Após ter a emissão de licença de continuidade de atividade econômica negada pelo coordenado geral de Controle de Segurança Privada do Departamento de Polícia Federal (DPF), uma empresa de segurança ingressou com pedido na Justiça Federal e garantiu o direito ao documento.
O caso foi analisado pela 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que, em decisão unanime, confirmou a sentença, do juízo da 20ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, que concedeu a segurança pleiteada e determinou à PF que analisasse o pedido feito pela impetrante de emissão da licença para a continuidade da sua atividade econômica sem que tenha de saldar débito pendente, decorrente da aplicação de multa administrativa.
Em apelação ao Tribunal, a União sustentou ser lícita a atuação da Polícia Federal, pois segundo o Órgão, toda empresa que exerce a prestação de serviços de Vigilância/Segurança armada ou desarmada, deverá possuir a Autorização de Funcionamento. Por fim, argumentou que o cancelamento não se deu devido à falta de pagamento da multa, mas sim, pela empresa não atender às especificações legais que autorizam a renovação do certificado de segurança.
Para o relator, desembargador federal Sousa Prudente, o TRF1 e os demais tribunais superiores já se pronunciaram no sentido de ser “ilegal a vedação de concessão de licenças, de autorizações e apresentação de outros serviços como medida coercitiva, aplicada pelo órgão público, para a satisfação dos créditos, mormente quando dispõe a Administração de outros meios legais para tal fim, como a execução fiscal”.
O magistrado ressaltou, ainda, ser “a conduta do apelante violadora do princípio da boa-fé objetiva, incidindo na espécie, a proibição do venire contra factum proprium, pois, ao invés de se utilizar do instrumento processual cabível para a cobrança de valor a título de penalidade administrativa, optou por constranger a impetrante deixando de renovar o certificado de segurança, que atesta a regularidade das instalações físicas da empresa”.
O recurso ficou assim ementado:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. RENOVAÇÃO DO CERTIFICADO DE SEGURANÇA. RESTRIÇÃO À ATIVIDADE ECONÔMICA. COERÇÃO PARA COBRANÇA DE DÉBITOS. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA E APLICAÇÃO POR EXTENSÃO DA SÚMULA Nº 70 E 547 DO EXCELSO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANUTENÇÃO DO JULGADO.
I – Consoante a jurisprudência de nossos Tribunais, é ilegal a vedação de concessão de licenças, de autorizações e apresentação de outros serviços como medida coercitiva, aplicada pelo órgão público, para a satisfação de seus créditos, mormente quando dispõe a Administração de outros meios legais para tal fim, como a execução fiscal. Precedentes.
II – Ademais, a inteligência das súmulas nº 70 e 547 do Excelso Supremo Tribunal Federal, na dicção de que “é inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo”, e “NÃO É LÍCITO À AUTORIDADE PROIBIR QUE O CONTRIBUINTE EM DÉBITO ADQUIRA ESTAMPILHAS, DESPACHE MERCADORIAS NAS ALFÂNDEGAS E EXERÇA SUAS ATIVIDADES PROFISSIONAIS.”, aplica-se, mutatis mutandis, também na cobrança de multas administrativas, posto que, a despeito da manifesta cultura dos autores do Código Tributário Nacional, temos de admitir que a redação deste código, nominalmente fulcrada no conceito de tributo, como previsto no art. 3º do referido diploma legal, a rigor, trata — esse diploma — de matéria fiscal e tributária, e tanto assim é que, no capítulo que cuida da obrigação tributária, o art. 113 diz que “a obrigação tributária é principal ou acessória; a obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, e extingue-se juntamente com o débito dela decorrente” (§ 1º). E, logo a seguir, define a obrigação acessória como decorrente “da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos” (§ 2º). Como se vê, no capítulo que cuida da obrigação tributária, o legislador cuida de uma obrigação que denomina de acessória, que é de natureza essencialmente administrativa e o seu descumprimento pelo administrado gera uma obrigação principal, de natureza meramente fiscal e não tributária, que tem por objeto o pagamento de penalidade pecuniária. E como resulta do art. 3º do CTN, o tributo não decorre de qualquer ato ilícito, como no caso em exame. Por isso é que a doutrina tributária nacional e estrangeira admitem a existência de um ramo do Direito Tributário com a denominação de Direito Tributário Penal, quando, a rigor, o correto seria aqui considerar um direito fiscal e não estritamente tributário no campo das penalidades administrativas, com natureza pecuniária.
III – Em sendo assim, afigura-se escorreito o entendimento, no sentido de que a União (Fazenda Nacional) não pode impor restrições à atividade econômica de empresas como meio coercitivo para o pagamento de débitos porventura existentes, porquanto a Súmula nº 70 do Supremo Tribunal Federal impede a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de débitos tributários e, por extensão, aqueles de natureza meramente fiscal, como no caso em exame, pelo que não merece qualquer reparo o julgado monocrático que concedeu a segurança na espécie, raciocínio este também consentâneo com a Súmula 547 da Corte Suprema.
IV – Apelação e remessa oficial desprovidas. Sentença confirmada.
Desse modo, o Colegiado acompanhou o voto do relator e negou provimento a apelação da União.
Processo: 1003765-83.2017.4.01.3400