Justiça brasileira pode julgar pedido de indenização por investimento malsucedido nos EUA

Os ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiram que as cortes brasileiras são competentes para julgar demanda indenizatória decorrente de prejuízos que chegariam a U$ 2 milhões em virtude de investimentos realizados em fundo no exterior.

O recurso especial foi interposto pelo Itaú Unibanco S/A, contra clientes que possuíam conta tanto no Brasil como nos Estados Unidos e realizavam aplicações financeiras instruídos por gerentes operacionais do serviço private nas duas localidades.

Conforme os autos, uma cliente do banco foi instruída a adquirir empresa situada nas Ilhas Virgens Britânicas. Posteriormente, foi orientada a aplicar recursos da empresa em um fundo que acabou levando os investidores à ruína. Em razão disso, ela e a empresa ingressaram com ação de indenização por danos materiais e morais, alegando terem sofrido prejuízos de grande monta por omissão do banco.

Incompetência

O Itaú alegou que a Justiça brasileira é incompetente para o julgamento da demanda, pois o Banco Itaú Europa Internacional, situado em Miami, e a empresa adquirida são sociedades sediadas e regidas pelas leis dos EUA. Além disso, “todas as operações financeiras questionadas ocorreram fora do território nacional” e foram feitas “por empresas estrangeiras”. Argumentou ainda que a instituição bancária no Brasil e nos EUA são entidades completamente distintas.

De acordo com o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso, o artigo 88 do Código de Processo Civil (CPC) de 1973 estabelece as hipóteses de competência internacional concorrente ou cumulativa, caso em que a Justiça brasileira e a estrangeira podem, igualmente, julgar a controvérsia, sem que ocorra o fenômeno da litispendência.

Destacou, também, que o CPC de 2015 possui idênticas regras, previstas no artigo 21, para fixação da competência. Afirmou que o novo código “apenas ampliou o rol de situações da competência nacional, para os casos envolvendo alimentos, relação consumerista ou de submissão voluntária das partes”.

Transnacionalidade

O ministro observou que houve uma sucessão de atos praticados no Brasil e nos EUA, como a remessa de dinheiro ao exterior, a compra de sociedade empresária, a indicação de investimentos a serem realizados, diversas ligações telefônicas para tratar do investimento fracassado e eventual suporte da gerente operacional do banco no Brasil. “Há, portanto, evidente transnacionalidade contratual”, fato que permite a aplicação do inciso III do artigo em questão, afirmou.

Salomão explicou que o dispositivo permite a competência da autoridade judiciária brasileira quando “a ação se originar de fato ocorrido ou ato praticado no Brasil”, não se exigindo que o negócio seja concluído no Brasil.

O relator acrescentou que o Itaú tem domicílio no Brasil, o que atrai a incidência do inciso I, visto que a legislação processual considera domiciliada no Brasil “a pessoa jurídica estrangeira que aqui tiver agência, filial ou sucursal”.

Para o ministro, “não há dúvida sobre a possibilidade de a sentença condenatória, na hipótese de procedência dos pedidos indenizatórios, ser amplamente concretizada no território nacional”.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. INVESTIMENTOS REALIZADOS NO EXTERIOR. INSUCESSO DAS OPERAÇÕES FINANCEIRAS. COMPETÊNCIA DA AUTORIDADE JUDICIÁRIA BRASILEIRA. FATOS E ATOS PRATICADOS NO BRASIL. PARTE RÉ DOMICILIADA EM TERRITÓRIO BRASILEIRO. ART. 88, I E III, DO CPC DE 1.973.

1. O art. 88 do CPC de 1.973 estabelece as hipóteses de competência internacional concorrente ou cumulativa, caso em que as Justiças brasileiras e estrangeiras podem, igualmente, julgar a controvérsia, sem que ocorra o fenômeno da litispendência.

2. No caso, observa-se a existência de atos praticados no Brasil, tanto pela pessoa física quanto pela pessoa jurídica, a exemplo de envio de dinheiro para conta localizada em Miami-EUA, diversas ligações telefônicas específicas sobre o investimento fracassado e eventual suporte da gerente operacional da instituição bancária com sede neste país, permitindo a aplicação do inciso III do art. 88 do CPC de 1.973.

3. Ademais, o réu, indicado na petição inicial, tem domicílio no Brasil, cuja legitimidade passiva fora confirmada pelas instâncias ordinárias, o que atrai a incidência do inciso I do art. 88 do CPC de 1.973.

4. O rol previsto no art. 88 do CPC de 1.973 não é taxativo, pois algumas demandas são passíveis de julgamento pela autoridade judiciária brasileira, ainda que a situação jurídica não se enquadre em nenhuma das hipóteses ali previstas (RO 64⁄SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13⁄5⁄2008, DJe 23⁄6⁄2008).

5. Recurso especial não provido.

Leia o voto do relator.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1366642

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar