Município de Americana recorreu da sentença da 2ª Vara do Trabalho daquela cidade, que deferiu verbas a um servidor dispensado. O Ente público alega que “a decisão de origem violou a Súmula Vinculante n.º 13 do Supremo Tribunal Federal, porque a dispensa do reclamante foi pautada em nepotismo, decorrendo inclusive de ordem judicial proferida nos autos da Ação Civil Pública”. O reclamante, que era ocupante de função comissionada na Prefeitura, é irmão do então prefeito de Americana. Por isso, o Município, que efetuou os depósitos de FGTS, alega que são “indevidas verbas rescisórias ou licença-prêmio”.
A relatora do acórdão da 4ª Câmara do TRT, juíza convocada Olga Regiane Pilegis, entendeu que, apesar da determinação do Supremo Tribunal Federal para a “suspensão de toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da Constituição Federal/1988, na redação dada pela EC nº45/2004, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a apreciação de causas que sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo”, é “inaplicável aquele entendimento ao caso”, uma vez que a relação havida entre as partes não decorreu de “regime especial”, ou de típica relação jurídico-administrativa.
O trabalhador foi contratado para ocupar cargo em comissão, e obteve anotações em CTPS, por toda a contratação. Também foram feitos depósitos fundiários em seu benefício e ele esteve vinculado ao Sistema Geral da Previdência Social, sendo que o instrumento de sua contratação igualmente previa regência pela Consolidação das Leis do Trabalho.
O inconformismo do Município volta-se contra a decisão que refutou a tese de nulidade contratual, fundamentando que o reclamado não poderia invocar a irregularidade por ele mesmo provocada (falta de concurso público), em detrimento do princípio constitucional da valorização social do trabalho. Esse princípio (artigo 1º, IV da Lei Maior) prevaleceria, segundo o entendimento do Juízo de origem, sobre as vedações do artigo 37, II daquela mesma Carta, tornando cabíveis “o pagamento de verbas rescisórias (13º salário e férias proporcionais), depósitos fundiários de toda a contratação (8%) e licença-prêmio em pecúnia”.
O acórdão considerou, por outro lado, que a decisão de primeiro grau, em tais termos, merece reforma. Segundo a decisão do colegiado, “não há nulidade contratual pela falta de submissão ao concurso de provas e títulos”, uma vez que o reclamante sempre atuou em função de confiança, o que foi comprovado nos autos, e que por isso, dispensa o requisito formal preconizado pelo artigo 37 inciso II da CF/1988, que excepciona do concurso “as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”. O acórdão afirmou, contudo, que “há nulidade – e grave – sob outro aspecto”.
Quando foi nomeado para ocupar a função de confiança, em 6 de abril de 2001, o irmão do autor ainda era o vice-prefeito da cidade. O prefeito, então, adoeceu, e o vice assumiu a partir de fevereiro de 2003 o cargo de prefeito. Tal situação já ensejou o decreto judicial de “nulidade dos atos de nomeação e de contratação” e outros, no bojo da Ação Civil Pública, ajuizada pelo Ministério Público Estadual, e por isso “já existe decisão judicial reconhecendo a nulidade dos atos de nomeação e contratação do reclamante, o que não pode ser revisto por esta Especializada”, afirmou o acórdão.
A razão da nulidade decretada se deve ao fato de os respectivos atos administrativos terem configurado a hipótese prescrita no artigo 11 inciso I, da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), “praticados com desvio de finalidade, distanciados do interesse público e com violação consciente dos deveres de impessoalidade, imparcialidade, moralidade e lealdade às instituições”.
Em 2 de setembro de 2008 o secretário dos negócios jurídicos do Município emitiu parecer sugerindo o afastamento dos ocupantes de cargos tidos por irregulares, por força não apenas daquela decisão da Justiça Comum Estadual, mas também em obediência ao comando da Súmula Vinculante nº 13 do STF. Em decorrência disso, em 5 de setembro de 2008, veio a ordem de desligamento do reclamante dos quadros da municipalidade, ocorrido já sob o comando da nova Administração Municipal.
O acórdão entendeu que o ato de desligamento “não teve o conteúdo de uma dispensa imotivada, como parece ter sido a interpretação de origem”, mas sim “da imperiosa necessidade de pôr fim à irregularidade manifesta, ao descalabro administrativo que afrontava princípios constitucionais diversos, situação já declarada pelo Judiciário como eivada de nulidade, também definida pela Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal como violadora da Lei Maior”.
E por esse entendimento, de ser nula a contratação decorrente de mero ato de “nepotismo”, o acórdão afirmou que “não pode gerar para o obreiro efeitos jurídicos outros que não a contraprestação pura e simples do serviço prestado, além dos depósitos fundiários, de molde a coibir o enriquecimento ilícito por parte de quem deu causa à irregularidade”. Ressaltou ainda que a hipótese dos autos foi de “resilição contratual, determinada pela Justiça Comum Estadual e também embasada nos ditames da Súmula Vinculante nº 13 do STF, o que não se confunde com a imotivada dispensa, não podendo gerar efeitos jurídicos para além dos previstos na Súmula nº 363 do TST”.
Em conclusão, a decisão colegiada reformou a sentença e livrou o Município da condenação às deferidas verbas rescisórias (13º salário e férias proporcionais) e licença-prêmio em pecúnia, bem como também os depósitos fundiários.
Processo 0265000-03.2009.5.15.0099