A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, deu provimento ao recurso especial de um hospital para julgar procedente ação de cobrança por dívida contraída pela mãe de um paciente, após o plano de saúde negar a cobertura da internação. Para o colegiado, a cobrança do hospital respeitou o contrato firmado pelas partes – o que não impede a cliente do plano de discutir, em outra ação, a legalidade da recusa pela operadora.
Em primeira instância, o juiz acolheu a ação promovida pelo hospital para cobrar a despesa da titular do plano de saúde. Entretanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reformou a sentença e julgou a ação improcedente, sob o argumento de que, como o procedimento médico constava da lista de cobertura mínima obrigatória prevista pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o plano deveria custear o valor da internação.
Ainda segundo o TJSP, o hospital deveria ter ajuizado a ação de cobrança diretamente contra a operadora de saúde, e não contra a beneficiária do plano.
Responsabilidade
Relator do recurso especial, o ministro Marco Aurélio Bellizze apontou que, no contrato firmado, a beneficiária do plano se responsabilizou perante o hospital pelo pagamento da internação, em caso de eventual recusa da operadora. O ministro salientou que a internação não foi autorizada pela operadora, mas sim pelo próprio hospital que atendeu o paciente em situação de urgência.
“Considerando que não houve qualquer vício na prestação do serviço médico-hospitalar contratado, levando-se em conta, ainda, que a operadora do plano de saúde não autorizou, em nenhum momento, a cobertura da internação do paciente, não há como afastar a responsabilidade da ré (contratante) pela dívida contraída junto ao hospital”, afirmou o ministro.
Ao dar provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença, Bellizze ressalvou que eventual abuso da negativa de cobertura da internação pelo plano poderá ser discutido em ação própria, mas essa possibilidade não afasta a validade do contrato de prestação de serviço médico-hospitalar.
O processo ficou assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICO-HOSPITALARES. DEMANDA AJUIZADA PELO HOSPITAL EM DESFAVOR DO RESPONSÁVEL PELO PACIENTE (CONTRATANTE), EM RAZÃO DA NEGATIVA DE COBERTURA DO PLANO DE SAÚDE. AUSÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DOS DÉBITOS GERADOS COM A INTERNAÇÃO HOSPITALAR. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA IMPUTANDO A RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS DESPESAS AO CONTRATANTE, NO CASO DE RECUSA DO CUSTEIO PELA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE. ILEGITIMIDADE DO HOSPITAL EM DISCUTIR A SUPOSTA ABUSIVIDADE NA NEGATIVA DE COBERTURA PELA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE. QUESTÃO QUE CONFIGURA RES INTER ALIOS ACTA. SERVIÇOS MÉDICO-HOSPITALARES DEVIDAMENTE PRESTADOS. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO QUE SE IMPÕE. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO PROVIDO.1. Cinge-se a controvérsia a saber, a par da existência de negativa de prestação jurisdicional, se é possível responsabilizar a ré, ora recorrida, pelas despesas médico-hospitalares contraídas em decorrência da internação de seu filho no hospital⁄autor, tendo em vista a ausência de cobertura pela operadora do plano de saúde.2. As questões indispensáveis à solução da controvérsia foram devidamente analisadas no acórdão recorrido, não havendo que se falar em negativa de prestação jurisdicional por parte do Tribunal de origem, razão pela qual afasta-se a apontada violação ao art. 1.022 do CPC⁄2015.3. Constatando-se que todos os serviços médico-hospitalares contratados pela ré foram devidamente prestados pelo hospital, sem qualquer vício, e levando-se em conta que a operadora do plano de saúde do paciente não autorizou a sua internação, sob a justificativa de que ainda não havia ultrapassado o prazo de carência, não há como afastar a responsabilidade da contratante pelos débitos contraídos junto ao hospital.3.1. Não se pode olvidar que no contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares firmado entre as partes contém cláusula expressa estipulando a responsabilidade solidária da contratante e do paciente, no caso de recusa do custeio pela operadora do plano de saúde, como ocorrido na espécie.3.2. Ademais, impõe-se esclarecer que a suposta abusividade da negativa de cobertura da internação do paciente, considerando que a carência não pode ultrapassar 24 (vinte quatro) horas nos casos de urgência médica, conforme dispõe o art. 12, inciso V, alínea c, da Lei 9.656⁄1998, é matéria para ser discutida em ação própria, a ser ajuizada pelo beneficiário do plano de saúde em desfavor da respectiva operadora, pois o hospital não tem legitimidade para discutir essa questão, visto que o contrato de plano de saúde produz efeitos exclusivamente sobre a esfera jurídica das partes – beneficiário e operadora do plano -, não prejudicando e nem favorecendo terceiros (res inter alios acta).4. Recurso especial provido.
Leia o acórdão.