Ele buscava reconhecimento de vínculo de emprego, mas ficou comprovado que era sócio.
A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho restabeleceu o benefício da justiça gratuita a um empresário que foi multado por litigância de má-fé após a demonstração de que era sócio do sítio eletrônico de vendas House of Motors, de Curitiba (PR), do qual alegava ser empregado. Segundo a Turma, a litigância de má-fé não afasta a concessão do benefício.
Sócio
Na reclamação, o profissional alegou que fora empregado da Kallegari Confecções Ltda. e da House of Motors, que formariam grupo econômico. Em sua defesa, o dono da confecção sustentou que havia uma sociedade de fato entre eles para a criação do sítio eletrônico, que serviria para a comercialização dos produtos da Kallegari.
Desprezo aos deveres
No decorrer do processo, ficou demonstrado que a relação, de fato, era de sociedade. Testemunhas e documentos afastaram a existência dos requisitos caracterizadores da relação de emprego, como subordinação e cumprimento de horários.
Diante da situação, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) considerou “absolutamente nítido” que o autor da ação agira de modo “malicioso, desleal, procrastinatório e temerário” e que, por meio de alegações infundadas e inverídicas, “tentou se locupletar indevidamente em prejuízo da parte contrária, manifestando claro desprezo aos deveres que a lei processual lhe impõe como parte do processo”. Assim, condenou-o ao pagamento de multa por litigância de má-fé em benefício da outra parte e revogou a concessão do benefício da justiça gratuita que fora deferida no primeiro grau.
Compatibilidade
A relatora do recurso de revista do sócio, ministra Maria Helena Mallmann, explicou que a aplicação da multa por litigância de má-fé se justifica quando demonstrados a deslealdade processual e o efetivo prejuízo à parte adversa. No caso, ela considerou que foi comprovado que o autor da ação não só expôs os fatos de forma totalmente contrária à realidade como alterou a verdade dos fatos.
Por outro lado, a ministra assinalou que, de acordo com a Súmula 463 do TST, para a concessão da assistência judiciária gratuita, basta a simples afirmação do declarante ou de seu advogado de que não tem condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado sem prejuízo próprio ou de sua família. Preenchidos os requisitos legais, a jurisprudência do TST entende que é assegurada a concessão do benefício, ainda que o beneficiário tenha sofrido as sanções decorrentes da litigância de má-fé.
O recurso ficou assim ementado:
I – AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014.
NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. O acórdão recorrido analisou toda a matéria debatida nos autos, estando suficientemente fundamentada, uma vez que levou em consideração o conjunto fático-probatório delineado nos autos, amparado no princípio do livre convencimento motivado, uma vez que a prova produzida se mostrou convincente e eficaz para o deslinde da controvérsia. Assim, o Tribunal Regional consignou expressamente as razões de fato e de direito pelas quais não reconheceu o vínculo de emprego, bem como condenou o reclamante ao pagamento de multa por litigância de má-fé e revogou a concessão do benefício da justiça gratuita, não havendo omissão quanto às questões relevantes ao deslinde da controvérsia. Descabe falar em nulidade por negativa de prestação jurisdicional. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
RELAÇÃO DE EMPREGO NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO. Hipótese em que o Tribunal Regional, amparado no acervo fático-probatório delineado nos autos, sobretudo nas provas orais e documentais, concluiu que o reclamante não era empregado da 1ª ré (Kallegari), mas, sim, “sócio de fato” da 2ª reclamada (House of Motors). Registrou que a prova oral demonstrou que o autor não só era apresentado como sócio, mas também assim se autoidentificava perante terceiros, do que se infere que não era subordinado a um superior hierárquico. Assentou que a prova documental corrobora a participação do autor como sócio de fato na empresa “House of Motors”, sem qualquer vínculo com a ré Kallegari, uma vez que comprovadamente investiu recursos próprios na empresa, o que afasta sua tese de subordinação. Concluiu que as responsabilidades, autonomia e o poder de gestão que o autor possuía não se coadunam, minimamente, com a figura do empregado. Nesse contexto, verifica-se que não foram preenchidos os requisitos configuradores da relação empregatícia, sobretudo o da subordinação, mostrando-se irretocável a decisão regional. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. A aplicação da multa por litigância de má-fé justifica-se quando demonstrados o intuito da parte em agir com deslealdade processual e o efetivo prejuízo à parte adversa. No caso, restou absolutamente comprovado que reclamante não só expôs os fatos de forma totalmente contrária à realidade, como alterou a verdade dos fatos, agindo de forma temerária e com deslealdade processual. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
II – RECURSO DE REVISTA. INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014.
ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. COMPATIBILIDADE. Nos termos da redação da Súmula 463, I, do TST, para a concessão da assistência judiciária, basta a simples afirmação do declarante ou de seu advogado, na petição inicial, para se considerar configurada a sua situação econômica (art. 4º, § 1º, da Lei nº 7.510/1986, que deu nova redação à Lei nº 1.060/50). Outrossim, a jurisprudência desta Corte entende que a litigância de má-fé não afasta a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Nestes termos, merece reforma a decisão regional que afastou o benefício em razão da litigância de má-fé aplicada à parte. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: ARR-490-02.2015.5.09.0008