Decisão da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial.
A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que laboratório farmacêutico se abstenha de comercializar medicamentos com composição igual a de produto patenteado por concorrente, enquanto durar o curso da ação principal relativa à propriedade intelectual / industrial.
Segundo os autos, o laboratório comercializa dois medicamentos – um produto genérico e outro similar – de composição igual ao produto da autora da ação, que obteve a patente no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Antes de conseguir o registro, porém, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), concedeu autorização para a venda dos medicamentos por parte do réu. De acordo com os pareceres de cinco especialistas, as bulas dos produtos indicam a mesma composição e os medicamentos contêm o mesmo princípio ativo, mesma concentração, mesma via de administração, mesma posologia, mesma indicação terapêutica e são equivalentes ao medicamento da autora.
“Como se vê, é incontroverso – afirmado na inicial e, mais do que não negado, verdadeiramente confessado na contestação – que o laboratório comercializa o produto similar”, escreveu em seu voto o relator designado do agravo de instrumento, desembargador Cesar Ciampolini. “O réu reconhece que o faz, embora em quantidades que reputa desimportantes. Mais ainda, o réu, contestando, não nega o que está escrito nos pareceres de professores trazidos aos autos pela autora, no sentido de que as bulas dos medicamentos são iguais”, ressaltou o magistrado.
O relator afirmou que no caso em análise deve ser aplicada a teoria do “ilícito lucrativo”: “Trata-se de evitar que infrações patentárias – em cuja defesa sempre se poderão arguir, como aqui o faz a parte ré, questões de aparente complexidade para os leigos – persistam por todo o longo tempo de duração do processo”.
Compuseram a turma julgadora os desembargadores J.B. Franco de Godoi e Alexandre Lazzarini. A decisão foi por maioria de votos.
O recurso ficou assim ementado:
Ação cominatória, cumulada com pedidos de indenização, em que se quer, primacialmente, a condenação da empresa ré a abster-se de infringir patente de invenção de sua titularidade (formulação farmacêutica). Contestação que reconhece o uso da formulação patenteada em medicamento similar (embora em quantidades pequenas), negando-a em genérico. Defesa que não nega, por igual, a identidade das bulas dos medicamentos, defendendo que isto, todavia, não importa em contrafação, somente demonstrável por perícia. Alegação defensiva, além disso, de que a patente é nula e que essa nulidade pode ser deduzida em contestação perante qualquer Juízo. Decisão de origem que denegou a liminar. Agravo de instrumento da autora.
Decisão de origem que se reforma, posto que se está em sede cautelar, cujo mérito restringe-se à concomitante presença de aparência de bom direito e de perigo na demora, ambos identificados no caso em julgamento.
“Fumus boni iuris”: Vigência da patente, que nem mesmo está a ser posta em xeque perante a Justiça Federal, única competente para apreciar sua validade, o que se não admite perante a Justiça do Estado. Enquanto não invalidada a patente, há de produzir efeitos: “Os atos administrativos, qualquer que seja sua categoria ou espécie, nascem com a presunção de legitimidade, independentemente de norma legal que a estabeleça. Essa presunção decorre do princípio da legalidade da Administração, que, nos Estados de Direito, informa toda a atuação governamental. Além disso, a presunção de legitimidade dos atos administrativos responde a exigências de celeridade e segurança das atividades do Poder Público, que não poderiam ficar na dependência da solução de impugnação dos administrados, quanto à legitimidade de seus atos, para, só após, dar-lhes execução. A presunção de legitimidade autoriza a imediata execução ou operatividade dos atos administrativos, mesmo que arguidos de vícios ou defeitos que os levam à invalidade. Enquanto, porém, não sobrevier o pronunciamento de nulidade os atos administrativos são tidos por válidos e operantes, quer para a Administração, quer para os particulares sujeitos ou beneficiários de seus efeitos.”(HELY LOPES MEIRELLES). Presunção de identidade dos medicamentos, quanto se trata de confrontar similar ou genérico com o remédio de referência inovador: art. 3º da Lei 6.360/1976 (Lei da Vigilância Sanitária), na redação que lhe foi dada pelas Leis 13.235/2015 e 9.787/99 (Lei dos Genéricos).
“Periculum in mora”: presença “in re ipsa”, na medida em que a lentidão inerente ao processo beneficiará, caso não concedida a liminar, exatamente quem está, ao que tudo indica, a infringir patente alheia. Cumpre minimizar os efeitos negativos das delongas processuais.
O receio de que a liminar cause prejuízos ao réu não é óbice à concessão da liminar, pois “o juiz não pode […] ficar com as mãos amarradas para a repressão de um ilícito. O indeferimento da liminar também causa efeitos irreparáveis ao autor, devendo o juiz tutelar o direito mais provável em detrimento do direito que for mais incerto” (LÉLIO DENICOLI SCHMIDT).
Decisão reformada. Recurso provido, deferida a tutela cautelar inibitória.
Leia o acórdão
Agravo de Instrumento nº 2017998-49.2020.8.26.0000