Participação de petroleiro em reuniões de segurança contará como tempo à disposição do empregador

A empresa alegava aplicação de lei específica, mas o colegiado entendeu que a lei é omissa quanto à matéria

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Ensco do Brasil Petróleo e Gás Ltda. e a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) ao pagamento de horas extras a um petroleiro de Macaé (RJ) pelo tempo dedicado à participação obrigatória em reuniões de segurança e treinamentos de incêndio. Para o colegiado, a lei específica que rege o trabalho nas atividades de exploração de petróleo é omissa em relação ao tema, podendo-se aplicar ao caso norma da CLT.

Diálogos de Segurança

Na reclamação trabalhista, o petroleiro disse que os Diálogos Diários de Segurança (DDS) ocorriam antes do início da jornada e duravam 30 minutos. Também havia reuniões semanais de segurança, de uma hora e 40 minutos, e treinamentos de incêndio uma vez por semana, de uma hora, “dentro e fora da jornada”.

Com base no artigo 4º da CLT, que considera como de serviço efetivo o período em que o empregado está à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, ele pediu o pagamento de horas extras pelo tempo correspondente a essas atividades..

Diminuição de riscos

Em sua defesa, a Petrobras disse que os DDS são ministrados por seus empregados e servem para recordar os riscos inerentes à prospecção e à exploração de petróleo em alto mar. “Há uma espécie de palestra para tentar diminuir ao máximo possíveis acidentes causados pela desatenção de alguns colaboradores”, argumentou.

Ainda, conforme a Petrobras, o trabalho depois da jornada só é possível depois de autorizado pela empresa, “o que, caso tenha havido, deveria ter sido comprovado pelo petroleiro”.

Adicionais de embarque

Já a Ensco sustentou que havia convencionado com o sindicato dos empregados o pagamento de diversos “adicionais de embarque” (de periculosidade, noturno, de sobreaviso, de confinamento e de revezamento, entre outros), como contrapartida à especificidade do trabalho em plataformas. Segundo a empresa, a prática dos DDS é imposta por medida de segurança e faz parte do conjunto de peculiaridades do trabalho em regime offshore.

Trabalhador embarcado

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) indeferiram o pedido. Na interpretação do TRT, o  trabalhador  embarcado é regido pela Lei. 5.811/1972, e não pela CLT, e sua participação nas reuniões de segurança não poderia ser considerada como tempo à disposição do empregador. Trata-se, de acordo com a decisão, de etapas indispensáveis para dar início aos serviços e decorrem do regime especial a que estão submetidos os petroleiros.

CLT

Todavia, segundo o relator do recurso de revista das empresas, ministro Douglas Alencar Rodrigues, o tempo gasto pelo petroleiro na participação em diálogos diários e nas reuniões de segurança e nos treinamentos de incêndio deve, sim, configurar tempo à disposição do empregador. O ministro ressaltou que, apesar da relação jurídica entre as partes ser regida por norma especial, não há, na Lei. 5.811/1972, regra específica que exclua a participação em atividades voltadas à segurança do trabalho da duração da jornada diária do petroleiro. Nesse sentido, é viável a aplicação subsidiária da CLT naquilo em que for omissa a legislação específica.

Curso

O ministro lembrou que o TST tem admitido a adoção da CLT para assegurar direitos não tutelados expressamente pela lei dos petroleiros, como o intervalo interjornadas. Assinalou, ainda, que, com base no artigo 4º da CLT, que serviu para consolidar a jurisprudência do TST sobre a matéria, é considerado tempo à disposição do empregador o período em que o empregado participa de curso de aperfeiçoamento fora da jornada normal, ainda que este constitua requisito necessário para o exercício da profissão.

No caso, a participação do petroleiro nos DDSs tinha frequência e comparecimento obrigatórios e decorria diretamente de riscos inerentes à natureza da atividade empresarial, “que devem ser suportados pelo empregador”.

O recurso ficou assim ementado:

I. “AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ÓBICE DO ART. 896, § 1º-A, IV, DA CLT. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. Verifica-se o descumprimento da regra contida no art. 896, § 1º-A, IV, da CLT, segundo a qual cabe à parte, sob pena de não conhecimento, ” transcrever na peça recursal, no caso de suscitar preliminar de nulidade de julgado por negativa de prestação jurisdicional, o trecho dos embargos declaratórios em que foi pedido o pronunciamento do tribunal sobre questão veiculada no recurso ordinário e o trecho da decisão regional que rejeitou os embargos quanto ao pedido, para cotejo e verificação, de plano, da ocorrência da omissão “. Ressalte-se que esta Corte, interpretando o dispositivo, tem entendido ser indispensável, para a finalidade do cotejo e verificação da ocorrência da omissão mencionada no preceito legal, a transcrição também do v. acórdão que julgou o recurso principal, a fim de que se possa averiguar se as questões objeto da insurgência já haviam ou não sido enfrentadas quando do exame originário (Ag-AIRR – 10200-76.2013.5.01.0028, Rel. Min. Breno Medeiros, 5ª Turma, DEJT 21/9/2018;Ag-AIRR-1422-58.2014.5.10.0020, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 7ª Turma, DEJT 11/9/2017). Na hipótese, a parte agravante, apesar de transcrever, no recurso, os trechos do acórdão principal, da petição de embargos de declaração e do acórdão de embargos de declaração, o faz de maneira que inviabiliza o exame da preliminar, isso porque os trechos colacionados não trazem todos os fundamentos adotados pelo Tribunal de origem a fim de examinar a questão, o que impossibilita a averiguação por esta Corte quanto ao enfrentamento ou não das questões objeto da insurgência. Assevere-se que a maioria das Turmas desta Corte vem se posicionando no sentido de que existência de obstáculo processual apto a inviabilizar o exame da matéria de fundo veiculada, como no caso, acaba por evidenciar, em última análise, a própria ausência de transcendência do recurso de revista, em qualquer das suas modalidades. Isso porque não se justificaria a intervenção desta Corte superior a fim de examinar feito no qual não se estaria: a) prevenindo desrespeito à sua jurisprudência consolidada (transcendência política); b) fixando tese sobre questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista (transcendência jurídica); c) revendo valor excessivo de condenação, apto a ensejar o comprometimento da higidez financeira da empresa demandada ou de determinada categoria profissional (transcendência econômica); d) acolhendo pretensão recursal obreira que diga respeito a direito social assegurado na Constituição Federal, com plausibilidade na alegada ofensa a dispositivo nela contido (transcendência social). Precedentes de 5 Turmas do TST. Agravo de instrumento não provido. INTERVALO INTERJORNADAS. ÓBICE DA SÚMULA Nº 126 DESTE TST. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. O e. TRT, ao concluir que o reclamante não logrou demonstrar que fosse credor de alguma diferença a título das horas extras pleiteadas, o fez com base nos elementos de prova, cujo reexame é vedado nesta Corte, incidindo o óbice da Súmula nº 126 deste TST. Assevere-se que a maioria das Turmas desta Corte vem se posicionando no sentido de que existência de obstáculo processual apto a inviabilizar o exame da matéria de fundo veiculada, como no caso, acaba por evidenciar, em última análise, a própria ausência de transcendência do recurso de revista, em qualquer das suas modalidades. Isso porque não se justificaria a intervenção desta Corte superior a fim de examinar feito no qual não se estaria: a) prevenindo desrespeito à sua jurisprudência consolidada (transcendência política); b) fixando tese sobre questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista (transcendência jurídica); c) revendo valor excessivo de condenação, apto a ensejar o comprometimento da higidez financeira da empresa demandada ou de determinada categoria profissional (transcendência econômica); d) acolhendo pretensão recursal obreira que diga respeito a direito social assegurado na Constituição Federal, com plausibilidade na alegada ofensa a dispositivo nela contido (transcendência social). Precedentes de 5 Turmas do TST. Agravo de instrumento não provido” (Relator originário Ministro Breno Medeiros).

PETROLEIROS. LEI 5.811/72. PARTICIPAÇÃO NOS DIÁLOGOS DIÁRIOS DE SEGURANÇA, NAS REUNIÕES DE SEGURANÇA E NOS TREINAMENTOS DE INCÊNDIO. TEMPO A DISPOSIÇÃO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. De acordo com o artigo 896-A da CLT, o Tribunal Superior do Trabalho, no recurso de revista, deve examinar previamente se a causa oferece transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica. A controvérsia atinente à configuração, ou não, de tempo despendido pelo empregado petroleiro na participação em diálogos diários de segurança, nas reuniões de segurança e nos treinamentos de incêndio, envolve matéria ainda pouco debatida no âmbito dessa Corte Superior. Dessa forma, entendo que a matéria configura ” questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista “, nos termos do art. 896-A, IV, da CLT, razão pela qual reconheço a transcendência jurídica . 2. Deve ser provido o agravo de instrumento em face de possível violação do art. 4º da CLT . Agravo de instrumento conhecido e provido.

II. RECURSO DE REVISTA. PETROLEIROS. LEI 5.811/72. PARTICIPAÇÃO NOS DIÁLOGOS DIÁRIOS DE SEGURANÇA, NAS REUNIÕES DE SEGURANÇA E NOS TREINAMENTOS DE INCÊNDIO. TEMPO A DISPOSIÇÃO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA.

1. A controvérsia repousa em definir se o tempo despendido pelo empregado petroleiro na participação em diálogos diários de segurança, nas reuniões de segurança e nos treinamentos de incêndio configura, ou não, tempo a disposição do empregador. 2. Em que pese a relação jurídica entre as partes seja regida por norma especial, qual seja, a Lei 5.811/72, revela-se viável a aplicação subsidiária da CLT naquilo em que for omissa a legislação específica.

Analisando as disposições da Lei 5.811/72, não se constata a existência de regra específica que exclua a participação em atividades voltadas à segurança do trabalho da duração da jornada ordinária do empregado. Por tal razão, entende-se que a controvérsia deve ser dirimida à luz das normas gerais acerca da matéria. 3. Nos termos do disposto no art. 4º da CLT, “considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada” . Interpretando tal dispositivo, a jurisprudência desta Corte pacificou-se no sentido de que é considerado tempo à disposição do empregador o período em que o empregado participa de curso de aperfeiçoamento fora da jornada normal de trabalho, ainda que este constitua requisito necessário para o exercício da profissão. 4. Na hipótese dos autos, constata-se do acórdão regional que a participação do empregado em diálogos diários de segurança, nas reuniões de segurança e nos treinamentos de incêndio, era obrigatória e decorria diretamente de riscos inerentes à natureza da atividade empresarial. Tais riscos, nos termos do disposto no art. 2º, caput , da CLT, devem ser suportados pelo empregador. Não obstante, o Tribunal Regional considerou que “a participação do empregado nos DDS – diálogos diários de segurança, nas reuniões de segurança e nos treinamentos de incêndio, ainda que fora da jornada de trabalho, não pode ser considerada como tempo à disposição do empregador, tendo em vista que tais procedimentos tratam de medida de segurança, a qual todos os embarcados estão obrigados a cumprir. Essas atividades são etapas indispensáveis ao início da execução dos serviços e decorrem do regime especial a que estão submetidos os petroleiros” . 5. Dessa forma, ao considerar que durante atividades e treinamentos obrigatórios, relacionados à segurança do trabalho, essenciais em decorrência dos riscos da atividade empresarial, o empregado não se encontrava à disposição do empregador, o Tribunal Regional violou o disposto no art. 4º da CLT. Recurso de revista conhecido e provido.

Ficou vencido o ministro Breno Medeiros.

Processo: RR-11774-62.2015.5.01.0482

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar