Soldador de usina de açúcar é enquadrado como trabalhador urbano

O enquadramento depende da análise do caso, a partir das reais atribuições do trabalhador.

A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (SDI-1) enquadrou como trabalhador urbano um ajudante geral e soldador da usina de cana-de-açúcar São Martinho S.A. e da Temerfil – Técnica, Reparos, Funilaria e isolamentos Ltda., de Jaboticabal (SP). Com o enquadramento, a empresa deverá aplicar a ele as normas coletivas referentes ao Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Alimentação e Afins de Jaboticabal.

Atividade preponderante

A Sétima Turma do Tribunal, ao julgar recurso de revista do empregado contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) que o enquadrara como trabalhador urbano, considerou que ele trabalhava em empresa que desenvolvia atividade agroindustrial e aplicou a legislação dos trabalhadores rurais. Para a Turma, o enquadramento sindical é definido com base na atividade preponderante da empresa (artigo 570 da CLT), à exceção das categorias diferenciadas.

Parque industrial

Nos embargos à à SDI-1, a usina sustentou que o empregado desenvolvia a função de soldador no parque industrial e prestava serviços para uma usina de açúcar e álcool, que transforma cana-de-açúcar em produtos do gênero alimentício e combustível. Essa atividade, segundo a empresa, é preponderantemente industrial, por envolver transformação da matéria-prima.

Caso a caso

O relator dos embargos , ministro Breno Medeiros, observou que a Orientação Jurisprudencial (OJ) 419 da SDI-1, que determinava o enquadramento, como rurícola, do empregado de empresa agroindustrial, a despeito da atividade exercida, foi cancelada em 2015. Com isso, o TST vem firmando o entendimento de que é relevante a análise das funções exercidas pelo trabalhador para definição do enquadramento do contrato de trabalho como rural ou urbano. “Na hipótese, o empregado exercia as atribuições de ajudante geral e soldador, enquadrando-se como trabalhador urbano”, concluiu.

O recurso teve a sua ementa original da seguinte forma:

I. RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE NÃO REGIDO PELA LEI 13.015/2014. 1. UNICIDADE CONTRATUAL. PRESCRIÇÃO BIENAL . VIOLAÇÃO DE LEI (SÚMULA 126/TST). DISSENSO JURISPRUDENCIAL (SÚMULA 296, I, DO TST). O Tribunal Regional do Trabalho, soberano na análise do substrato fático-probatório dos autos, consignou que no período de 08/3/1982 a 19/10/1984 o Reclamante laborou para a primeira Reclamada (TEMERFIL). Assentou que, nesse lapso temporal, a prestação de serviços para a segunda Reclamada (Usina São Martinho S/A) ocorreu mediante contrato civil de intermediação de mão de obra firmado entre as Reclamadas (terceirização lícita) . Consta do acórdão regional, ainda, que: ” A segunda reclamada foi contratada pela primeira para prestar serviços de funilaria e isolamento, tendo o reclamante deixado, neste período de trabalhar em atividades de corte e carpa de cana para exercer as atribuições de ajudante geral, atinentes ao objeto societário da primeira ré. Posteriormente, foi novamente contratado pela segunda reclamada, exercendo a função de ajudante geral e soldador (22/10/1984 a 01/04/2005).” Assentou mais que: Tendo havido terceirização lícita não há que se falar em sucessão de empregadores, tendo em vista que restou improvado o fato de a segunda reclamada ter adquirido a primeira e posteriormente ter novamente retornado ao comando da usina.” Por fim, concluiu pela inexistência de unicidade contratual no período indicado, declarando a prescrição bienal, mediante os seguintes fundamentos: “Por efeito, irretorquível a decisão que declarou prescritos os contratos firmados nos períodos de 16/07/1977 a 05/03/1982 (segunda reclamada) e de 08/03/1982 a 19/10/1984 (primeira reclamada) tendo em vista que a presente ação foi proposta em 05/05/2005, face a incidência da prescrição bienal.” . Em se tratando de questões afetas ao conjunto fático-probatório dos autos, cuja análise esgota-se nas instâncias ordinárias, não há como se concluir pelas violações apontadas, em relação à ilicitude da terceirização, formação de vínculo de emprego com o tomador dos serviços (segunda Reclamada), bem assim quanto a observância do prazo de 6 meses entre os contratos, a fim de atrair a incidência das disposições do artigo 452 da CLT, ante o óbice da Súmula 126/TST. Tampouco há que se perquirir acerca de eventual dissenso jurisprudencial, ante a inespecificidade dos arestos apresentados ao cotejo de teses (óbice da Súmula 296, I, do TST). Recurso de revista não conhecido 2.USINA DE CANA-DE-AÇÚCAR. ENQUADRAMENTO SINDICAL DO TRABALHADOR (URBANO OU RURAL). CRITÉRIO DA ATIVIDADE PREPONDERANTE DO EMPREGADOR. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 581, § 2º, DA CLT. É pacífico o entendimento de que o enquadramento sindical é definido com base na atividade preponderante da empresa (art. 570 da CLT), excepcionada a situação dos empregados vinculados às categorias diferenciadas . Na presente situação, está assente que as Reclamadas são pessoas jurídicas que exploram atividade agroindustrial, bem assim que o Reclamante prestava serviços em propriedade rural durante o período não abrangido pela prescrição bienal . Conforme dispõem os incisos I e II do § 4° do art. 2° do Decreto 73.626/74 (regulamento das relações individuais e coletivas de trabalho rural), o processo de industrialização da cana de açúcar, enquanto matéria prima para obtenção do álcool ou açúcar, é atividade típica rural. Dessarte, no aspecto, merece reparos o acórdão regional. Caracterizada violação do artigo 581, § 2º, da CLT. Ressalva de entendimento. Recurso de revista conhecido e provido. 3. PRESCRIÇÃO. RURÍCOLA. EMENDA CONSTITUCIONAL 28/2000. OFENSA AO ARTIGO 7º, XXIX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 417 DA SBDI-1/TST. Definido o enquadramento do Reclamante como rurícola, incide à situação a diretriz da OJ 417 da SBDI-1, do seguinte teor: “Não há prescrição total ou parcial da pretensão do trabalhador rural que reclama direitos relativos a contrato de trabalho que se encontrava em curso à época da promulgação da Emenda Constitucional n.º 28, de 26.05.2000, desde que ajuizada a demanda no prazo de cinco anos de sua publicação, observada a prescrição bienal . ” O Tribunal Regional do Trabalho consignou que o Reclamante foi dispensado em 1º/4/2005. No caso dos autos, à época da edição da Emenda Constitucional 28, em 26/5/2000, o contrato de trabalho obreiro encontrava-se em vigor. Dessa forma, com ajuizamento desta ação em 5/5/2005 (antes, portanto, de 26/5/2005), encontra-se observada a modulação prevista na Orientação Jurisprudencial transcrita, para fins de excepcionar a incidência da prescrição quinquenal ao contrato de trabalho do Reclamante. Ofensa ao artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal configurada . Prejudicada a análise dos demais temas do recurso de revista do Reclamante . Recurso de revista conhecido e provido.

II. RECURSO DE REVISTA DA SEGUNDA RECLAMADA NÃO REGIDO PELA LEI 13.015/14. Considerando o conhecimento e provimento do recurso de revista interposto pelo Reclamante, fica prejudicada a análise do recurso de revista da segunda Reclamada. Recurso de revista prejudicado.

O recurso de embargos ficou assim ementado:

RECURSO DE EMBARGOS EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. USINA DE CANA-DE-AÇÚCAR. EMPRESA AGROINDUSTRIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADOR COMO URBANO OU RURAL. ANÁLISE DA ATIVIDADE EXERCIDA PELO EMPREGADOR OU PELO EMPREGADO . CANCELAMENTO DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 419 DA SBDI-1 DO TST. Cinge-se a controvérsia a definir o critério de enquadramento do reclamante, que desenvolve suas atividades em empresa agroindustrial, na condição de trabalhador urbano ou rural. A c. Turma, partindo da premissa de que o reclamante laborava em empresa que desenvolvia atividade agroindustrial, aplicou a jurisprudência do TST no sentido de que ” o enquadramento sindical é definido com base na atividade preponderante da empresa (art. 570 da CLT), excepcionada a situação dos empregados vinculados às categorias diferenciadas “, considerando, assim, despicienda a análise da questão pelo prisma da atividade do empregado. A Orientação Jurisprudencial 419 da SBDI-1 do TST espelhava a diretriz de que ” Considera-se rurícola, a despeito da atividade exercida, empregado que presta serviços a empregador agroindustrial (art. 3º, § 1º, da Lei nº 5.889, de 08.06.1973), visto que, neste caso, é a atividade preponderante da empresa que determina o enquadramento “.

Tal verbete, no entanto, foi cancelado pela Res. 200/2015, DEJT divulgado em 29.10.2015 e 03 e 04.11.2015. Com o cancelamento da OJ nº 419 da SBDI-1, esta Corte superior vem firmando entendimento de que relevante a análise das funções exercidas pelo trabalhador, ainda que prestadas à empresa rural, que desenvolve atividade agroindustrial, para definição do enquadramento do contrato de trabalho como rural ou urbano, não invalidado o critério da atividade preponderante do empregador para o referido enquadramento, analisando-se a circunstância caso a caso. Precedentes. Na hipótese, o reclamante exercia as atribuições de ajudante geral e soldador, enquadrando-se como trabalhador urbano. Recurso de embargos conhecido e provido.

Com o provimento dos embargos, o processo retornou à Sétima Turma para o exame das demais matérias discutidas no recurso.

Processo: E-ED-RR-69800-34.2005.5.15.0120

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