É inconstitucional a exigência de comprovação de jornada máxima semanal de 60 horas
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho afastou o limite de jornada de 60 horas semanais exigido pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) para a contratação de uma técnica de enfermagem que já é servidora do Município de São Luís (MA) e foi aprovada em concurso público para a mesma função. Segundo o colegiado, a Constituição da República não prevê esse requisito para a cumulação de cargos.
Compatibilidade
Na reclamação trabalhista, a profissional alegou que a Constituição autoriza a cumulação de dois cargos ou empregos públicos privativos de profissionais de saúde, exigindo, como único requisito, a compatibilidade de horários.
Jornada exaustiva
Ao julgar o caso, o Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (MA) não verificou ilegalidade ou inconstitucionalidade na exigência, considerando as normas que regem os limites máximos de jornada de trabalho referentes ao direito fundamental do trabalhador à saúde e à segurança. Para o TRT, admitir a cumulação de cargos com jornada superior a 60 horas semanais seria permitir jornada exaustiva de forma habitual.
Requisitos
O relator do recurso de revista da profissional, ministro Agra Belmonte, observou que a Constituição (artigo 37, inciso XVI) estabelece apenas dois requisitos para a cumulação de cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde com profissões regulamentadas, como é o caso da técnica de enfermagem: a compatibilidade de horários e o respeito ao teto constitucional.
Restrição de direito
Segundo o relator, a limitação constitucional de jornada de trabalho semanal a 44 horas (artigo 7º, inciso XIII) é dirigida ao empregador, e não ao empregado. e o fundamento do TRT, ainda que baseado na preservação da integridade física e psíquica da trabalhadora, “cerceia indevidamente direito expressamente previsto na Constituição”.
Sobre esse ponto, o ministro lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou a tese de repercussão geral de que os casos autorizados de acumulação de cargos públicos previstos na Constituição se sujeitam apenas à compatibilidade de horários, verificada no caso concreto, “ainda que haja norma infraconstitucional que limite a jornada semanal”.
O recurso ficou assim ementado:
I – AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. PROFISSIONAL DE SAÚDE. CUMULAÇÃO DE CARGO E EMPREGO PÚBLICOS. LIMITAÇÃO DE JORNADA. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. ARTIGO 37, XVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. O agravo merece provimento para melhor análise de violação do artigo 37, XVI, da Constituição Federal. Agravo conhecido e provido.
II – AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. PROFISSIONAL DE SAÚDE. CUMULAÇÃO DE CARGO E EMPREGO PÚBLICOS. LIMITAÇÃO DE JORNADA. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. ARTIGO 37, XVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. O agravo de instrumento merece provimento para melhor análise de violação do artigo 37, XVI, da Constituição Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido.
III – RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. PROFISSIONAL DE SAÚDE. CUMULAÇÃO DE CARGO E EMPREGO PÚBLICOS. LIMITAÇÃO DE JORNADA. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. ARTIGO 37, XVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Da leitura do artigo 37, XVI, da Constituição Federal, tem-se que há autorização expressa na Constituição Federal quanto à possibilidade de cumulação de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas, como é o caso da reclamante, desde que sejam preenchidos apenas dois requisitos: compatibilidade de horários entre os dois cargos e respeito ao teto constitucional. No mesmo sentido é a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no ARE nº 1246685, tema 1081 da Tabela de Repercussão Geral: “As hipóteses excepcionais autorizadoras de acumulação de cargos públicos previstas na Constituição Federal sujeitam-se, unicamente, a existência de compatibilidade de horários, verificada no caso concreto, ainda que haja norma infraconstitucional que limite a jornada semanal”. No presente caso, a reclamante já exerce o cargo de técnica de enfermagem no Município e foi aprovada em concurso público para o emprego também de técnica de enfermagem da reclamada. Para que assumisse o novo emprego, no entanto, foi exigida a apresentação de documento que comprovasse que a cumulação com o cargo já exercido não ultrapassaria a jornada de 60 horas semanais, exigência que ultrapassa os limites da autorização constitucional, restringindo indevidamente o direito da reclamante, pelo que viola o artigo 37, XVI, da Constituição Federal. Há de se ressaltar que a limitação de jornada de trabalho prevista no artigo 7º, XIII, da Constituição Federal é dirigida ao empregador e não ao empregado, que pode, por exemplo, ter dois empregos cujas jornadas somadas ultrapassem 44 horas semanais. O fundamento adotado pela eg. Corte Regional, ainda que fundamentado na preservação da integridade física e psíquica da reclamante, não pode prevalecer, na medida em que cerceia indevidamente direito expressamente previsto na Constituição Federal. Recurso de revista conhecido por violação do artigo 37, XVI, da Constituição Federal e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-17758-50.2015.5.16.0016