A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que condenou a União a anular auto de infração imposto a taxista, autor do processo, que transportava três estrangeiros, nepaleses, de Rio Branco para Brasiléia (AC).
A União argumentou que a autuação era legal por ter o autor infringido o inciso VI do artigo 125 da Lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro), vigente à época, que pune quem transportar, para o Brasil, estrangeiro sem documentação em ordem. Sustentou ainda o fato de o autor não ter apresentado defesa administrativa ou comprovação de legalidade da conduta descrita no auto de infração, que tem presunção de legalidade.
Caso mantida a sentença, a União requer que seja afastada a condenação em honorários, porque o autor é representado pela Defensoria Pública, que seria órgão da própria União.
O relator, juiz federal convocado Roberto Carlos de Oliveira, observou que a ausência de defesa administrativa não significa concordância com a sanção imposta, dado o principio de inafastabilidade do Poder Judiciário, expresso no art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal (CF) e entendimento jurisprudencial da independência das instâncias judicial e administrativa.
Prossegue o relator ressaltando que não ficou demonstrado que o autor teria sido responsável pela entrada dos estrangeiros no território brasileiro, sendo mais certo que estivesse apenas fazendo o transporte entre Rio Branco e Brasiléia.
Destaca o magistrado que o dispositivo legal alegado pela União não impõe ao transportador a obrigação de exigir documentação a todo e qualquer estrangeiro que realiza deslocamentos internos no País, ressaltando que, nos termos da primeira parte do inciso XV do artigo 5º da Constituição, “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”.
Concluindo o voto, o relator manteve a condenação da União em honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública. Ainda que a discussão sobre a matéria esteja para ser decidida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não houve suspensão das decisões neste sentido e nem em contrário à fixação da verba, entendimento que vem sendo adotado pelo TRF1.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. AUTUAÇÃO. AUSÊNCIA DE DEFESA ADMINISTRATIVA. INTERESSE PROCESSUAL. INAFASTABILIADADE DA JURISDIÇÃO. TRANSPORTE DE ESTRANGEIROS SEM DOCUMENTAÇÃO DE PERMANÊNCIA. LEI Nº 6.815/80, VI (ESTATUDO DO ESTRANGEIRO). CONDUTA INFRACIONAL. INTRODUZIR ESTRANGEIRO NO TERRITÓRIO NACIONAL. HIPÓTESE DE TRANSPORTE INTERNO DE ESTRANGEIROS. IRREGULARIDADE DA MULTA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO DA UNIÃO EM FAVOR DA DPU. CABIMENTO. SENTENÇA CONFIRMADA.
1. “Em virtude dos princípios da independência das instâncias administrativa e judicial e da inafastabilidade da jurisdição, a ausência de pedido expresso na esfera administrativa não impede o ajuizamento da ação e a atuação do Poder Judiciário” (AgInt no AREsp 868.509/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 14/11/2017, DJe 20/11/2017).
2. A conduta infracional prevista no inciso VI da Lei nº 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro), vigente à época dos fatos, pune o transportador que “transportar para o Brasil estrangeiro que esteja sem documentação em ordem” e não a realização de transporte de estrangeiros, ainda que em possível situação irregular, dentro do território nacional.
3. Não cabe ao transportador, que realiza transporte de pessoas dentro do território nacional, exigir documentação a todo e qualquer estrangeiro que realiza deslocamentos internos no País, isso porque, nos termos da primeira parte do inciso XV do artigo 5º da Constituição, “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, (…)”.
4. Possibilidade de condenação da União em honorários advocatícios a favor da Defensoria Pública da União após a EC 80/2014, tendo em vista a autonomia funcional, administrativa e orçamentária da DPU. Precedentes do STF e deste Tribunal pelo menos até eventual entendimento em contrário, considerando a reabertura da discussão pelo STF no RE 1140005/RJ, submetido à repercussão geral.
5. Apelação a que se nega provimento.
6. Honorários advocatícios fixados na sentença majorados de R$ 1.000,00 (um mil reais) para R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
Processo: 0008725-72.2016.4.01.3000