Candidato terá uma nova chance para mostrar que é falso gordo em concurso para PM/SC

A Justiça decidiu conceder nova chance para que um candidato comprove sua aptidão física e conquiste vaga no Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar de Santa Catarina – condição negada após exame identificar índice de massa corpórea (IMC) em desalinho com os parâmetros exigidos no edital do certame. Ele foi alijado do concurso e, sequencialmente, teve pleito negado na comarca da Capital.

A 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, contudo, em apelação sob relatoria do desembargador Cid José Goulart Júnior, acolheu argumento do candidato, que disse ter sua defesa cerceada diante da ausência de perícia técnica, e determinou o retorno dos autos para a comarca de origem com o objetivo de propiciar a necessária instrução probatória para fundamentar nova sentença.

O relator seguiu entendimento do Ministério Público, que considerou a questão controversa e carente de ampla produção probatória. “Tão somente com suporte de expert da área é possível avaliar se os resultados obtidos pela apuração matemática das medidas do corpo do autor são suficientes para apontar qualquer óbice à atividade policial”, acrescentou. O candidato garantiu que o IMC ultrapassou o parâmetro por conta da alta quantidade de massa magra (músculos) que possui.

Nesse sentido, Cid citou jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região em caso análogo. “Embora o IMC mostre-se preciso na maioria dos casos, tal índice pode superestimar ou subestimar a gordura corporal, por não diferenciá-la da massa muscular (p.ex. os atletas tendem a ter uma porcentagem de gordura corporal muito baixa e uma massa muscular muito elevada; às vezes, o resultado aponta para uma classificação de sobrepeso, porém o indivíduo está saudável).”

De tal forma, o relator reconheceu a nulidade da sentença por ausência de instrução probatória, em especial a realização de perícia – essencial para qualquer análise de mérito. Por consequência, determinou a devolução dos autos à origem para a devida instrução probatória.

O recurso 5050470-39.2016.4.04.0000, citado como precedente, ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. MILITAR. PROCESSO SELETIVO. CADASTRO RESERVA DE SARGENTO EM NIVEL TÉCNICO TEMPORÁRIO. TESTE DE APTIDÃO. OBESIDADE. REQUISITOS PARA APROVAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.

A reprovação de candidato em processo seletivo, na fase de aferição de sua aptidão de saúde e física, com base exclusivamente em teste de índice de massa corpórea (IMC), é frágil, pois o IMC é um elemento – suscetível a variações circunstanciais – que, para fins de avaliação das reais condições de saúde da pessoa, deve ser cotejado com outros fatores que influenciam/interferem em sua aptidão física, não servindo, isoladamente, como dado conclusivo. Além disso, a exatidão científica dessa fórmula matemática é criticada por especialistas da área da saúde, uma vez que a diversidade dos biotipos humanos (inclusive diferenças raciais e étnicas) pode gerar distorções na interpretação de seu resultado. Embora o IMC mostre-se preciso na maioria dos casos, tal índice pode superestimar ou subestimar a gordura corporal, por não diferenciá-la da massa muscular (p.ex. os atletas tendem a ter uma porcentagem de gordura corporal muito baixa e uma massa muscular muito elevada; às vezes, o resultado aponta para uma classificação de sobrepeso, porém o indivíduo está saudável).

O próprio Edital prevê inúmeras exigências nas etapas III (inspeção de saúde) e IV (exame de aptidão física) do Aviso de Convocação para Seleção Nr 1-SSMR3, de 25/05/2016 e relaciona um extenso rol de exames a que devem submeter-se todos os candidatos do processo seletivo, para tal aferição.

O recurso ficou assim ementado:

APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NO CURSO DE FORMAÇÃO DE SOLDADOS DA POLÍCIA MILITAR DE SANTA CATARINA. EDITAL N. 042/CGCP/2019. CANDIDATO REPROVADO NA AVALIAÇÃO DE SAÚDE, POR APRESENTAR ÍNDICE DE MASSA CORPÓREA (IMC) ACIMA DO LIMITE DEFINIDO NO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO. PLEITO DE ANULAÇÃO. SENTENÇA QUE, CONSIDERANDO SUFICIENTE A PROVA DOCUMENTAL APRESENTADA, JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO. ÍNDICE EM DEBATE QUE PODE APRESENTAR RESULTADOS INCOMPATÍVEIS QUANDO APLICADO A ATLETAS E PRATICANTES DE MUSCULAÇÃO, AO QUE PARECE O CASO DO RECORRENTE. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO DO FEITO, NOTADAMENTE COM A REALIZAÇÃO DE PROVA TÉCNICA, CONFORME OPORTUNAMENTE REQUERIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO. RECURSO PROVIDO. “A reprovação de candidato em processo seletivo, na fase de aferição de sua aptidão de saúde e física, com base exclusivamente em teste de índice de massa corpórea (IMC), é frágil, pois o IMC é um elemento – suscetível a variações circunstanciais – que, para fins de avaliação das reais condições de saúde da pessoa, deve ser cotejado com outros fatores que influenciam/interferem em sua aptidão física, não servindo, isoladamente, como dado conclusivo. Além disso, a exatidão científica dessa fórmula matemática é criticada por especialistas da área da saúde, uma vez que a diversidade dos biotipos humanos (inclusive diferenças raciais e étnicas) pode gerar distorções na interpretação de seu resultado. Embora o IMC mostre-se preciso na maioria dos casos, tal índice pode superestimar ou subestimar a gordura corporal, por não diferenciá-la da massa muscular (p.ex. os atletas tendem a ter uma porcentagem de gordura corporal muito baixa e uma massa muscular muito elevada; às vezes, o resultado aponta para uma classificação de sobrepeso, porém o indivíduo está saudável). […]” (TRF4, AG 5050470-39.2016.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, 24/11/2016).

Apelação/Remessa Necessária n. 5003959-05.2019.8.24.0091

Deixe uma resposta

Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá, como posso ajudar