O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) decidiu, ontem (12/5), negar provimento às apelações do Ministério Público Federal (MPF) e do autor de uma ação popular que objetivavam a anulação do contrato de patrocínio, firmado em 2012, entre a Caixa Econômica Federal e o Sport Club Corinthians Paulista. Tanto o MPF quanto o autor alegaram que a contratação seria ilegal e lesiva ao patrimônio público, mas em primeira instância a ação foi julgada improcedente. Em sessão telepresencial, a 4ª Turma da Corte, em formato ampliado, manteve, por maioria, a sentença.
O caso
O autor da ação, um advogado residente em Porto Alegre, ingressou em novembro de 2012 na Justiça Federal contra a Caixa, o Corinthians e a União. No processo, ele relatou que a empresa pública havia firmado contrato de patrocínio com o clube esportivo no valor de 30 milhões de reais, pela divulgação da Caixa no uniforme da equipe pelo prazo de um ano.
O advogado argumentou que o contrato seria ilegal e lesivo ao patrimônio público. Ele defendeu que, conforme o artigo 37 da Constituição Federal, a publicidade oficial de órgãos públicos deve ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, o que, no entendimento do autor, inexistia no caso. Ele requisitou que o Judiciário declarasse a nulidade da contratação e a ilegalidade da veiculação da publicidade questionada.
Primeira instância
Em março de 2015, o juízo da 6ª Vara Federal de Porto Alegre julgou a ação improcedente.
“Da análise das respostas do perito aos questionamentos das partes, conclui-se que não se pode falar em prejuízo decorrente da exposição da marca. Houve incremento de referências à marca, sendo que o valor dispendido pelo banco foi significativamente menor do que aquele que seria gasto em caso de contratação de canais de publicidade direta e individualmente aos meios de comunicação onde houve tal exposição”, sustentou o magistrado de primeira instância em sua decisão.
Baseado em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), o juiz afirmou que “na condição de empresa atuante no mercado, o contrato de patrocínio atacado pelo autor é meio lícito utilizado pela Caixa para ampliar seus negócios através da divulgação da marca”.
Acórdão
Tanto o autor quanto o MPF recorreram da sentença ao Tribunal.
Na apelação, o advogado sustentou que a Caixa não teria liberdade para contratar o patrocínio porque dependeria de autorização da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, ficando caracterizada a natureza pública e institucional das verbas utilizadas.
Já o MPF declarou que o ato foi lesivo ao patrimônio público porque a contratação feita entre a Caixa, empresa pública, e o Corinthians, empresa privada, não observou os princípios que devem orientar as contratações públicas.
A 4ª Turma ampliada do TRF4 decidiu, por maioria, negar provimento aos recursos e manter válida a sentença de improcedência.
A desembargadora federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, que proferiu o voto vencedor, destacou que “os argumentos de que a publicidade foi feita sem exame prévio das condições que permitiriam a contratação pela empresa pública e com dispensa de licitação e não foram observadas regras de direito administrativo aplicáveis devem ser adequadas à orientação jurisprudencial que reconhece hipótese de inexigibilidade de prévia licitação”.
A magistrada concluiu apontando que “a análise dos atos que precederam a celebração do contrato denota que, apesar de serem passíveis de críticas, por darem margem a eventuais questionamentos em relação às exigências de impessoalidade das escolhas, objetividade na definição de valores, transparência na tomada de decisão e real vantagem do patrocínio em si, a instituição financeira pautou-se por critérios e estratégias e diretrizes previamente estabelecidas e observou os procedimentos estabelecidos para a contratação (em um contexto de regulamentação normativa genérica), com prévia aprovação dos órgãos competentes.”
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO E CIVIL. AÇÃO POPULAR. CONTRATO DE PATROCÍNIO. EMPRESA PÚBLICA FEDERAL. ANULAÇÃO.
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O contrato de patrocínio é negócio jurídico bilateral atípico (art. 425 do Código Civil), por meio do qual uma das partes (o ‘patrocinado’) obriga-se a veicular o nome ou a marca da outra parte (o ‘patrocinador’), em determinado projeto/evento que promoverá, para atender a objetivos culturais, esportivos, educacionais, sociais ou de inovação tecnológica, mediante retribuição pecuniária (apoio financeiro) ou entrega de bens ou serviços. Como instrumento de promoção, tem por objetivo influenciar, positivamente, a percepção do público-alvo em relação ao patrocinador, para, com a divulgação de símbolos distintivos, (1.1) estimulá-lo à aquisição de determinado produto, (1.2) persuadi-lo a agir de certo modo, ou (1.3) informá-lo sobre os benefícios associados à empresa ou serviço, com potenciais efeitos econômicos. Nessa espécie de contratação, o interesse do patrocinado – que assume o compromisso de envidar esforços para a veiculação publicitária da imagem do patrocinador, sem assumir responsabilidade pelo efetivo retorno publicitário – é desenvolver ação, projeto ou evento, em consonância com os seus fins sociais, e o da patrocinadora é, por intermédio de terceiro(s), atingir o seu público-alvo e maximizar o exercício de sua atividade (ou seja, agregar valor à marca e/ou divulgar produtos, serviços, programas, projetos, políticas e ações, mediante a vinculação de sua imagem ao projeto/evento).
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Quando celebrado por entidade ou órgão público, o contrato de patrocínio não se insere no conceito estrito de publicidade oficial, para efeito de aplicação do artigo 37, § 1º, da Constituição Federal, por constituir espécie singular que reclama disciplina jurídica distinta das contratações, realizadas pela Administração Pública, para prestação de serviços, execução de obras ou aquisição de bens. Em outros termos, o patrocínio não envolve um serviço de publicidade tradicional, pois pressupõe um vínculo íntimo entre as imagens dos contratantes, e o patrocinado atua em ramo diverso da atividade publicitária.
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A contratação de patrocínios públicos sujeita-se à observância dos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência (ou seja, a concessão de patrocínio pelas estatais a particulares deve convergir para a consecução de suas finalidades institucionais, e a escolha do projeto/evento patrocinado está condicionado pelo interesse público a ser atingido), afora o dever de prestação de contas (artigos 37, caput, e 71 da Constituição Federal).
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Se o objetivo do contrato é utilizar a exposição que o patrocinado dispõe na mídia para a divulgação de uma marca e consequente prospecção de mercado – ou, na dicção dos atos normativos de regência, para (4.1) gerar identificação e reconhecimento do patrocinador por meio da iniciativa patrocinada; (4.2) ampliar relacionamento com públicos de interesse; (4.3) difundir marcas, produtos, serviços, posicionamentos, programas e políticas de atuação; (4.4) ampliar vendas, e (4.5) agregar valor à marca do patrocinador – não há como vincular a propaganda/patrocínio às finalidades institucionais da empresa pública [artigo 2º do Decreto-Lei n.º 759/1969], mas sim à disputa mercadológica, que, ao fim e ao cabo, convergirá para a consecução de suas finalidades institucionais. Logo, inexiste – sob essa ótica – afronta ao princípio da legalidade.
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Na análise da validade do contrato sub judice, há que se ponderar que, ainda que possam existir eventuais insuficiências na fase pre-contratual, (5.1) a legislação então vigente (2012) era incipiente na definição de critérios objetivos para as contratações dessa natureza; (5.2) a instituição financeira pautou-se por critérios e estratégias/diretrizes previamente estabelecidas e observou os procedimentos estabelecidos para a contratação (em um contexto de regulamentação normativa genérica), com prévia aprovação dos órgãos competentes, e (5.3) não há elementos probatórios suficientes para afirmar que tais ‘irregularidades’ inquinam o contrato de nulidade absoluta (não passível de convalidação), justificando sua anulação, com a restituição da integralidade do valor repassado à patrocinada, independentemente de ter havido ou não algum retorno publicitário à patrocinadora.