Mãe consegue prorrogação de licença-maternidade por período correspondente ao de internação do filho

A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reconheceu o direito de uma mãe, servidora pública da área administrativa do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE/MG), à prorrogação da licença-maternidade por mais 42 dias tendo em vista o nascimento prematuro do filho, em decorrência da Síndrome Hellp, que acontece quando há a pré-eclâmpsia na gravidez. A decisão reformou a sentença do Juízo Federal da 21ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais.

Em seu recurso, a autora sustentou¿que a internação prolongada do filho separou a mãe do convívio normal com a criança, reduzindo o tempo de adaptação e contato fora do ambiente hospitalar, ampliando, assim,¿a importância da proximidade em face da prematuridade no nascimento. Alegou, ainda, a genitora a necessidade de cuidados especiais com a saúde de seu filho recém-nascido, uma vez que esse bebê é mais vulnerável a infecções, dificuldades motoras e patologias relacionadas ao desenvolvimento incompleto do sistema gastrointestinal e respiratório.

Ao analisar o caso, a relatora, desembargadora federal Gilda Sigmaringa Seixas, destacou que, na hipótese de nascimento prematuro, a licença terá início a partir do parto, conforme prevê o art. 207, § 2º da Lei nº 8.112/90 e que, “por essa razão, o suporte fático da licença-maternidade somente ocorre na data em que o bebê recebe alta e pode, finalmente, estabelecer o vínculo com sua mãe. Tal interpretação busca justamente materializar a teleologia da própria licença e dar efetividade às disposições principiológicas da Constituição Federal que protegem a maternidade, a família, a infância e a saúde da criança, como disposto nos arts. 6º, caput, 196, 226 e 227, § 1º”.

Para a magistrada, a licença-gestante tem por escopo proporcionar um período mínimo de convivência entre a mãe e seu filho, necessário ao pleno desenvolvimento dos laços familiares e da saúde e bem-estar do bebê. Esse tempo, na presente questão, foi reduzido em virtude da internação hospitalar, circunstância alheia à vontade da parte autora.

“Ante a ausência de disposição constitucional ou legal expressa, eventual limite da prorrogação deve ser aquilatado no caso concreto em atenção ao princípio da razoabilidade. A falta de previsão legal não impede o Poder Judiciário de garantir aos jurisdicionados os direitos constitucionais, no caso, a convivência familiar do recém-nascido, tão importante nesse estágio inicial de sua vida”, ressaltou a desembargadora federal.

A desembargadora, ao concluir seu voto, enfatizou que, na Medida Cautelar na ADI 6.237/DF, ¿foi deferida a liminar a fim de conferir interpretação conforme a Constituição, ao art. 392, § 1º da CLT, assim como ao art. 71 da Lei nº 8.213/91 e, por arrastamento, ao art. 93 do Decreto nº 3.048/99, assentando a necessidade de prorrogar o benefício e considerar como termo inicial da licença-maternidade e do respectivo salário-maternidade a alta hospitalar do recém-nascido e/ou a alta de sua mãe, o que ocorrer por último, quando o período de internação exceder a duas semanas.

Sendo assim, o Colegiado, nos termos do voto da relatora, deu provimento ao recurso da autora.

Síndrome de Hellp – De acordo com o site Tuasaúde, a Síndrome de Hellp é uma situação que acontece na gravidez e que é caracterizada por hemólise, que corresponde à destruição das hemácias, alteração das enzimas do fígado e diminuição na quantidade de plaquetas, o que pode colocar em risco tanto a mãe quanto o bebê.

O recurso ficou assim ementado:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PRORROGAÇÃO DA LICENÇA-GESTANTE. NASCIMENTO PREMATURO. PERÍODO DE INTERNAÇÃO HOSPITALAR. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À MATERNIDADE E À INFÂNCIA. LEI 11.770/2008. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.

1. Pretensão de prorrogação da licença-gestante em razão da permanência da criança, que nasceu prematura em decorrência de Síndrome de Hellp, por 42 (quarenta e dois) dias entre tratamento intensivo e hospitalar.

2. Com o advento da Constituição de 1988, a criança e o adolescente passam a ser tratados como sujeitos de direitos e não mais como objetos de tutela, conferindo em seu art. 227, absoluta prioridade, sendo atribuição do Estado, da família e da sociedade, chegando ao Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual adota a Doutrina da proteção integral oriunda da Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959.

3.  No caso de nascimento prematuro, a licença terá início a partir do parto, conforme prevê o art. 207, § 2º da Lei 8.112/90.  Por essa razão, o suporte fático da licença em comento somente ocorre na data em que o bebê recebe alta e pode, finalmente, estabelecer o vínculo com sua mãe. Tal interpretação busca justamente materializar a teleologia da própria licença e dar efetividade às disposições principiológicas da Constituição Federal que protegem a maternidade, a família, a infância e a saúde da criança, como disposto nos arts. 6º, caput, 196, 226 e 227,§1º.

4.  É manifesto que a licença-gestante tem por escopo proporcionar um período mínimo de convivência entre a mãe e o seu filho, necessário ao pleno desenvolvimento dos laços familiares e da saúde e bem-estar do bebê, o que, na hipótese dos autos, foi reduzido por conta da internação hospitalar, razão alheia à vontade da parte autora.

5. Ante a ausência de disposição constitucional ou legal expressa, eventual limite da prorrogação deve ser aquilatado no caso concreto, em atenção ao princípio da razoabilidade.

6. A falta de previsão legal não impede o Poder Judiciário de garantir aos jurisdicionados os direitos constitucionais, no caso a convivência familiar do recém-nascido, tão importante neste estágio inicial de sua vida.

7. Ademais, como reforço de argumentação, na Medida Cautelar na ADIN 6.237/DF,  foi deferida liminar a fim de conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 392, § 1º da CLT, assim como, ao art. 71 da Lei 8.213/91 e, por arrastamento, ao art. 93 do Decreto 3.048/99, assentando a necessidade de prorrogar o benefício, bem como considerar como termo inicial da licença-maternidade e do respectivo salário-maternidade a alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe, o que ocorrer por último, quando o período de internação exceder a duas semanas.

8. Apelação da parte autora provida para, confirmando a antecipação de tutela deferida no Agravo de Instrumento 1023942-49.2018.4.01.0000, julgar procedente o pedido.

Pela importância do assunto publico o voto também, diga-se de passagem respeito a eventuais famílias com casos semelhantes:

V O T O

A parte impetrante relatou, na inicial, que seu filho nasceu prematuro, com 33 (trinta e três) semanas  e 3 (três) dias de gestação e exigiu cuidados especiais, decorrentes da Síndrome de Hellp. Relatou, ainda, que “em virtude da prematuridade, apresentou problemas respiratórios e foi levado diretamente para a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) e ali ficou até o dia 27/03/2018, ou seja, por 20 (vinte) dias. Na sequência, foi levado para o quarto do mesmo hospital, período em que ainda necessitava de acompanhamento em tempo integral da equipe médica por mais 22 (vinte e dois) dias, uma vez que os mesmos aparelhos utilizados enquanto estava na UTI estavam sendo empregados no período de internação no quarto, tais como o oxímetro, sonda para alimentar o bebê e aquecedor de temperatura. 9. Acrescentou que a alta do recém-nascido da UTI-neonatal para o quarto deu-se porque, durante tal período, houve um surto de uma superbactéria na UTINeonatal do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM, também situada no município de Uberaba. Diante de tal situação emergencial, vários bebês foram transferidos para a UTI do Hospital Mário Palmério, e alguns bebês já internados, dentre eles o filho da Apelante, acabaram sendo encaminhados para o quarto, continuando com o mesmo tratamento dispensado na UTI-neonatal. 10. Assim, o recém-nascido ficou internado no hospital pelo período total de 42 (quarenta e dois) dias, ocorrendo a alta médica no dia 18/04/2018”.

Com o advento da Constituição de 1988, a criança e o adolescente passam a ser tratados como sujeitos de direitos e não mais como objetos de tutela, conferindo em seu art. 227, absoluta prioridade, sendo atribuição do Estado, da família e da sociedade, chegando ao Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual adota a Doutrina da proteção integral oriunda da Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959.

O art. 227 da CF/1988, com redação dada Pela Emenda Constitucional 65, de 2010, dispõe que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Quanto aos servidores públicos federais, a Seção V da Lei 8.112/1990, que trata da Licença à Gestante, da Licença Adotante e da Licença-Paternidade, dispõe que será concedida licença à servidora gestante por 120 (cento e vinte) dias consecutivos, sem prejuízo da remuneração.

A referida lei também dispõe que a licença poderá ter início no primeiro dia do nono mês de gestação, salvo antecipação por prescrição médica (§ 1º do art. 207 da Lei 8.112/1990).

No caso de nascimento prematuro, a licença terá início a partir do parto, conforme prevê o art. 207, § 2º da Lei 8.112/90.  Por essa razão, o suporte fático da licença-maternidade somente ocorre na data em que o bebê recebe alta e pode, finalmente, estabelecer o vínculo com sua mãe. Tal interpretação busca justamente materializar a teleologia da própria licença e dar efetividade às disposições principiológicas da Constituição Federal que protegem a maternidade, a família, a infância e a saúde da criança, como disposto nos arts. 6º, caput, 196, 226 e 227, §1º.

Em outra legislação, a saber, a Lei 11.770/2008, o art. 2º autoriza a administração pública a instituir programas que garantam a prorrogação da licença-maternidade para suas servidoras, nos termos do que prevê o art. 1o da mesma Lei.

Desse modo, é manifesto que a licença-gestante tem por escopo proporcionar um período mínimo de convivência entre a mãe e o seu filho, necessário ao pleno desenvolvimento dos laços familiares e da saúde e bem-estar do bebê, o que, na hipótese dos autos, foi reduzido por conta da internação hospitalar, razão alheia à vontade da parte autora.

Assim, em que pese legislação não prever a hipótese de extensão da licença maternidade em caso de nascimento de bebê prematuro, é evidente que a referida omissão contraria o citado comando constitucional, que assegura a toda criança o direito à convivência familiar, com absoluta prioridade.

Para tentar solucionar essa lacuna constitucional, já está tramitando o Projeto de Emenda à Constituição 99/2015 destinado a estender o benefício da licença gestante em caso de nascimento prematuro, à quantidade de dias de internação do recém-nascido.

Ante a ausência de disposição constitucional ou legal expressa, eventual limite da prorrogação deve ser aquilatado no caso concreto, em atenção ao princípio da razoabilidade.

Ademais, a falta de previsão legal não impede o Poder Judiciário de garantir aos jurisdicionados os direitos constitucionais, no caso a convivência familiar do recém-nascido, tão importante neste estágio inicial de sua vida.

Como se não bastasse isso, o período de 42 (quarenta e dois) dias em que o bebê esteve internado, poderia ter sido enquadrado pela Administração como licença para acompanhamento de pessoa da família, na forma do disposto do artigo 83 da Lei 8.112/1990, o que afasta a obrigação de devolução de qualquer verba remuneratória percebida nos dias não trabalhados, em que precisou acompanhar a internação de seu bebê.

Por fim, como reforço de argumentação, na Medida Cautelar na ADIN 6.237/DF, o Ministro Edson Fachin deferiu liminar a fim de conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 392, § 1º da CLT, assim como, ao art. 71 da Lei 8.213/91 e, por arrastamento, ao art. 93 do Decreto 3.048/99, assentando a necessidade de prorrogar o benefício, bem como considerar como termo inicial da licença-maternidade e do respectivo salário-maternidade a alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe, o que ocorrer por último, quando o período de internação exceder a duas semanas.

Ante o exposto, confirmando a antecipação de tutela deferida no Agravo de Instrumento 1023942-49.2018.4.01.0000, dou provimento à apelação para julgar procedente o pedido.

É como voto.

Processo nº: 1006735-83.2018.4.01.3800

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