PR), a pagar R$ 5 mil de indenização por danos morais a uma atendente por utilizar programa de incentivo condicionado a restrição de pausas para ir ao banheiro. Além de serem contadas para fins remuneratórios, havia a divulgação de ranking pela empregadora. Para o órgão, a conduta da empresa violou a dignidade humana e os direitos mínimos trabalhistas da empregada.

Assédio

Na reclamação trabalhista, a atendente contou que a empresa dispunha de um Programa de Incentivo Variável (PIV) que, entre as variáveis, considerava as pausas dos empregados para banheiro. Segundo ela, havia um limite de cinco minutos diários que, se ultrapassado, gerava “fortes repreensões por parte do supervisor”, uma vez que o PIV deste era influenciado pelo desempenho da equipe. Afirmou ainda que também eram enviados e-mails, não individualizados, com relatórios de estouro de pausas para toda a equipe, o que gerava atritos, exclusão e assédio pela empresa.

Medida necessária

O juízo da 4ª Vara do Trabalho de Maringá (PR) deferiu a indenização. Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) excluiu o dano moral, sob o fundamento de que não configura assédio moral apenas a utilização do excesso de pausas, inclusive para idas ao banheiro, como critério para o pagamento de prêmio. A decisão diz ainda que o registro das pausas, inclusive para utilização do sanitário, não constitui motivo de constrangimento, por se tratar de medida necessária.

Lesão à dignidade

A relatora do recurso de revista da empresa, ministra Kátia Arruda, explicou que, conforme a jurisprudência majoritária no TST, a restrição ao uso de banheiro é abusiva quando considerada na aferição do desempenho para o fim de remuneração do trabalhador, uma vez que, segundo ela, a empresa impõe ao trabalhador o constrangimento de evitar as pausas a fim de não ter perda remuneratória, sistemática que pode resultar em danos à saúde.

Arruda ressaltou ainda que, pela vinculação das pausas, a perda de remuneração e pela divulgação do ranking de pausas para conhecimento dos colegas do trabalho, não há como se concluir que o controle das pausas se tratava de mera organização administrativa e que tais restrições configuram lesão à integridade do empregado e ofensa à sua dignidade.

O recurso ficou assim ementado:

I – AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMANTE. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. LEI N.º 13.467/2017.

PRELIMINAR DE NULIDADE DO DESPACHO DENEGATÓRIO POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA

1 – O juízo primeiro de admissibilidade do recurso de revista exercido no TRT está previsto no §1º do art. 896 da CLT, de modo que não há cerceamento ao direito de defesa quando o recurso é denegado em decorrência do não preenchimento de pressupostos extrínsecos ou intrínsecos.

2 – Por outro lado, também não prospera a alegação de que a decisão agravada foi omissa e incorreu em negativa de prestação jurisdicional. Com efeito, o despacho denegatório foi proferido após a vigência da Instrução Normativa n.º 40/2016 do TST, de modo que, se a parte entendia que havia omissão, caberia a oposição de embargos de declaração, sob pena de preclusão, procedimento não observado. Ademais, o TRT não se absteve de exercer controle de admissibilidade do tema objeto do recurso de revista (IN nº 40/2016, §2º) e apresentou o fundamento no qual se baseou para denegar-lhe seguimento.

3 – Agravo de instrumento a que se nega provimento.

PROGRAMA DE INCENTIVO VARIÁVEL (PIV). INTEGRAÇÃO. HABITUALIDADE NÃO COMPROVADA. NÃO PREENCHIDO REQUISITO DO ART. 896, § 1º-A, DA CLT.

1 – No caso, nas razões de recurso de revista, a parte transcreve trecho do acórdão recorrido que não contém todos os fundamentos de fato e de direito consignados pelo Regional ao decidir a matéria, como a falta de prova de que a parcela PIV era paga com habitualidade.

2 – Desse modo, além de não atender ao requisito do art. 896, § 1º-A, I, da CLT, a parte não consegue demonstrar, de forma analítica, em que sentido tal decisão teria afrontado os dispositivos indicados e as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, em desatendimento também do art. 896, §§ 1º-A, III, e 8º, da CLT.

3 – A Sexta Turma evoluiu para o entendimento de que, uma vez não atendidas as exigências da Lei nº 13.015/2014, fica prejudicada a análise da transcendência.

4 – Agravo de instrumento a que se nega provimento.

DANO MORAL. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA NÃO COMPROVADA

1 – Conforme o trecho transcrito pela parte, esta deveria comprovar sua inaptidão laboral no momento da dispensa a fim de invalidar o laudo pericial, o que não ocorreu. Segundo o TRT, as provas dos autos não demonstram a alegada dispensa discriminatória, sendo que o simples fato de a demissão ter ocorrido alguns meses após o afastamento previdenciário não faz presumir a ocorrência de discriminação.

2 – No trecho transcrito não consta a delimitação de qual doença teria sofrido a reclamante, mas apenas as afirmações do TRT de que a moléstia não se enquadraria na hipótese da Súmula n.º 443 do TST e de que a reclamante não estaria doente ao tempo da dispensa.

3 – Para que esta Corte pudesse decidir de forma contrária, seria necessário o reexame de fatos e provas; procedimento inviável, ante o óbice da Súmula n.º 126 do TST.

4 – A Sexta Turma evoluiu para o entendimento de que fica prejudicada a análise da transcendência na hipótese de incidência da Súmula nº 126 do TST.

5 – Agravo de instrumento a que se nega provimento.

DOENÇA OCUPACIONAL. NEXO CONCAUSAL. NÃO PREENCHIDO REQUISITO DO ART. 896, § 1º-A, DA CLT.

1 – No que tange à alegação de violação dos arts. 93, IX, da CF, 832 da CLT e 489, caput e II, do CPC (negativa de prestação jurisdicional), não está demonstrada a viabilidade do conhecimento do recurso de revista, por não atender ao requisito exigido no art. 896, § 1º-A, IV, da CLT.

2 – Quanto aos demais dispositivos, em que pese a parte ter indicado trechos da decisão recorrida, para fins de demonstração do prequestionamento, deixou de preencher os demais requisitos de admissibilidade constantes do art. 896, § 1º-A, II e III, da CLT, o que impede o conhecimento do recurso de revista. A parte, em suas razões de recurso de revista, indica, em bloco, os artigos que entendeu estarem violados, sem, contudo, fazer o devido cotejo analítico de cada um deles com os fundamentos assentados no acórdão do Regional.

3 – A Sexta Turma evoluiu para o entendimento de que, uma vez não atendida a exigência da Lei nº 13.015/2014, fica prejudicada a análise da transcendência.

4 – Agravo de instrumento a que se nega provimento.

DANOS MORAIS. ASSÉDIO MORAL. RESTRIÇÃO DE PAUSAS.

1 – Há transcendência política no recurso de revista interposto quando se constata o desrespeito da instância recorrida à jurisprudência desta Corte.

2 – Aconselhável o provimento do agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista, em razão da provável violação do art. 5º, X, da CF.

3 – Agravo de instrumento a que se dá provimento.

II – RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/2017. RECLAMANTE. DANOS MORAIS. ASSÉDIO MORAL. RESTRIÇÃO DE PAUSAS.

1 – O poder diretivo autoriza o empregador a introduzir técnicas de incentivo à produção e fiscalização dos empregados, no entanto, tais mecanismos não podem violar a dignidade humana e os direitos mínimos trabalhistas. A NR-17, anexo II, item 5.7, do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, ao tratar da organização do trabalho para as atividades de teleatendimento/telemarketing, dispõe que: ” com o fim de permitir a satisfação das necessidades fisiológicas, as empresas devem permitir que os operadores saiam de seus postos de trabalho a qualquer momento da jornada, sem repercussão sobre suas avaliações e remunerações .”

2 – Conforme a jurisprudência majoritária no TST, a restrição ao uso de banheiro é abusiva quando considerada na aferição do desempenho para o fim de remuneração do trabalhador. Não se trata de reconhecimento automático de danos morais pelo descumprimento da NR-17, anexo II, item 5.7, do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE. Trata-se de inequívoca lesão à integridade psicobiofísica resultante do controle indireto, porém efetivo, por meio do qual a empresa impõe ao trabalhador o constrangimento de evitar as pausas a fim de não ter perda remuneratória, sistemática que pode resultar em danos à saúde. Há situações em que as pausas para ida a banheiro simplesmente não podem ser programadas nem pelo próprio trabalhador.

3 – No caso concreto, consta no acórdão recorrido, trecho transcrito no recurso de revista, que as provas demonstraram que as pausas dos empregados eram utilizadas como critério de pagamento do PIV, inclusive com divulgação interna das pausas em geral. Em situações similares há julgados desta Corte Superior reconhecendo os danos morais.

4 – Diferentemente do que entendeu o TRT, havendo o controle indireto e efetivo das pausas por meio da imposição de perda remuneratória, não é decisivo para o desfecho da lide que a prova dos autos tenha demonstrado que não havia ordem expressa de proibição ou de restrição de idas ao banheiro. Com efeito, o próprio sistema de vinculação de pausas a perda de remuneração já inibe de forma inequívoca as idas ao banheiro. Mais grave ainda, havia a própria divulgação do ranking de pausas para conhecimento dos colegas de trabalho. Nesse contexto, não há como se concluir que o controle das pausas se tratava de mera organização administrativa para que o atendimento pudesse ocorrer de forma regular, considerando a quantidade de trabalhadores, eventuais picos de acúmulo, etc.

5 – Embora a pretensão da parte seja receber indenização no valor de R$ 30.000,00, levando-se em conta o princípio da proporcionalidade, diante das premissas fáticas registradas no acórdão recorrido, deve ser fixado o montante da indenização por danos morais em R$ 5.000,00.

6 – Recurso de revista de que se conhece e a que se dá parcial provimento.

A decisão foi unânime.

Processo: RRAg-46-73.2017.5.09.0662

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