Objetivo é assegurar implantação de tratamentos alternativos à transfusão e evitar violação de crenças religiosas e discriminação
A União foi condenada a coordenar a implantação, pelo Estado do Rio de Janeiro, do programa de gerenciamento e preservação do sangue do paciente (PBM), como tratamento alternativo à transfusão de sangue doado por outra pessoa no sistema público de saúde fluminense. A decisão da 4ª Vara Federal do Rio de Janeiro atende a pedido feito pelo Ministério Público Federal (MPF), em ação civil pública ajuizada em 2021. O objetivo é evitar a violação de crenças religiosas e discriminação de grupos que se negam a fazer esse tipo de intervenção, como é o caso das Testemunhas de Jeová.
De acordo com a decisão, as medidas devem ser efetivadas no prazo de 6 meses e englobam, entre outros pontos, a definição de metas a serem alcançadas e de um plano de implantação, acompanhamento e fiscalização do programa de PBM (do inglês Patient Blood Management), assim como o treinamento de equipes. As medidas são de responsabilidade da União, que é a coordenadora do Sistema Nacional de Sangue e Derivados (Sinasan), e devem seguir as diretrizes e recomendações já previstas em normativos do Ministério da Saúde de uso racional do sangue em procedimentos cirúrgicos – o que inclui técnicas de diminuição de sangramento ou armazenamento prévio do fluido do próprio paciente.
Em tutela de urgência (liminar), enquanto o plano não for definido, os hospitais federais e Institutos do Rio de Janeiro têm o prazo de dois meses para confeccionar protocolos para tratamentos operatórios que priorizem a preservação do sangue do próprio paciente. Tais documentos deverão prever a possibilidade de transferência para outra unidade de saúde daqueles que se recusarem a realizar o procedimento de transfusão, caso o hospital não disponha de tratamento alternativo.
Também em caráter de urgência, o sistema público de saúde fluminense terá que disponibilizar Termos de Consentimento Livre e Esclarecido para pacientes que se recusarem a receber sangue de outra pessoa – com campo específico para informar, de forma facultativa, o motivo da recusa – e para aqueles que optarem por realizar o tratamento alternativo. Os protocolos de atendimento e os termos de consentimento deverão passar por revisão anual, conforme prevê normativo do Ministério da Saúde.
“A despeito de haver previsão normativa emanada da União, não há um plano regional, com metas e objetivos, instrumentos bem definidos que abordem de forma individualizada e discriminada a atribuição de cada órgão, setor ou profissional dentro da política do manejo racional do sangue [no Rio de Janeiro]”, pontua a decisão. A Justiça fixou, ainda, o prazo de quatro meses para que os Comitês Transfusionais e serviços de hemoterapia vinculados aos hospitais federais e Institutos fluminenses apresentem plano de treinamento de pessoal, englobando os diversos setores das unidades sobre os procedimentos de PBM. Os hospitais universitários não estão abrangidos na decisão liminar.
Na ação, o MPF sustenta que as medidas são necessárias para assegurar à população acesso no Sistema Único de Saúde (SUS) a tratamentos alternativos que evitem a transfusão de sangue doado por outra pessoa. Tais técnicas são recomendadas pela própria Organização Mundial da Saúde (OMS), com base em evidências científicas de que os procedimentos produzem melhores resultados clínicos para os pacientes a médio e longo prazos, além de garantirem economia financeira para o SUS e respeito à liberdade religiosa.
A ação ajuizada pelo MPF resultou das apurações realizadas no Inquérito Civil 1.30.001.003183/2012-62, que tramitou na Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC).