A 8ª Turma confirmou o entendimento de que ele se enquadra na Lei Pelé.
A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que um supervisor técnico do América Futebol Clube, de Belo Horizonte (MG), não tem direito ao recebimento de horas extras e adicional noturno pelo período em que ficava concentrado com a equipe. Segundo o colegiado, as disposições da Lei Pelé (Lei 9.615/1998) relativas à jornada se aplicam, também, aos integrantes de comissão técnica.
Tarefas administrativas
Na reclamação trabalhista, o profissional disse que desempenhou as funções de supervisor técnico durante quase 16 anos. Entre as suas funções estava cuidar dos preparativos para as viagens do time, como reserva de passagens e hotéis. Também supervisionava os locais de treinamento e o material utilizado a acompanhava os treinamentos e os jogos, além de se concentrar com a equipe antes das partidas.
Segundo ele, não fazia parte da comissão técnica, pois não participava da preparação física dos atletas. Suas tarefas eram administrativas, e sua função era fazer a ligação entre a diretoria e a comissão. Pedia, assim, a integração dos “bichos” pelos resultados atingidos, o pagamento de horas extras e à disposição relativos ao tempo de concentração e ao trabalho em domingos e feriados trabalhados e adicional noturno.
Comissão técnica
O juízo da 41ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte deferiu apenas parcialmente os pedidos, por entender que o supervisor integrava a comissão técnica do América. De acordo com a sentença, ele se submetia a toda rotina de um clube de futebol, o que fazia incidir sobre seu contrato de trabalho a previsão contida no artigo 28, parágrafo 4º, da Lei Pelé.
Concentração
De acordo com o dispositivo, os períodos de concentração, viagens, pré-temporada e participação em partidas não se incluem no cômputo da jornada de trabalho, que obedece o limite semanal de 44 horas, com acréscimo remuneratório conforme previsão contratual. Também estabelece que a concentração não pode ser superior a três dias consecutivos por semana.
No caso do América, a agenda do clube era de dois jogos por semana em média, o que levou o juízo a concluir que o supervisor ficava concentrado durante três dias por semana e tinha, ainda, uma folga semanal.
O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) manteve a sentença.
Aplicação imediata
A relatora do recurso de revista do supervisor, ministra Dora Maria da Costa, destacou que a Lei 12.395/2011, ao alterar a Lei Pelé, estendeu sua aplicabilidade aos integrantes da comissão técnica e da área de saúde que tiverem vínculo empregatício, como no caso. A alteração tem aplicação imediata, ressalvando-se apenas o direito adquirido anteriormente à sua vigência. No caso, as pretensões do supervisor diziam respeito a fatos ocorridos já na vigência da nova lei.
O recurso ficou assim ementado:
A) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. 1. NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. A questão supostamente omitida no julgado ostenta caráter estritamente jurídico, o que inviabiliza eventual acolhimento da apregoada nulidade, pois a simples oposição de embargos de declaração induz o prequestionamento ficto da matéria jurídica invocada, autorizando o seu imediato enfrentamento nesta esfera recursal, à luz da Súmula nº 297, III, desta Corte. Inteligência do art. 794 da CLT. NULIDADE PROCESSUAL POR CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE OITIVA DA TERCEIRA TESTEMUNHA. NÃO CONFIGURAÇÃO. O indeferimento de provas inúteis ou desnecessárias denota mera prerrogativa do magistrado no exercício do seu mister, segundo a disciplina contida no art. 765 da CLT. No caso, como bem assinalado pelo Regional, revelou-se desnecessária a oitiva da terceira testemunha do reclamante para depor sobre as mesmas questões acerca da jornada de trabalho, que já haviam sido amplamente esclarecidas nos extensos depoimentos de outras duas testemunhas ouvidas a rogo do reclamante, razão pela qual não se divisa ofensa às garantias constitucionais positivadas nos incisos LIV e LV do artigo 5º da Carta Magna. 3. HORAS EXTRAS. ARTIGOS 28, § 4º, III, E 90-E DA LEI Nº 9.615/1998 (LEI PELÉ). Consoante se depreende do acórdão regional, por força da previsão do artigo 90-E da Lei nº 9.615/1998, o Tribunal de origem reputou aplicável ao reclamante o art. 28, § 4º, da referida norma, cuja previsão não viola as garantias mínimas asseguradas constitucionalmente. 4. SUPRESSÃO DE SALÁRIO EXTRAFOLHA. No caso, não se divisa violação dos arts. 7º, VI, da CF e 468 da CLT, porquanto insubsistente a alegação de supressão do salário extrafolha e a apregoada redução salarial, ao revés, o quadro fático delineado no acórdão regional revelou que, a partir de junho de 2013, houve a regularização contábil e a cessação da prática do pagamento “por fora”, com a inclusão do valor no contracheque do reclamante. Agravo de instrumento conhecido e não provido. B) RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. 1. NULIDADE DA SENTENÇA DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS. CONCESSÃO DE EFEITO MODIFICATIVO SEM INTIMAÇÃO PRÉVIA DA PARTE CONTRÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO. NÃO CONFIGURAÇÃO. Segundo a regra estabelecida no art. 794 da CLT, só haverá nulidade quando resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes, o que não foi identificado na hipótese dos autos. In casu, como bem salientado pelo Regional, embora o juízo primário tenha atribuído efeito modificativo aos embargos declaratórios sem a prévia intimação da parte contrária, o recorrente teve oportunidade de impugnar o referido vício e o objeto da modificação no recurso ordinário interposto, cujo efeito devolutivo em profundidade autoriza o exame integral de todas as questões pertinentes às matérias devolvidas à instância recursal ordinária, de modo que restou assegurado o contraditório e a ampla defesa. Nesse contexto, ante as peculiaridades do caso concreto, não se divisa contrariedade à OJ nº 142 da SDI-1 do TST nem violação dos dispositivos invocados. Recurso de revista não conhecido. 2. EMPREGADO INTEGRANTE DA COMISSÃO TÉCNICA. APLICABILIDADE DA LEI Nº 9.615/1998 (LEI PELÉ). Cinge-se a controvérsia em torno da aplicabilidade, ou não, da Lei nº 9.615/1998 (Lei Pelé) ao empregado integrante da comissão técnica. O Tribunal de origem reputou a Lei Pelé aplicável ao caso concreto, por força das alterações legislativas promovidas pela Lei nº 12.395/2011, a qual estabeleceu a aplicação da Lei Pelé aos integrantes da comissão técnica quando houver vínculo empregatício, pois a vigência da norma é anterior ao período laboral não prescrito. Logo, a pretensão controvertida se refere a situações fáticas ocorridas na vigência da referida norma. Ora, com efeito, considerando que as normas trabalhistas constituem verdadeiro instituto jurídico profissional, de natureza cogente, tem aplicabilidade imediata aos contratos de trabalho em curso, ressalvando-se apenas o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, o que não restou identificado no caso concreto. Recurso de revista conhecido e não provido.
A decisão foi unânime.
Processo: ARR-11219-56.2017.5.03.0179