Servidora que tomou posse amparada em decisão judicial não confirmada consegue manter aposentadoria

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu mandado de segurança para manter a aposentadoria de uma auditora fiscal do trabalho que havia sido nomeada para o cargo público com amparo em medida judicial precária.

O concurso prestado pela auditora teve duas etapas: provas e curso de formação. Não tendo sido considerada aprovada na primeira etapa, ela impetrou mandado de segurança e obteve liminar que lhe permitiu continuar na disputa e realizar a segunda etapa.

Terminado o curso de formação, ainda sob o amparo da liminar, foi ajuizada ação ordinária com pedido de nomeação para o cargo, que assegurou à candidata o direito de tomar posse. Ela exerceu o cargo por vários anos, até se aposentar.

Nomeação sem efeito

A sentença no mandado de segurança também foi favorável à servidora, mas, muito tempo depois da aposentadoria, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região deu provimento a recurso da União e cassou a decisão que havia permitido sua participação na segunda fase do concurso.

Após processo administrativo, foi editada portaria tornando sem efeito a nomeação para o cargo e, consequentemente, a aposentadoria. A auditora entrou no STJ com mandado de segurança contra o ato da administração.

O relator, ministro Herman Benjamin, esclareceu inicialmente que o êxito na ação ordinária não assegurou à fiscal o direito ao cargo, pois tal ação era dependente do resultado do mandado de segurança anterior, o qual buscava garantir a aprovação na primeira etapa do concurso. Como a decisão final no mandado de segurança foi desfavorável à servidora, considera-se que ela não foi aprovada, perdendo assim o direito de nomeação que havia buscado com a ação ordinária.

O ministro reconheceu também que o entendimento do STJ e do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que candidato nomeado com amparo em medida judicial precária não tem direito a permanecer no cargo se a decisão final lhe é desfavorável.

Tanto é assim, disse o ministro, que se ela ainda estivesse exercendo o cargo não haveria irregularidade no seu afastamento depois do trânsito em julgado da decisão judicial desfavorável sobre sua participação no concurso.

Situação excepcionalíssima

No entanto, observou Herman Benjamin, a aposentadoria da servidora constituiu situação excepcionalíssima.

“Embora o vínculo de trabalho fosse precário, o vínculo previdenciário, após as contribuições previdenciárias ao regime próprio, consolidou-se com a reunião dos requisitos para a concessão de aposentadoria”, explicou o ministro.

De acordo com Herman Benjamin, a legislação federal estabelece a cassação da aposentadoria apenas nos casos de demissão do servidor público e de acumulação ilegal de cargos (artigo 133, parágrafo 6º, e artigo 134 da Lei 8.112/90). Não há, portanto, respaldo legal para impor a mesma penalidade quando o exercício do cargo é amparado por decisões judiciais precárias e o servidor se aposenta por tempo de contribuição durante esse exercício após legítima contribuição ao sistema.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA PLEITEANDO PARTICIPAÇÃO NA SEGUNDA ETAPA. POSTERIOR AÇÃO ORDINÁRIA BUSCANDO NOMEAÇÃO. A DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA NO MANDADO DE SEGURANÇA PREJUDICA A PROCEDÊNCIA DA AÇÃO ORDINÁRIA. EXCEPCIONALIDADE DO CASO CONCRETO DIANTE DA APOSENTADORIA DA IMPETRANTE.
HISTÓRICO DA DEMANDA
1. A impetrante prestou concurso para o cargo de Fiscal do Trabalho, a ser realizado em duas etapas: provas e curso de formação. Não tendo sido considerada aprovada na primeira etapa, impetrou Mandado de Segurança em que obteve provimento que lhe permitiu continuar no concurso e realizar a segunda. Terminado o curso de formação, ingressou com Ação Ordinária pedindo a nomeação para o cargo, tendo obtido decisão favorável, exercido o cargo por vários anos e se aposentado. Todavia, o TRF da 3ª Região terminou por denegar a segurança, após o que, em seguida a processo administrativo em que lhe foi assegurado o direito ao contraditório e à ampla defesa, foi editada portaria tornando sem efeito sua nomeação para o cargo e, consequentemente, sua aposentadoria.
CANDIDATO NOMEADO PARA CARGO PÚBLICO COM AMPARO EM MEDIDA JUDICIAL PRECÁRIA NÃO TEM DIREITO A NELE PERMANECER SE A DECISÃO FINAL LHE É DESFAVORÁVEL
2. Ao contrário do que sustenta a impetrante, a existência da Ação Ordinária, que acabou por transitar em julgado favoravelmente a ela, não lhe asseguraria o direito de permanecer no cargo, pois esta Ação era dependente do resultado do Mandado de Segurança anterior, em que buscava sua aprovação no concurso.
3. Transitada em julgado a decisão desfavorável no Mandado de Segurança pela qual ela buscou realizar a 2ª etapa do concurso, considera-se que ela não foi aprovada, e perde o objeto a pretensão de nomeação tratada na Ação Ordinária.
4. O Supremo Tribunal Federal, em julgado realizado sob a égide da repercussão geral, deu pela inaplicabilidade da teoria do fato consumado para manutenção em cargo público de candidato não aprovado em concurso (STF, RE 608.482, Relator Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 7⁄8⁄2014, Repercussão Geral – Mérito, DJe-213 p. 30⁄10⁄2014).
5. Assim, se a impetrante estivesse exercendo o cargo, não haveria nenhuma irregularidade no seu afastamento deste depois do trânsito em julgado da decisão judicial desfavorável a ela que lhe permitiu prosseguir no concurso após a primeira etapa.
SITUAÇÃO EXCEPCIONALÍSSIMA DE CONSOLIDAÇÃO FÁTICO-JURÍDICA NO CASO CONCRETO – APOSENTADORIA.
6. Não obstante a compreensão acima exarada, constata-se que a impetrante, nomeada sob amparo de decisão judicial liminar, exerceu o cargo até o momento de sua aposentadoria, ocorrida vários anos antes da decisão final do Mandado de Segurança originalmente impetrado por ela para prosseguir no concurso.
7. Embora o vínculo de trabalho fosse precário, o vínculo previdenciário, após as contribuições previdenciárias ao regime próprio, consolidou-se com a reunião dos requisitos para a concessão de aposentadoria.
8. A legislação federal estabelece a cassação da aposentadoria apenas nos casos de demissão do servidor público e de acumulação ilegal de cargos (arts. 133, § 6º, e 134 da Lei 8.112⁄1990), não havendo, portanto, respaldo legal para impor a mesma penalização quando o exercício do cargo é amparado por decisões judiciais precárias e o servidor se aposenta por tempo de contribuição durante esse exercício após legítima contribuição ao sistema.
9. Precedente específico: MS 18.002⁄DF, relator Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 21⁄11⁄2016 (acórdão aguardando publicação)
CONCLUSÃO
10. Segurança parcialmente concedida para manter a aposentadoria da impetrante.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): MS 20558

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